Uma Reflexão sobre o Sistema Educacional Brasileiro
O sistema educacional brasileiro está em constante evolução, mas muito ainda precisa ser feito. Descubra as principais dificuldades, oportunidades e formas de melhorar a educação brasileira com este artigo.
A estrutura do Sistema Educacional Brasileiro é resultado de uma série de mudanças ao longo da história da educação no Brasil. Ao desenvolver este trabalho, foi fundamental a concepção dos aspectos sobre as fases e contextualização deste sistema na seleção dos conteúdos e até na estruturação deste trabalho.
Os primeiros Sistemas Educacionais Brasileiros, que vigoraram durante vários anos, tiveram um caráter excludente, desfavorecendo a grande massa popular e garantindo o acesso à educação somente à elite brasileira. Segundo Ribeiro (1989), ao referir-se a esse longo período, afirma que éramos um país de Doutores e Analfabetos, pois tínhamos cursos superiores para poucos, nenhum incentivo à formação de professores e escassos recursos para a escola pública.
Com a Lei nº 9.394/96 (LDB), buscou-se, levando em consideração a realidade educacional acima descrita, normatizar o sistema educacional e garantir acesso à educação de igual modo a todos. Essa lei traz um conjunto de definições políticas que orientam o sistema educacional e introduz mudanças significativas na educação básica do Brasil.
Para compreender a evolução e dimensão do Sistema Educacional Brasileiro, enquanto parte do processo de desenvolvimento social, foram levadas em consideração algumas premissas:
- A compreensão do sistema educacional brasileiro exige que não se perca de vista a totalidade social da qual o sistema educativo faz parte (SAVIANI, 1987).
- O sistema escolar é um dos elementos da superestrutura que forma, em unidade com o seu contrário – a infraestrutura – a estrutura social (RIBEIRO, 1987).
- Entende-se infraestrutura como os modos e os meios do homem produzir sua existência. Neste sentido, as transformações desses processos devem ser compreendidas como alavancas que pressionam a ocorrência de mudanças na superestrutura que, por sua vez, se movimenta entre dois elementos: as instituições e as ideias.
- A relação entre a infraestrutura e a superestrutura é uma relação determinante que não se dá de forma linear, direta ou absoluta, haja vista que a superestrutura tem refletido em si a contradição fundamental da infraestrutura – conservação X transformação. Cada uma e ambas, enquanto unidades de contrários, reagem e agem combinada e contraditoriamente, via processos de resistências, aceleramentos e recuos, intermediados por normas, regulamentos, concepções filosóficas e políticas, recursos e instituições, entre tantos outros (FREITAG, 1986).
Tomando como referências estas concepções iniciais, o conteúdo do trabalho toma forma, privilegiando dois mediadores da organização educacional brasileira, que se complementam:
- As concepções de educação – seus postulados e expressões na organização da escola brasileira;
- A organização, propriamente dita, do sistema educacional – onde a formação educacional (básica e superior) é determinante do desenvolvimento social do país.
Desta maneira, será demonstrado que a nova proposta educacional brasileira objetiva a democratização e universalização do conhecimento básico, proporcionando educação e cuidado com a escolarização, assumindo um caráter intencional e sistemático, que dá especial relevo ao desenvolvimento intelectual, sem, contudo, descuidar de outros aspectos, tais como o físico, o emocional, o moral e o social (Lei nº 9394/96).
Desenvolvimento
Sobre a Educação e a Escola no Brasil, Saviani identifica quatro grandes concepções na organização, orientação e funcionamento da escola: a concepção humanista tradicional, moderna, analítica e dialética.
A concepção humanista tradicional conceitua a educação a partir de uma visão de homem pré-determinada, onde cada homem é uma essência imutável. Neste sentido, propõe que a educação conforme-se à essência humana, resultando daí o entendimento de que as mudanças realizadas, via processo educativo, são acidentais. Nesse conceito, concentra-se no adulto que representa o homem completo, em detrimento da criança (ser incompleto, “por fazer”). É importante distinguir na linha tradicional suas duas vertentes: uma religiosa (prevalecente na Idade Média) e outra leiga (elaborada por pensadores modernos como “expressão da ascensão da burguesia e instrumento de consolidação da sua hegemonia”) (Saviani, 1987). Entre outros princípios, esta concepção defende os sistemas públicos de ensino, sejam eles: leigos, obrigatórios, universais e gratuitos. Centra no educador (homem completo) o modelo a ser seguido, imitado e reproduzido pelos educandos (seres incompletos), cuja essência poderá ser potencializada ou atualizada através do processo educativo, porém jamais transformada.
