Alfabetizar: O Dilema Nosso de Cada Dia
Venha descobrir a melhor maneira de alfabetizar e vencer o desafio da Educação. Aprenda técnicas simples e práticas para tornar a alfabetização acessível para todos. Experimente agora e dê às crianças a chance de conhecer as letras e aprender.
Refletir sobre essa questão, a alfabetização, veio pelo fato de estar trabalhando numa instituição pública que atende crianças de 6 a 12 anos com dificuldades de aprendizagem.
Nos últimos anos, observamos que a faixa etária entre 10 a 12 anos tem chegado ao nosso serviço apresentando sérios problemas com alfabetização. Encontram-se num período alfabético-silábico, e essa demanda vem crescendo significativamente, levando-nos a pensar sobre quais os fatores que poderiam estar interferindo neste processo e como poderíamos intervir do ponto de vista educacional.
Sabemos que para aprender a ler e a escrever precisamos pensar sobre a escrita, pensar sobre o que a escrita representa, como a mesma representa graficamente a linguagem, que por sua vez está diretamente ligada aos pensamentos afetivos que foram processados singularmente.
Portanto, estamos propondo a ideia de que há uma cadeia de significantes e significados, co-ligados por relações afetivas, sócio-culturais e interacionais, construídas ao longo do desenvolvimento humano. Sem dúvida, não descartamos as possibilidades orgânicas e demais variáveis que possam interagir no processo da alfabetização/alfabetizador, porém nos deteremos neste recorte, já que as demais variáveis não fazem parte do escopo deste artigo.
Hoje temos uma variedade de teorias, técnicas e modelos para a alfabetização e, por outro lado, encontramos ainda uma demanda de alunos que não se “encaixam” em nenhum destes modelos conhecidos. Para mais informações sobre as dificuldades na alfabetização, veja dificuldades na aprendizagem.
Chegamos ao ponto, o “conhecido”, muitas vezes a procura de algo familiar transforma a prática educativa em regra, levando à imposição e à rigidez, conduzindo à falta de resultados no processo de alfabetização.
Nestes momentos, o educador se depara com sentimentos de impotência, desânimo, irritação, etc. Por outro lado, no aluno, iniciam-se ou acentuam-se os comportamentos de apatia, agressividade, desinteresse, baixa frequência às aulas, etc. Sem que se percebam, educador e aluno estão presos na normatização do Sistema Educacional.
Encontramos então um impasse nessa relação professor/aluno, ambos paralisados e oprimidos pelo desejo do conhecimento perdido?! O que fazer?
Reflexões sobre a Pós-Modernidade
Vamos refletir um pouco do ponto de vista cultural, a pós-modernidade, sendo pensada como intensificadora desse processo.
A característica da sociedade pós-moderna é a fragmentação social, o individualismo, o consumo mercantil-tecnológico, a classe média, a flexibilidade das ideias e dos costumes, a liberação sexual, a educação permissiva, o desejo pelos bens de serviço no lugar do poder, o mundo das especialidades e ou especialistas, etc.
O indivíduo vive um tempo fugaz, hedonista e narcisista, mexendo com suas perspectivas e referências diante do conjunto social. A história, a democracia, a família, a religião e a ética tendem a esfriar; os indivíduos estão se concentrando em si mesmos, hiperprivatizando suas vidas, o que conta é o aqui-agora.
Esse panorama reflete a nossa realidade atual e revela a realidade de quem são nossos alunos, muitas vezes impregnados por uma cultura paralisante.
Segundo BAUDRILLARD*(1993), a sociedade vive com o advento da pós-modernidade um imenso processo de destruição de significados, igual à anterior destruição das aparências provocada pela modernidade.
O que parecia estar seguro e representar algo de certeza perde as certezas. No pós-moderno, as informações se tornaram produto de manobra, os fatos são transmitidos através de uma comunicação racional, banal, perdendo o sentido e o conteúdo emocional.
Tudo isso faz parte dos noticiários (imprensa falada/escrita), das novelas, dos desenhos, dos filmes veiculados pelos meios de comunicação de massa, como exemplo predominante à televisão. Equipamento eletrônico presente na grande maioria das casas dos brasileiros e muitas vezes sendo a única fonte de relação/informação com o mundo.
A pós-modernidade tem como característica colocar à prova os avanços da ciência, questionando constantemente, gerando paradigmas e pluralidade de pensamento, porém revestida como mercadoria de consumo e poder.
Sendo assim, a educação faz parte desta dinâmica também. Para falarmos em alfabetização, é imprescindível falar do alfabetizador.
Precisamos considerar a “produção do saber escolar”, em que condições desenvolvem a formação profissional e a humanização do conhecimento no mundo contemporâneo, tarefa essa nada fácil para o Sistema Educacional!
Portanto, propomos o modelo do EDUCOMUNICADOR, segundo a autora JACQUINOT**(1998). “Não é um professor especializado encarregado do curso de educação para os meios. É um professor do século XXI, que integra os diferentes meios nas suas práticas pedagógicas.”
Essa nova identidade profissional tem a dupla função teórica de unir as ciências da educação com as ciências da comunicação. Tentaremos, neste papel, unir os vários aspectos da aprendizagem, buscando nos meios de comunicação de massa, como por exemplo a televisão, sendo a coadjuvante desse processo facilitador.
Sendo assim, necessitamos nos destituir dos pré-conceitos sobre a TV, mas considerá-la como a aliada mais próxima da comunicação, linguagem e modelos identificatórios que nossos alunos possuem em seu cotidiano, aliás, muitas vezes fazendo o papel de companhia na ausência dos pais.
