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Atualizado em 09/08/2024

O Ensino de Matemática nas Salas Multisseriadas na Educação do Campo

Este artigo discute novas abordagens para o ensino de matemática em salas multisseriadas na educação do campo, apresentando estratégias inovadoras para melhorar a qualidade da educação rural.

MULTISSERIADASDaniel de Carvalho Cuiabano[1]

Deivid Brunel de Carvalho[2]

Heverton de Oliveira Gonçalves[3]

RESUMO: As salas multisseriadas são rotuladas como sinônimo de atraso e baixa qualidade, por se tratar de turmas compostas por várias séries, orientadas por um único professor. Assim, neste artigo, objetiva-se discutir os aspectos evidenciados sobre a Matemática na realidade da Educação do Campo na coleção “Guias de Aprendizagem de Matemática”, do Programa Escola Ativa, destinados para as realidades campesinas brasileiras; conhecer as formas de trabalhar simultaneamente com alunos de vários níveis numa mesma sala de aula para aprender Matemática; identificar quais são as dificuldades enfrentadas pelos educadores em salas multisseriadas. A metodologia de coleta de dados é qualitativa, por meio de pesquisa bibliográfica e aplicação de um questionário, com uma pergunta aberta aos educadores que atuam nas salas multisseriadas. O estudo será conduzido por intermédio da contribuição teórica de Borba, Carvalho, Araujo e Loiola (2004); Buarque (1994); FUNDESCOLA (2005); Ribeiro (1990), entre outros. O estudo contribuirá para que os educadores de Matemática que atuam no ensino básico possam refletir sobre a realidade de organização do ensino em salas multisseriadas.

PALAVRAS-CHAVE: Educação. Matemática. Campo.

1. Introdução

As salas multisseriadas são rotuladas como sinônimo de atraso e baixa qualidade, por se tratar de turmas compostas por várias séries, orientadas por um único professor. A maioria dessas salas está localizada em localidades rurais, com estruturas físicas e materiais precários. No entanto, o ensino nessas turmas pode ser de qualidade, desde que ofereça condições estruturais mínimas para isso.

Para melhor compreender a realidade das salas de aula multisseriadas, objetiva-se discutir os aspectos evidenciados sobre a Matemática na realidade da Educação do Campo na coleção “Guias de Aprendizagem de Matemática”, do Programa Escola Ativa, destinados para as realidades campesinas brasileiras; conhecer as formas de trabalhar simultaneamente com alunos de vários níveis numa mesma sala de aula para aprender Matemática.

Nesse sentido, a metodologia para coleta de dados é qualitativa, por meio de pesquisa bibliográfica e aplicação de um questionário com uma pergunta aberta aos educadores que atuam com turmas multisseriadas, os quais chamaremos de P1 e P2.

O estudo será conduzido por intermédio da contribuição teórica de Borba, Carvalho, Araujo e Loiola (2004); Buarque (1994); FUNDESCOLA (2005); Ribeiro (1990), entre outros.

Espera-se que este estudo contribua com os educadores de Matemática que trabalham no ensino básico e que possam refletir sobre a realidade de organização do ensino em salas multisseriadas.

2. Salas Multisseriadas

Na concepção de Buarque (1994), historicamente as classes multisseriadas são consideradas como estrutura precária, por isso, muitos a caracterizam como geradora de um ensino de segunda categoria e, o que é pior, sem alternativa de melhoria. Partindo desse ponto de vista, muitos educadores e gestores optaram por esquecê-las, esperando que desapareçam. No entanto, essa é uma consequência natural de um processo de desenvolvimento econômico que destacou para as cidades, nas últimas décadas, por conter um enorme contingente de população rural. Nessa perspectiva, é possível considerar as dificuldades econômicas e naturais vividas pelos alunos da zona rural, uma necessidade das secretarias, pois se isso não acontecer poderá ocorrer dois fatos: o primeiro será a evasão e o segundo é a visualização da comunidade em relação à negligência administrativa e organizativa das secretarias de educação (BUARQUE, 1994, p. 77).

Outro ponto a se considerar no trabalho de gestão à organização das salas multisseriadas para se obter um melhor desempenho dos alunos é a criação de projetos interdisciplinares que contemplem de forma direta e indireta os pais e a comunidade. Geralmente, estes sujeitos não participarão dos projetos se a gestão escolar deixar de envolvê-los e de responsabilizá-los. Assim, na interação com a comunidade escolar, com certeza, haverá mais apoio para a tomada de decisões e o processo será de uma gestão democrática, ampliando-se o desenvolvimento de projetos culturais e pedagógicos da escola e, consequentemente, a aprendizagem dos alunos.