A concepção humanista moderna deriva seu conceito de educação de uma pré-determinada visão de homem, a exemplo do que faz a “tradicional”. Difere dessa, no entanto, quando afirma que a existência do Homem precede a sua essência, resultando daí seu conceito de homem: “um ser completo desde o nascimento e inacabado até a morte”. Defende a predominância do psicológico sobre o lógico e descola o centro do processo educativo do adulto para a criança (o educando), para a vida e para as atividades da existência. Admite formas descontínuas de educação, em dois sentidos:
- Considera que a educação caminha segundo o ritmo vital que varia conforme diferenças existenciais e individuais, desconsiderando, na educação, esquemas pré-definidos e lógicos;
- Afirma que os verdadeiros momentos educativos são “transitórios, raros, fugazes” e decorrem da predisposição e possibilidade de cada um.
Em geral, observa-se que as propostas de reformulação da educação, fundamentadas na concepção humanista moderna, priorizam o aparato interno da escola: métodos, metodologias, relação educador-educando.
A concepção analítica, diferentemente das duas concepções anteriores, não embasa seu conceito de educação em uma visão apriorística de Homem. Sua formulação tem como núcleo conceitual a tarefa da educação, definida como aquela que confere significado lógico à linguagem em função do contexto. Concebe o contexto como o tempo, o lugar, a situação, a identidade, os temas de interesse e as histórias pessoais do educador e daqueles a quem este se dirige (SAVIANI, 1987). Essa concepção exclui do processo educativo o contexto histórico e sustenta o caráter utilitário da educação e a neutralidade do conhecimento. Teve destaque no Brasil a partir da década de 60, após a crise da tendência humanista moderna, predominante no período de 1945 a 1960.
A concepção dialética, assim como a analítica, não compreende a educação a partir de um conceito pré-definido de Homem. O conjunto das relações sociais (síntese de múltiplas determinações) forma a gênese dos seus postulados. Defende que a educação explicita os problemas educacionais compreendidos no contexto histórico. Essa concepção, a exemplo da humanista moderna, afirma-se na realidade. Contudo, difere desta quando explica a realidade como um processo dinâmico, caracterizado pela interação recíproca do todo com as partes e com estas entre si. Forma-se no pressuposto de que toda organização social engendra sua própria negação, evoluindo no sentido de uma nova formação social. Nessa concepção, a tarefa da educação é colocar-se a serviço da formação do “novo”, que se constrói no interior do “antigo” (CURY, 1978).
Integrando as concepções de educação e sociedade, a organização social na qual vivemos assumiu suas feições características com a consolidação do poder burguês e a consequente formulação de mundo, segundo o Liberalismo (SAVIANI, 1987).
Apoiando-se nesta assertiva, tem-se que a Escola surge, no Brasil, como instrumento de realização do ideário liberal, organizando-se como sistema de ensino a partir do século XIX, apesar de existir, como função, desde o Brasil Colônia.
A escola brasileira, pensada segundo os ideais liberais, foi confiada à missão de redimir os homens do seu duplo pecado histórico: a ignorância (miséria moral) e a opressão (miséria política) (ZANOTTI, 1972). Para Cunha (1975), essa missão foi tomada pela lógica capitalista, como a maneira legal e legítima de reclassificar as pessoas das diferentes classes sociais, conforme suas motivações e potencialidades inatas (CHRISTOFARO, 1999).
A crença na escola redentora da humanidade, na sua versão original (Liberal) e na tradução capitalista, marcou a organização do sistema brasileiro, que foi alvo de diversos movimentos de reformas. Todos eles buscavam cumprir satisfatoriamente essa missão e superar a insuficiência e ineficiência do próprio sistema, através da incorporação de programas e objetivos mais imediatos que emergiam do processo de desenvolvimento da sociedade. Christofaro (op. Cit.) menciona que mesmo quando o projeto social privilegiou os sistemas não escolares, como forma de produzir o cidadão útil à Nação, foi conferida à Escola o papel de realizar a produção do saber dito “literário” ou “desinteressado”, atrelando o sistema escolar aos sistemas não escolares pelo postulado da neutralidade do conhecimento. Nessa perspectiva, a articulação das concepções de educação com a sociedade brasileira é estrutural e se sustenta nas práticas e projetos sociais, através dos quais os interesses, os princípios e os pressupostos do grupo social dominante tornam-se propósitos e valores do senso comum, ideologia compartilhada pelo conjunto da sociedade e é essa lógica que torna o pensamento liberal hegemônico e a burguesia, além de classe dominante, também dirigente.
De acordo com Saviani (1986), a escola idealizada no século XIX tinha como perspectivas assegurar o direito à educação para todos com qualidade, gratuidade e laicidade e a expectativa da classe dominante era que os membros das classes subalternas, uma vez instruídos, se ajustariam aos projetos dominantes, com o entendimento de que a instrução transformaria os “súditos em cidadãos”.