Sabemos por meio de pesquisas já realizadas que o público de alunos que assistem à televisão, independente de sua faixa etária, têm uma identidade formada sob diferentes aspectos, história pessoal, camadas sociais diferentes, mas destacamos particularmente o saber: que é fragmentado, pautado na imagem, no imediatismo e destituído de significados.
O educomunicador, portanto, tem esta função: fazer as inter-relações destas culturas.
Muitas escolas da nossa Rede Municipal possuem equipamentos eletrônicos, como TV e vídeo-cassete, porém o que notamos é o uso ineficiente e/ou raramente utilizam-se deles como recursos pedagógicos em sua sala de aula. Também muito pouco é aproveitado das comunicações orais que os alunos trazem sobre o que assistiram na “telinha”.
Os alunos chegam à escola dominando a linguagem oral (variante empregada por seu grupo social), influenciada pelo padrão familiar, televisão e membros da sociedade que estão culturalmente inseridos. Essa linguagem tem uma função para a vida infantil: sua adaptabilidade à realidade, facilitar os relacionamentos, expressar seus sonhos, desejos, opiniões, bem como seu ingresso à vida ajudando na conquista de sua autonomia.
Portanto, temos um fato a considerar: as crianças já chegam à escola com relativa desenvoltura. Cabe ao professor dar continuidade a essa linguagem sem interrompê-la de forma brusca, impondo as normas do padrão culto (variante normatizado pela cultura).
A intervenção mediadora do professor pressupõe transformar os conjuntos de fragmentos e informações trazidos pelo aluno (cultura, emoções, linguagem, etc.) em um conjunto integrado, e é sem dúvida uma das tarefas mais difíceis da escola atualmente.
Notamos, sem dúvida, que as escolas e educadores que apresentarem menor resistência para admitirem que a apropriação do conhecimento e dos valores mudaram sob a influência pós-moderna terão maior chance de modificarem o quadro atual de alunos com inibição na alfabetização e, consequentemente, conseguirão sucesso na alfabetização.
Segundo JACQUINOT (1998), historiadores e filósofos mostraram muito bem que a escrita e depois a impressão não mataram o saber, contudo modificaram a referência do saber, isto é, as condições de sua transmissão, através da aprendizagem que era mecânica, por repetição, memorização, correspondente da linguagem oral. Ao aparecer a imprensa, valorizou-se o sentido da visão em detrimento dos outros sentidos, donde o interesse foi delegado à imagem simbólica.
Os educadores ao iniciarem um trabalho de alfabetização com seus alunos devem aproveitar ao máximo a linguagem oral, através das quadrinhas, parlendas, músicas, canções ou fragmentos de assuntos televisivos, que em geral eles sabem “de cor” ou memorizam com facilidade, porque a transmissão é mecânica e se aproxima da linguagem utilizada.
Num segundo momento, a utilização da imagem televisiva, programas, filmes, fotos, embalagens, marcas ou logotipos, permite que o aluno imagine o que poderia estar escrito ou poderá criar um texto com seu próprio conteúdo interpretativo.
Estudos em diferentes línguas têm mostrado que, de uma correspondência inicial pouco diferenciada, o alfabetizando progride em direção a um procedimento de análise e passa a corresponder recortes do falado a recortes do escrito. É um processo paulatino, mas os alunos irão percebendo as diferenças de modalidades culta e oral e irão generalizando no seu cotidiano.
Destacamos que essa postura educativa se fundamenta na utilização da diversidade das realidades sociais e culturais, implicando na mudança do papel do professor como detentor do saber, cujo papel será então o de mediador. Também o uso dos recursos televisivos ou da imprensa deverá se pautar numa atividade crítica, por exemplo: “aprender a responsabilidade do contexto da escrita”, “aprender a distinguir um fato de uma opinião de massa”, etc.
Segundo a autora, o educomunicador reconhece que não há mais monopólio da transmissão de conhecimento e que não é só o professor que tem direito à palavra. Os professores que introduziram os meios na escola, a imprensa, a televisão, puderam perceber que isso provoca uma mudança nos objetivos e métodos de ensino.
Enfim, os educadores precisam admitir que as novas gerações possuem outras formas de aprendizagem.
Uma Escola Transformadora
Uma escola transformadora é uma escola consciente de seu papel político, cultural e ético, na luta contra as desigualdades sociais e econômicas. Sua função deverá ser de instrumentalizar seus professores para que possam promover condições mediáticas, com o objetivo da formação dos cidadãos do século XXI.
Obs.:*
*Baudrillard, Jean. Televisão Revolução, in Parente, André. Imagem Máquina. R..J. Editora 34, 1993
**Geneviève Jacquinot, Professora da Universidade de Paris
I Congresso Internacional de Comunicação e Educação.- 1998
Tema proferido: O que é um educomunicador?
Sugestões Bibliográficas
- O Que é Pós-Moderno?
- Jurandir Freire Costa
- Ed. Brasiliense
- Rede Imaginária: Televisão e Democracia
- Adauto Novaes
- Ed. Companhia das Letras
- Sociedade da Informação ou da Comunidade?
- Ismar de Oliveira
- Ed. Cidade Nova
- A Criança e a TV
- Raquel Soifer
- Ed. Artes Médicas
- Alfabetização de Jovens e Adultos e Televisão
- Maria Clara Pierrô
- Revista Comunicação e Educação /Abril de 1995
- Ed. Segmento
Autor: Marina S. Rodrigues Almeida