Geralmente, os alunos que compõem uma sala multisseriada são porque não existem muitos alunos na comunidade para formar diferentes turmas na escola. Assim, para evitar maiores gastos públicos, eles são organizados da seguinte maneira: 1° ao 3° ciclo ficam à frente de todos na sala de aula, pois se desconcentram com facilidade do conteúdo proposto, além disso, o PPP (Projeto Político Pedagógico) é elaborado de tal forma que atenda as necessidades dos mesmos. Em seguida, o 4° e 5° têm facilidade de se concentrar, portanto, se concentram nos fundos da sala de aula e dessa forma são trabalhadas as necessidades de cada discente.

A presença de escolas que se organizam em turmas multisseriadas, com alunos de diferentes séries e níveis em uma mesma sala de aula, não ocorre apenas no Brasil. É uma solução adotada em diferentes países para permitir que a população das áreas rurais tenha acesso à educação, já que a baixa densidade demográfica nessas áreas e o consequente baixo número de alunos inviabiliza a criação de turmas voltadas ao atendimento de séries ou anos específicos (SCHENINI, 2012, p. 01).

O desafio de se pensar em uma alternativa para melhorar a qualidade de atendimento aos alunos das classes multisseriadas ainda é um desafio no Brasil, em especial no Estado de Mato Grosso, do qual Cáceres se insere enquanto município, pois a distância geográfica dessas escolas em relação à cidade é considerável e o transporte precário. No entanto, é preciso acreditar que os professores que ali atuam devem ter oportunidades para realizar a formação inicial ou continuada para atender aos seus alunos com capacidade formativa. É preciso respeito dos políticos para pensar nessa clientela, visando incluí-los nos planejamentos estratégicos e não excluí-los dos recursos formativos e até tecnológicos, hídricos, hidráulicos, ou seja, estrutura escolar em todos os sentidos.

3. Evidências sobre o Ensino da Matemática no Projeto Escola Ativa

As concepções que fundamentam a Escola Ativa são baseadas na compreensão de que, para se obter mudanças no ensino tradicional, melhorar a prática dos docentes e, consequentemente, a aprendizagem dos alunos nestas classes, deve-se levar em conta: a aprendizagem ativa centrada no aluno, a aprendizagem cooperativa, a avaliação contínua, entre outros fatores. Verificar como se efetiva a aprendizagem do aluno, buscando perceber se há déficit de aprendizagem neste modelo e analisando como é a distribuição e organização do espaço na sala de aula e se esta afeta a aprendizagem dos alunos.

Ribeiro (1990) afirma que um teste elaborado pelo professor deve ter validade de conteúdo, ou seja, o teste deve corresponder aos objetivos previamente concebidos. Para tal, há uma necessidade de o professor, antes de aplicar o teste, verificar se efetivamente as questões que coloca ao aluno avaliam, de fato, os objetivos.

Em torno das classes multisseriadas formou-se uma imagem de que este ensino é de segunda categoria e, o que é pior, sem alternativa de melhoria. Partindo desse ponto de vista, muitos educadores e gestores optaram por esquecê-lo, esperando que desaparecessem, talvez como consequência natural de um processo de desenvolvimento econômico que destacou para as cidades, nas últimas décadas, um enorme contingente da população rural. A partir desses fatos surge, no ano de 2009, o Programa Escola Ativa (doravante PEA), que se tornou oficialmente específico para salas multisseriadas, oferecido pelo governo federal a todos os Estados da federação. O PEA existe há mais de dez anos nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil e há mais de trinta anos é conhecido como “Programa Escuela Nueva” (PEN), na Colômbia. Este é disponibilizado também para as regiões sudeste e sul do país, após se tornar acessível para todos os municípios nacionais.

O PEA começou a ser implementado no Brasil em 1997, com os objetivos de ampliar o acesso à educação básica no meio rural e melhorar a qualidade do ensino nas classes multisseriadas. Como estratégias, investe-se principalmente na infraestrutura física das escolas, na formação de professores, no fornecimento de novos meios de trabalho e recursos pedagógicos para a escola (FUNDESCOLA, 2005).

O PEA inicialmente esteve ligado ao Projeto Nordeste/MEC e, em 1999, foi assumido pelo Fundo de Fortalecimento da Escola – FUNDESCOLA, constituído com recursos de empréstimos, contratados pelo Brasil, junto ao Banco Mundial para a melhoria da qualidade das escolas de Educação Fundamental.