No entanto, no início do século XX, em especial depois da I Guerra Mundial, a avaliação da escola indicava que as esperanças nela depositadas haviam sido frustradas, pois nem todos nela ingressavam e mesmo os que ingressavam nem sempre eram bem-sucedidos e os bem-sucedidos nem todos se ajustavam ao tipo de sociedade que se queria consolidar. Esta avaliação fundamentou o primeiro movimento de reforma da Escola no Brasil.
Visto que o projeto educacional inicial que havia sido construído segundo a concepção tradicional não havia dado certo, foi então substituído pelo da Escola Nova, cujos postulados conformam a concepção humanista moderna. Enfatizando a qualidade de ensino, o escolanovismo desloca o centro de organização da escola do professor para o aluno e, mais que isso, desloca o eixo de preocupação da educação do âmbito político para o âmbito técnico pedagógico.
O escolanovismo colaborou para a melhora da qualidade de ensino, mas, dado aos poucos recursos da rede escolar pública, esta melhora restringiu-se aos centros escolares experimentais. A escola pública, sem recursos financeiros e humanos para adotar e realizar o que promulgava a pedagogia nova, levou dela apenas os postulados (SAVIANI 1986).
Em um contexto de crescente participação política de segmentos de trabalhadores, que reivindicavam escola universal e gratuita para todos, o eixo do projeto social deslocou-se para o desenvolvimento industrial. À escola coube, nesse projeto, incorporar a lógica que presidia a produção ou elaborar um saber extemporâneo. Assim é que o movimento da escola nova, desencadeado para corrigir o que havia sido um insucesso pela escola tradicional, resulta no que Saviani (1987) identifica como “recomposição de hegemonia da classe dominante” (CHRISTOFARO, 1996).
Tomando como base o que já foi relatado, o propósito agora será demonstrar como se deu a evolução da Organização do Sistema Educacional Brasileiro, concomitantemente com a sociedade brasileira. Para compreendermos esse processo histórico-social, é necessário, primeiramente, reconhecer que a reflexão sobre a educação no Brasil deve ser feita na perspectiva da dependência; em segundo lugar, é necessário adotar uma periodização histórica. Esta tem como base os modelos econômicos predominantes em largos estágios do desenvolvimento da sociedade, destacando em cada um a Escola, como foi pensada e realizada (RIBEIRO 1989).
O primeiro período (1500 a 1930):
Este período abrange o Brasil Colônia, Império e a Primeira República, quando prevaleceu o modelo agro-exportador da economia e a concepção tradicional de educação. Da fase inicial deste período, merece destaque o Regimento da Colônia, de 1548, que regulamenta a conversão dos indígenas à fé católica pela catequese e instrução, trabalho este realizado pelos padres Jesuítas. Embora tenham sido expulsos em 1759, os jesuítas implantaram as bases, estrutura e funcionamento da escola brasileira, diferentemente do que estava previsto no Regimento, instala-se como direito de todos e não apenas da população indígena. Cabe ressaltar que a sociedade neste período era organizada para garantir o modelo agro-exportador e a monocultura latifundiária não dependia de mão de obra qualificada ou diversificada, pois o tráfico de negros supria a necessidade de mão-de-obra.
Diante dessa realidade, surgem na colônia dois tipos de escolas: uma para as populações indígenas (catequese) e outra para os mamelucos, órfãos e filhos dos principais caciques da terra (a instrução através dos internatos – recolhimentos).
Posteriormente, foram criados colégios e seminários destinados aos filhos dos colonos brancos.
Os jesuítas, sendo os responsáveis pela educação na colônia, tornam a Igreja participante privilegiada da sociedade civil e política da época e a Escola um instrumento de grande alcance na reprodução dos valores de uma cultura externa, embasada na visão liberal, já consolidada na Europa.
No último século deste período, a Escola Função deixa de ser a característica da educação na Colônia e a Escola Estrutura passa a ser organizada e regulamentada nacionalmente. Desde então, o aumento numérico de escolas de instrução básica é acompanhado da criação de colégios e cursos cuja finalidade era formar profissionais. Desta maneira, nascem os primeiros cursos de Medicina e Direito, os primeiros cursos técnicos de artes e ofícios e os colégios Militares.
Segundo Teixeira (1989), o sistema escolar era o de formação de clero ou de legista ou do canonista, na forma em que a concebia o RATTIO STUDIORUM dos jesuítas, elaborado no século XVI e mantido até a metade do século XVIII, quando surgem as primeiras críticas à escola, representadas por controvérsias pedagógicas.
Machado (1989), ao fazer uma retrospectiva histórica da educação brasileira, demonstra o caráter fragmentário e dispersivo do ensino de ofícios, cujo primeiro regulamento data de 1826.
No fim do Império e início da República, são delineados os primeiros traços de uma política educacional estatal fruto do fortalecimento do Estado, sob a forma de sociedade política.
