Há alguns anos eu lia frequentemente Nietzsche (tenho uns 12 livros dele em casa. Meu favorito é Para Além do Bem e do Mal).
Relendo ontem, por acaso, um trecho de Assim Falou Zaratustra, me dei conta de algo: Nietzsche e Skinner possuem grandes semelhanças em termos de obra.
Como nunca achei nenhum texto que falasse dessa semelhança entre 2 autores aparentemente tão diferentes, resolvi eu mesmo escrever um. E aqui está, em forma de post:
1) Semelhanças Pessoais
Vamos começar com semelhanças menores, tiradas de suas vidas pessoais, que podem ser consideradas coincidências:
- Ambos tinham carreira universitária (grande coisa… gênios em geral se criam no meio acadêmico, com algumas exceções, claro).
- Ambos tocavam piano (Nietzsche era compositor e Skinner curtia tocar Jazz).
2) A Literatura como Ponto de Partida
A Literatura como ponto de partida em comum
Nietzsche dizia que a Filologia era um ramo da História da Literatura que permitia estudar, através dos textos do passado, as instituições ideológicas de uma época, e assim compreender como as pessoas pensavam ontem e porque agem como agem hoje.
Analogamente, Skinner (que era graduado em Letras e sonhava ser um escritor), dizia que a etimologia era um meio poderoso de descobrir como as pessoas pensavam no passado, e como modelaram a cultura a partir desses comportamentos verbais.
3) Teoria da Mente
Nietzsche dizia que a mente era apenas uma parte do corpo, sem existência independente. Também negava completamente a metafísica, dizendo que a mente seria comparável ao funcionamento do estômago: trata-se de um processo, e não uma coisa, pela qual ‘comemos e digerimos’ o ambiente. Nietzsche dizia, por exemplo, que nada melhor para pensar bem do que caminhar, viver em um clima ameno e às vezes respirar o ar das montanhas, evitar o álcool e o sexo (ok, isso é questionável) e ter saúde física (mostrando como para ele a “mente” era contingente ao corpo).
Para Skinner, de forma impressionantemente parecida, a mente é apenas uma metáfora, um jogo de palavras para designar comportamentos que dependem do ambiente, do corpo.
4) Teoria do Self / Ego
Para Nietzsche, o ego era inexistente. Trata-se apenas de uma “coleção de objetos” que reunimos pela experiência, e estão ilusoriamente reunidos com coerência.
Para Skinner, o self/ego seria algo parecido: um conjunto de comportamentos.
5) Crítica ao Racionalismo
Nietzsche, que nunca gostou dos alemães, era fervoroso crítico do Racionalismo, e também das “críticas da razão” de Kant. Achava graça do fato dos racionalistas inventarem “faculdades cognitivas” que explicavam fenômenos como desejos, pensamentos, etc. Para ele, apenas a experiência concreta de vida contava.
Skinner também sempre criticou a postura racionalista de crer em uma mente geradora de comportamentos. Essa é a grande pedra angular de sua obra: a superação do mentalismo.
6) Ateísmo
Nietzsche encheu seus livros de um ácido ataque à religião, especialmente ao cristianismo.
Skinner também era ateu e criticava a religião, que associava a comportamentos supersticiosos. Porém, era mais ameno: se limitava a mostrar seus efeitos colaterais como agência controladora.
7) Pensar a Cultura
Nietzsche tinha um “projeto cultural” para a Europa. Pretendia reformar as instituições do continente através de uma arte e filosofia mais elevada, afins com os valores nobres da Grécia Antiga e que pudessem proporcionar a vinda de uma nova sociedade, formada de homens superiores ao tacanho homem moderno. Ele chegou a dizer que o filósofo era como um médico da cultura.
Skinner também tinha a ambição de projetar culturas. Ele deixa isso claro em sua obra: a Análise do Comportamento tem por maior utilidade gerar um ambiente social mais favorável à vida.
Ok, até agora falei das semelhanças. E quais as diferenças entre os 2 autores?
Diria que no âmbito pessoal elas são várias.
Nietzsche era um homem com muitos problemas pessoais, enquanto Skinner tinha fama de ser um pacato pai de família, sempre bem-humorado, apesar de severo na faculdade.
Mas a vida pessoal de cada um é a vida pessoal de cada um, certo?
A principal diferença entre ambos, eu diria, é que enquanto Nietzsche focou temas morais e estéticos, Skinner se debruçou mais sobre a lógica (especialmente a epistemologia científica). Com isso, Nietzsche funda uma inovadora antropologia filosófica. Skinner, uma ciência experimental do comportamento.
Seja como for, os 2 autores merecem ser estudados a fundo!
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