A crescente expansão do PEA a partir de 1998, sustentada em contrato do Governo com agências multilaterais, bem como a prioridade atribuída à educação rural em matéria de políticas públicas – expressa em documentos da FAO/UNESCO (2004), do PREAL (1998) e documentos produzidos pelos movimentos sociais (BRASIL, 2003).

Assim, a Escola Ativa passou a trabalhar com Guias de Aprendizagem (são livros didáticos das áreas do conhecimento – Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, História e Geografia. Esses livros têm como principal alternativa o desenvolvimento da autonomia do aluno, através da realização das atividades que enfatizam a auto-aprendizagem), Cantinhos de Aprendizagem (espaços organizados pela comunidade escolar para pesquisa, investigação, observação e aquisição de novos conhecimentos. Nesse espaço devem ter: material para manuseio e observação, material de apoio e incentivo à pesquisa, produções dos alunos, artigos e produtos produzidos na comunidade.

O eixo denominado números e operações consiste no estudo dos números naturais e racionais e de operações fundamentais. Neste eixo costumam-se trabalhar a leitura e a escrita do sistema decimal de numeração, os logaritmos convencionais das operações e as relações de ordem dos naturais. O eixo de geometria refere-se à exploração do espaço e forma e dos movimentos, onde estão associados, localização de espaço nas três dimensões, a semelhança, a simetria, dentre outros. Os conhecimentos deste eixo são normalmente adquiridos a partir de experiências advindas, principalmente do mundo físico e daí o interesse que os alunos normalmente apresentam por este conteúdo, que deve ser sistematizado de forma progressiva e com compreensão.

O eixo Grandezas é tudo aquilo que se convencionou como possível ser mensurado (comprimento, área, volume, massa, tempo, temperatura, valor monetário e velocidade). As medidas são parâmetros com os quais pode-se mensurar determinada grandeza (por exemplo: metro, litro, quilograma). Esse eixo, assim como os demais, é de grande relevância social, pois na vida em sociedade as grandezas e medidas estão presentes em quase todas as atividades humanas, desde as mais simples às mais complexas. Também esse conteúdo é importante para o trabalho com os significados de outros conceitos matemáticos como número natural, racional e da ideia de proporcionalidade e escola.

As grandezas e as medidas tornam-se bastante significativas para a aprendizagem matemática, pois mostram mais claramente ao aluno a atitude do conhecimento matemático no seu cotidiano.

O eixo tratamento da informação é constitucional por tratar de conteúdos relativos e de estatísticas que se referem ao combinatório e à probabilidade. Na sociedade atual, esses conteúdos são muito mais relevantes, pois se referem à interpretação e compreensão de dados, veiculados principalmente nos meios de comunicação.

4. Análise das Dificuldades Vivenciadas por Educadores no Ensino da Matemática em Sala de Aula Multisseriada

A maioria dos docentes enfrenta diversos problemas com os discentes dos anos iniciais do ensino fundamental. As “deficiências” e a falta de interesse que os mesmos apresentam é um fato que preocupa os educadores responsáveis por estas turmas. É a partir dessa realidade que surge a preocupação de averiguar como está sendo o processo de ensino nos anos iniciais do ensino fundamental, principalmente em escolas onde existem salas de aula com turmas multisseriadas (alunos de série diferentes numa mesma sala de aula).

Dessa forma, a maioria dos alunos das salas multisseriadas não consegue dominar os conceitos básicos de matemática. Por exemplo: somar, subtrair, dividir e multiplicar. Um problema que chama bastante atenção, pois os conhecimentos matemáticos são, sem dúvida, primordiais na vida de um indivíduo que pretende seguir uma carreira acadêmica ou até mesmo melhorar sua qualidade de vida.

A partir da realidade das turmas multisseriadas, surgiu a preocupação de procurar contribuir com o propósito de vencer os problemas enfrentados em sala de aula pelos professores, visando estimular a formação de indivíduos críticos e responsáveis, transformadores da realidade, ou seja, do seu cotidiano. Sabe-se que o processo de ensino em matemática vem sendo questionado ao longo do tempo. Os diversos problemas que as escolas enfrentam com a falta de interesse dos discentes em relação à disciplina de matemática são preocupantes, principalmente em escolas que trabalham no sistema multisseriado, onde geralmente são encontradas nas zonas rurais dos municípios.