Com a primeira Constituição, promulgada em 1824, houve a substituição da proposta de uma política nacional de ensino pela regulamentação da instrução primária gratuita a todos os cidadãos e pela criação de colégios e Universidades onde serão ensinados os elementos das ciências, belas artes e artes. Em relação à escola primária, a Lei de 15 de outubro de 1827 foi a única lei geral sobre este nível de ensino, até 1946.
Nesta Constituição, o Decreto nº 7.147/1879 deve ser destacado, pois dispõe sobre a reforma do ensino primário e secundário no Município da Corte e o Superior em todo o Império. Nele é estabelecido que é completamente livre o ensino primário e secundário no município da Corte e superior em todo o Império, define-se também que até se mostrarem habilitados em todas as disciplinas que constituem o programa das escolas primárias do 1º grau, são obrigados a frequentá-las, os indivíduos de um e outro sexo, de 7 a 14 anos de idade. Porém, esta obrigatoriedade não compreendia aquelas crianças cujos pais, tutores ou protetores provassem que recebiam instrução conveniente, em escolas particulares ou em suas próprias casas e aqueles que residissem distantes da Escola Pública ou subsidiadas mais próximo (de 1,5 Km para os meninos e 1.0 Km para as meninas).
Alguns autores afirmam que foi o Governo Republicano quem proporcionou o maior crescimento de oportunidades escolares, até então, porém essas escolas eram elitistas e com o tempo tornaram-se insuficientes, como demonstra o trecho de Ribeiro (1989) citado a seguir:
“Sobre a formação das elites… no Brasil está processando a seleção dos incapazes feita pelo ensino secundário. Na escola primária, o filho do rico, irmanado com os do pobre, são bons e maus alunos, mas como os pobres são infinitamente mais numerosos, se tem numerosos alunos maus e também, muitos bem dotados, digamos, em dez ricos há um aluno inteligente em noventa pobres, haverá nove alunos iguais a esse rico… Quando começa o ensino secundário, o pobre não pode frequentá-lo; o liceu, o ginásio, o colégio custam muito caro. Os noventa pobres vão para as fábricas, para a lavoura, para a mão-de-obra. Os dez ricos, esses farão exames, depois serão bacharéis, médicos, engenheiros, jornalistas, burocratas, políticos, constituirão a elite nacional dominadora… Mas como nesses dez, apenas um é inteligente, nossa elite tem apenas 0,1 de capacidade.”
A organização política advinda com a Proclamação da República apoiou-se na descentralização político-econômica, refletindo-se também na organização escolar, como evidenciado no texto da Constituição de 1891. Mediante a essas definições, a Escola se organiza em graus de ensino: o 1º grau para crianças de 7 aos 13 anos e o 2º grau para crianças a partir dos 13 anos.
Uma das intenções desta nova organização escolar era que os diversos níveis de ensino se tornassem formadores e não apenas preparadores para o grau seguinte. O ingresso nos cursos superiores seria precedido de exames (no final do curso secundário) objetivando medir a capacidade intelectual dos formandos/ingressistas. Outra intenção era assegurar que a formação no 2º grau ocorresse tendo como base a ciência, substituindo assim o que chamavam “academismo literário”, criticado como resultado do predomínio da escola tradicional. Portanto, as controvérsias e propostas de reformas giravam em torno de 2 dilemas:
- Formação humana X preparação para o ensino superior
- Formação humana baseada na ciência X formação humana baseada na literatura.
Resultado desse impasse é que ambos os ensinos (1º e 2º) tornaram-se enciclopédicos. Acrescentando ao conteúdo tradicional os conteúdos ditos científicos, não resolvendo o dilema nem o nível de ideias, muito menos da suficiência da escola. Na prática, a escola se manteve como preparadora daqueles que iriam ingressar no grau de ensino subsequente.
O segundo período (1930 a 1960):
Este período é marcado por intensas movimentações e tensões. A crise de 1929 provocou no Brasil duas transformações estruturais importantes:
- A substituição da importação de bens de consumo por produtos nacionais, o que fortalece a indústria nacional e a nova burguesia urbano-industrial;
- A diversificação da produção e relativização do poder econômico dos cafeicultores, levando tanto o Estado como a sociedade civil a significativas reestruturações.
As modificações da estrutura econômica fazem surgir novas forças sociais e graves confrontos com o governo e com o poder estabelecido. A burguesia industrial, o operariado, a classe média ou a pequena burguesia das cidades ora polarizavam entre si, ora articulavam-se contra as orientações do governo. Para o Governo, o desenvolvimento da sociedade dar-se-ia com o desenvolvimento do modelo capitalista, mesmo que dependente. Já o movimento das forças sociais pretendia romper com a dependência externa e reorientar o desenvolvimento no sentido da transformação econômica, política e social, cujo resultado desejado era o crescimento automático e autônomo do padrão de vida de toda a população e não da pequena parcela dela.
De acordo com Ribeiro (1989), com o fim da Segunda Grande Guerra e a derrota dos países do Eixo, o Brasil amarra-se definitivamente com os Estados Unidos, único país capitalista que sobrou da Segunda Guerra Mundial em condições de sobrevivência. E neste contexto, começa a penetração norte-americana no país, que irá atingir o apogeu em 1955. A escola e a educação reassumem, neste momento, um espaço privilegiado no projeto social, mantendo, no entanto, a convicção de que seus fracassos até então diagnosticados estavam na forma de fazer escola e não nos seus conteúdos, no acesso restrito e na falta de recursos.
O texto principal no tema educacional agora será baseado na concepção humanista moderna e em seus defensores. No entanto, entre os “bastidores”, já fermentava o dilema da “escola literária” X o “aprender útil”, defendido como sendo de aplicação imediata, menos demorada e direcionada para a produção do desenvolvimento. Os pioneiros da educação, contrários a essa “ideia” de escola, apresentam um projeto de sistema educacional, baseado no pressuposto de que medidas educacionais deveriam ser tomadas e apoiadas a partir de um programa educacional amplo, com unidade de propósitos e sequência determinada. Propunham a organização de cursos acadêmicos e profissionais em um mesmo estabelecimento; combatiam o dualismo entre ensino profissional e cultural, sendo contrários ao centralismo que confundia unidade com uniformidade. O movimento dos “pioneiros” marcou o tipo de escola e sistema escolar da época, mas não impossibilitou o crescimento da escola tecnicista.
Com a criação do Ministério da Educação e Saúde (1930), houve uma reformulação no ensino que abrangeu todos os graus (Decretos n. 19851, n. 19852 e n. 19890). Em relação ao ensino superior, determinava a organização dos cursos isolados em Universidades e exigia que estas se estabelecessem, obrigatoriamente, com um mínimo de três institutos: Medicina, Direito e Engenharia. Permitia-se a substituição de um desses institutos pela Faculdade de Ciências e Letras que “deveria dar, ao conjunto de Faculdades integradas à Universidades, o caráter especificamente universitário pela cultura desinteressada [e, por sua função sintetizadora]…” (Miranda, 1966). Quanto ao ensino secundário, a reforma objetivou imprimir-lhe “caráter eminentemente educativo” e o dividiu em duas etapas:
- A primeira, com cinco anos (fundamental), deveria formar o homem através de “hábitos”, atitudes e comportamento, habilitando-o a viver integralmente e capacitando-o a decisões convenientes e seguras, em qualquer situação (MIRANDA, 1966).
- A segunda, de dois anos, objetivava adaptar o aluno às futuras habilitações profissionais.
Praticamente estas reformas vieram responder ao projeto dos Pioneiros da Educação. Na Constituição de 1937, o ensino técnico é objeto de definições, estabelecendo-se formalmente sua clientela: as classes menos favorecidas. O período de 1930-1937 foi especialmente fecundo do ponto de vista do debate sobre a educação no Brasil, facilitada, inclusive, pela indefinição do governo diante das duas principais correntes que se opunham. Tais tendências e grupos combatiam o princípio do monopólio do ensino pelo Estado, identificado por ambos como um princípio de sustentação tanto do Estado Fascista como do Estado Comunista. Uma análise mais acurada da situação demonstra, porém, que os dois grupos oponentes estavam pactuados no postulado básico e fundamental do liberalismo: a defesa do individualismo e jamais de qualquer outro organismo, instituição ou ideologia.
No entanto, o que aparecia para o grande público era a oposição entre escola pública e escola privada, entre o ensino leigo e confessional, entre o saber literário e o saber útil. Na verdade, a luta era entre duas formas de defesa de interesses particulares: a forma “conservadora” (identificada com as tendências humanistas) e a forma “moderna” (tecnicista).
Apesar das múltiplas reformas do ensino e da promulgação de três cartas constitucionais, também nesse período, o sistema educacional brasileiro não chegou a responder satisfatoriamente e suficientemente a situações como: a melhora do rendimento escolar, o aperfeiçoamento administrativo e a bifurcação dos caminhos escolares após o primário.
Em 1942, a Reforma Capanema abrangeu o ensino secundário e o técnico-industrial, afirmando que daria resposta a essas questões. Para tanto, modificou os ciclos de estudo: quatro anos (ginasial) e três anos (colegial). Este último seria oferecido em duas modalidades: o científico e o clássico, ambos permitindo o ingresso em qualquer curso superior. No entanto, o que aconteceu na prática é que a ênfase dada às “letras”, no curso clássico, dirigiu seus egressos para as Faculdades de Filosofia, Letras e Direito e o científico, voltado para as ciências, orientou seus concluintes para os cursos das áreas de saúde, biológicas e engenharias, e nenhum deles foi “dirigido” às classes baixas da sociedade.