Saber trabalhar com alunos de vários níveis simultaneamente e ter criatividade para deixar os estudantes envolvidos nas atividades em grupo são dicas da professora (1) para lecionar em classes multisseriadas. Formada em História há 26 anos, onde as turmas eram formadas por em média 13 alunos de 4 a 10 anos de idade, ela menciona que há várias estratégias que podem ser utilizadas em classes multisseriadas. Uma delas é fazer um planejamento específico para cada série. “Nesse modelo, trabalho como se a sala estivesse dividida por divisórias, fazendo com que cada aluno trabalhe separadamente”, esclarece a professora. Outra metodologia muito utilizada por ela é a do planejamento integrado, com a criação de projetos que envolvem todos os alunos. “As atividades são feitas coletivamente, mas cada aluno entrega um trabalho diferente” (P1).

A professora (2), localizada no mesmo município, concorda com a professora (1). Licenciada em pedagogia, ela acredita que professores de classes multisseriadas devem conhecer a realidade de sua turma e ter consciência da missão de atender as necessidades de cada série. “Sendo um sistema que acolhe várias séries em uma única turma, a professora deve respeitar o nível de aprendizagem de cada aluno”, acrescenta. Apesar de desafiadora, a tarefa de ensinar uma turma de alunos com idades e níveis de ensino diferentes tem gerado resultados satisfatórios. Ela conta que, com o sistema multisseriado, o professor acaba conhecendo melhor a realidade do aluno e de sua família. “Os estudantes também contam com a ajuda dos colegas nos estudos de grupo e em dupla, e assim aprendem mais”, por outro lado, ressalta que, mesmo trabalhando em grupo, os alunos avançam individualmente, cada um no seu próprio ritmo.

5. Considerações Finais

O presente estudo objetivou discutir os aspectos evidenciados sobre a Matemática na realidade da Educação do Campo na coleção “Guias de Aprendizagem de Matemática”, do Programa Escola Ativa, destinados para as realidades campesinas brasileiras; conhecer as formas de trabalhar simultaneamente com alunos de vários níveis numa mesma sala de aula para aprender Matemática; identificar quais são as dificuldades enfrentadas pelos educadores em salas multisseriadas. Assim, constatou-se que a aprendizagem dos alunos matriculados em salas multisseriadas ocorre em ritmo diferente ao de alunos de salas regulares, inseridos em turmas de mesma idade e fase escolar.

Ao entrevistarmos as professoras – P1 e P2 que atuam em turmas multisseriadas em Cáceres, percebeu-se que até as atividades cotidianas demandam competências matemáticas e, assim, todos os alunos, sejam da área urbana, seja da área rural, deveriam ter acesso aos conhecimentos matemáticos. Para isso, é necessário que o currículo matemático respeite a pluralidade sócio-cultural existente em nosso país, considerando seus sujeitos e suas realidades.

Por isso, torna-se relevante analisarmos se os livros didáticos destinados para os alunos dos primeiros anos escolares, como os da Escola Ativa, verificando se completam os conteúdos e se contextualizam com a realidade rural dos alunos para o qual são destinados, de forma a terem significado no processo de ensino e de aprendizagem em salas multisseriadas. Este é um projeto de pesquisa a ser continuado no decorrer da graduação em Matemática.

6. Referências Bibliográficas

BORBA, Marcelo de Carvalho e ARAUJO, Jussara de Loiola, Construindo pesquisas coletivamente em Educação Matemática. In: BORBA, Marcelo de Carvalho e ARAUJO, Jussara de Loiola (Org.). Pesquisa Qualitativa em Educação Matemática. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. p.25-45.

BUARQUE, L. Levi. REGO, L.L. Browne (org). Alfabetização e construtivismo: teorias e práticas. Recife: Editora Universitária, UFPE, 1994.

FUNDESCOLA. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Guia para a formação dos professores do Escola Ativa. Brasília: MEC, 2005.

RIBEIRO, A., C., & RIBEIRO, L.,C.. Planificação e avaliação do ensino-aprendizagem. Universidade Aberta, 1990.

SCHENINI, Fátima. Escolas Multisseriadas. Disponível em: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/conteudoJornal.html?idConteudo

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Este texto foi publicado na categoria Metodologias e Inovação Pedagógica.

 About Pedagogia ao Pé da Letra

Sou pedagoga e professora pós-graduada em educação infantil, me interesso muito pela educação brasileira e principalmente pela qualidade de ensino. Primo muito pela educação infantil como a base de tudo.

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