O ensino médio industrial também foi regulamentado em dois ciclos: um de quatro anos para formar artífices especializados em escolas industriais e o outro, de três anos, a ser ministrado em escolas técnicas para formar técnicos especializados. Uma variação sobre este “tema” foi a regulamentação da formação de normalistas com três anos após o ginasial que não se concentrava nem nas “letras” e nem nas “ciências”, mas em cadeiras ditas pedagógicas. Estruturou-se o ensino comercial, como o ramo do ensino médio. Na verdade, a Reforma Capanema, que vigorou até 1961, quando foi aprovada a atual Lei de Diretrizes e Bases (LDB), pensou cada grau e ramo de ensino como forma de “orientar” o ingresso da clientela na escola conforme sua classe social. O ensino superior não recebeu, no período, a mesma atenção, em que pese o aumento no número de matrículas.
A Constituição de 46 e a reorganização da economia, no fim do Estado Novo, apontaram mudanças políticas e econômicas na perspectiva de consolidar o novo projeto social que se desenhou após a Ditadura Vargas e o fim da Segunda Guerra Mundial. No caso da educação, o projeto de lei de diretrizes e bases, indicado na Constituição e a Campanha da Escola Pública mobilizaram todos os grupos sociais. Dos muitos debates e confrontos da época resultou a atual LDB, onde estão contempladas as duas tendências que se polarizavam na sociedade à época. Contudo, a Lei n. 4.024, aprovada em dezembro de 1961, só vai corporificar-se na rede escolar no período seguinte. Já nasce como uma lei tardia, buscando estabelecer um compromisso entre os interesses da burguesia nacional e de frações mais tradicionais da sociedade, ligadas ao capital internacional e articuladas em torno da internacionalização do mercado interno.
Terceiro período (1960 até os dias atuais):
Durante a primeira década deste período, entra em crise a tendência humanista moderna, predominante de 1945 a 1960, começando uma forte articulação social que privilegiou a concepção tecnicista de educação, que novamente foi considerada a adequada ao projeto social e econômico do país. Contudo, por volta de 1968, paralelamente ao predomínio dessa tendência, emergiram as críticas à essa pedagogia dita a oficial e à política educacional que pretendia implementá-las. Essas críticas foram sustentadas pelas teorias crítico-reprodutivistas, tendo o mérito de promover a denúncia sistemática da tendência humanista. Essas teorias, por considerar as relações entre determinantes sociais e educação de modo externo e mecânico, acentuam as posturas pessimistas e imobilistas nos espaços sociais e educacionais, “minando” a crença da educação “redentora da humanidade” e da autonomia da educação em relação à sociedade. Deste modo, cabe à tendência dialética tomar a si a tarefa de abrir caminhos no sentido de captar a especificidade de articulação entre educação e o conjunto das relações sociais. Movimentos contra-hegemônicos defendem que o “espaço” próprio da educação é o da apropriação/desapropriação/reapropriação do saber e que esse espaço está atravessado pela contradição essencial do modo de produção capitalista: a contradição capital-trabalho.
“Sendo o saber força produtiva e sendo a sociedade capitalista caracterizada pela propriedade privada dos meios de produção, a classe que os detém empenha-se na apropriação do saber, desapropriando-o da classe trabalhadora. Sendo impossível a apropriação exclusiva do saber, já que a contradição inerente à sociedade capitalista é insolúvel no seu âmbito, a classe capitalista sistematiza o saber de que se apropria e o devolve parcelado ao trabalhador. Assim, fazendo, detém a propriedade do saber relativo ao conjunto do processo produtivo, restando ao trabalhador apenas o saber correspondente à parcela do trabalho que lhe cabe executar” (SAVIANI, 1987).
Configura-se assim a educação como espaço de luta, sustentada pela tendência dialética.
Na década de 60, surgiu uma nova organização educacional, sob a égide da Lei n. 4.024/61 (LDB), tornando o sistema de ensino um ponto de conflito entre segmentos e grupos sociais. As “prescrições” da LDB, das Reformas Universitárias e do Ensino de 1º e 2º Graus caracterizaram a escola da seguinte maneira:
- currículos definidos nacionalmente;
- minuciosas instruções e formulários, a serem obedecidos e preenchidos como forma de controle, fiscalização e reconhecimento da escola e do ensino ministrado;
- professores, alunos e múltiplos técnicos de educação moldados conforme diretrizes técnico-operacionais.
Com essas prescrições sendo aplicadas e operacionalizadas igualmente por todo o sistema e em todo o território nacional, pretendiam reafirmar o pressuposto da igualdade da escola. Porém, os dados do MEC/SEEC, no documento Sinopse Estatística do Ensino Primário (1972), demonstram que em 1964 somente 2/3 das crianças de 7 a 14 anos estavam matriculados, cinco milhões não estavam escolarizadas e destas 3,3 milhões nem sequer conheciam uma escola e que em 1972 (onze anos após ser sancionada a LDB) ainda não havia escola para 4,4 milhões de crianças nesta faixa etária.
Diante dessas circunstâncias de exclusão social, o princípio do direito e do dever da educação para todos os cidadãos cai em descrédito. Várias explicações para esse fato foram formuladas, mas a mais simples foi a de que o fenômeno da seletividade e da exclusão do sistema educacional era decorrente das diferenças inatas, da dedicação ou de esforços individuais.
A LDB não foi criada para resolver problemas de seletividade (quem são os escolhidos e rejeitados) ou dificuldades de acesso à escola acumuladas desde períodos anteriores, porém visa assegurar os direitos educacionais para a população e esta ter um meio seguro de cobrar seus direitos mediante seus governantes.
O Censo Educacional de 1964 demonstrava, detalhadamente, as dificuldades que as crianças encontravam para ingressar e permanecer na escola, como:
- currículos inadequados (não esqueçamos que a história dos Três Porquinhos foi usada para alfabetizar, pelo método global, todas as crianças que lograram um lugar na escola em todo o Território Nacional!);
- professores mal qualificados;
- equipamentos deficientes (inexistentes!);
- distância de casa à escola;
- falta de transporte;
- ingresso das crianças no mercado de trabalho para colaborar no sustento da família;
- falta de roupas, alimentação e material escolar.
Contra essas dificuldades, a LDB, assim como as leis, os decretos, as resoluções e as portarias em que foi “desdobrada” (Lei da Reforma Universitária nº 5.540/68; Lei n. 5.692/71 de Reforma de Ensino de 1º e 2º Graus; Dec. Leis nº 5.379/67 e 62.484/67 que institucionalizam o MOBRAL; Dec. Lei n. 7.737/71 que institucionaliza o “ensino supletivo” previsto na Lei nº 5.692/71, entre outros), “traduzem as estratégias típicas da classe dominante que ao mesmo tempo em que institucionaliza a desigualdade social, ao nível da ideologia, postulam sua inexistência” (Freitag, 1986). Nessa lógica, as classes subalternas estavam submetidas aos padrões da escola da igualdade, onde a desigualdade social estava perpetuada nos modos de organizar o sistema educacional e o ensino. Nesse processo, as classes “desfavorecidas” acabaram por assumir a culpa da sua “incapacidade” em responder, satisfatoriamente, às regras do jogo educacional definidas pelas classes dominantes.
Porém, essa culpa não foi aceita natural e passivamente. O movimento de articulação social das classes subalternas, na sociedade civil e política, procurou valer-se da educação como canal de mobilidade, ascensão social ou pré-requisito de entrada e reconhecimento no mercado de trabalho. Para tanto, usaram a flexibilidade e a equivalência formal dos cursos, asseguradas pela primeira vez no Brasil a partir desse período. Assim é que a estrutura e o funcionamento do sistema educacional refletiram as ambigüidades e contradições da própria ordem social.
Aparentemente, todos os grupos e classes sociais estavam contemplados na organização do sistema e seu funcionamento vinha ao encontro dos diferentes interesses. Na verdade, são os interesses da classe hegemônica que estão preservados, como pode ser constatado através do caso da privatização do ensino secundário. O “mecanismo” de privatização do ensino secundário funciona como uma das barreiras à entrada das classes subalternas e no ensino superior, ao mesmo tempo que faculta ao setor privado transformar a educação em uma empresa lucrativa. O curso profissionalizante de nível médio, cujo objetivo é qualificar pessoal em habilidades necessárias ao mercado e ao desenvolvimento, vai sendo gradual e frequentemente desvirtuado, tanto por parte do sistema como da clientela. Esses cursos, em geral, estão reduzidos a uma grade curricular e são implantados, apesar da inexistência dos meios e dos recursos exigidos pela sua especificidade. Nesse sentido, acabam por falsear as habilitações que “anunciam”, ao mesmo tempo que são uma fonte de lucro. Implantados para assegurar a entrada no mercado de trabalho, não são procurados pela clientela com esta finalidade, mas sim porque constituem a possibilidade das classes baixas almejarem a Universidade; como não têm acesso aos cursos de segundo grau, preparatórios para o ensino superior, os “desfavorecidos” se “preparam” para a Universidade nos cursos profissionalizantes, oferecidos, em geral, no turno da noite.
O processo ditatorial, instalado com o golpe militar de 1964 e que se prolongou até a década de 80, redefiniu o alinhamento dos processos de organização e participação da sociedade civil, conferindo ao setor educacional, aos partidos políticos e à classe operária particular atenção (FREITAG, 1986). A adoção desse “modelo” econômico vai colidir, frontalmente, com os setores organizados da população que reivindicavam reformas estruturais que permitissem um padrão de produção e consumo democratizado. Estabelece-se o Estado de força, cujo impacto social, político e econômico está presente ainda hoje na sociedade. A organização, estruturação e funcionamento do sistema educacional são tomados como objetos a serem reordenados e fortemente fiscalizados. Num primeiro momento, dois Decretos-Lei dão o tom da política do governo em relação à educação:
- a Lei n. 4.464/64 que proíbe o funcionamento da União Nacional dos Estudantes (UNE), criada em 1937;
- a Lei n. 4.440/64 que institucionaliza o salário-educação: 2% do salário mínimo regional pago pelas empresas à Previdência Social, em relação a todos os empregados; do valor arrecadado, 50% compete aos governos estaduais aplicar no ensino fundamental e o restante destina-se aos Estados mais carentes, através do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação, gerido pelo MEC.
Em 1965, o governo constituiu uma Comissão para estudar, detalhadamente, a universidade brasileira. Compõem tal Comissão cinco americanos e dois brasileiros que elaboraram um relatório que não foi publicado (1967). Considerando o modelo de universidade e a organização que se deu aos cursos através da Lei 5.540/68, é impossível não inferir que a universidade que temos hoje é uma cópia atrasada da universidade norte-americana. Seus parâmetros estão até hoje orientando o funcionamento do ensino superior:
- departamentalização (extinção das cátedras);
- criação dos ciclos básicos por área de conhecimento (ciências humanas, exatas e biológicas);
- sistema de créditos e extinção dos cursos seriados;
- formas jurídico-administrativas múltiplas;
- regime de tempo integral para professores;
- vestibular unificado e classificatório;
- estabelecimento de dois níveis de pós-graduação (mestrado e doutorado).
Estes parâmetros, entre outros, conformam a Universidade. O ensino superior, no Brasil, passa a viver a lógica que a Universidade Americana viveu setenta anos atrás. Somando o que se estabeleceu para o ensino superior com a Reforma do Ensino de 1º e 2º Graus, constata-se que a lógica da organização atual do sistema educacional caminha sob o empuxo das seguintes contradições: contenção x liberação e autoritarismo x democratização. Em relação à primeira, temos o ensino profissionalizante como forma de “desviar” da Universidade todos os que concluem o segundo grau; o vestibular classificatório e não seletivo por nota mínima; e o jubilamento; estes procedimentos são exemplos das estratégias que resultam ora na contenção, ora na liberação. A racionalidade está presente na adoção dos ciclos básicos, gerando a irracionalidade da troca entre qualidade/quantidade, da “perda” de identidade dos cursos. Estes aspectos somam-se e se completam, fazendo emergir a contradição autoritarismo/democracia, assentada em normas repressivas em relação a professores e alunos, paralelamente à medida que aumentam cursos e vagas, objetivando ampliar a capacidade das Universidades em receber um número maior de alunos.
A reforma do primeiro e do segundo graus visou:
- controlar a crise educacional gerada pela pressão do número cada vez maior de jovens chegando ao vestibular (esse foi o sinal mais prático da equivalência entre cursos profissionalizantes e cursos “preparatórios”, no segundo grau);
- colaborar para atenuar o impacto do desemprego resultante da crise no setor de produção, em especial a que ocorreu no período de 1964-1968.
Na reforma do 1º e 2º graus, merece destaque a flexibilidade como o princípio mais inovador para a organização e funcionamento do sistema educacional brasileiro, em toda a sua história. Saviani (1986) chega a dizer que a Lei 5.692/71 é tão flexível que pode até não ser implantada ou ser revogada sem realmente o ser. Como exemplo, confronta os termos do Parecer n. 45/72 – da profissionalização, com o Parecer n. 76/75 também sobre a profissionalização: “o primeiro parecer regulamentou o artigo 5º da Lei; o segundo revogou o primeiro e, com ele, revogou também o artigo 5º da Lei; só que, mediante o princípio da flexibilidade, ele não revogou, ele reinterpretou… e o artigo 5º permanece…”. Tal flexibilidade permite, inclusive, diferenciar “terminalidade legal ou ideal” (o conteúdo de aprendizagem do primeiro grau será dado em oito anos) de “terminalidade real” (é possível, com base nas diferenças regionais, de escola ou do aluno, que esse conteúdo seja dado de formas “mais ligeiras”, encaminhando o aluno para o mercado de trabalho). O que tem acontecido, com muita frequência, é, portanto, o aligeiramento do ensino de primeiro e segundo graus a partir da reforma de 1971, em especial para os jovens de classes sociais “menos favorecidas”. A escola de 1º e 2º graus chega a constituir-se uma mera formalidade legal, cujos conteúdos da chamada “educação geral” e da “educação especial” (através da qual se pretende a profissionalização em múltiplas e diversas “habilitações”) podem ou não ser ministrados. Se este “procedimento” facilita a entrada do aluno na Escola, a saída conferir-lhe-á o título da diferença social na qual será inserido.
A Lei nº 9.394/96 (LDB) e a Realidade Educacional
A tramitação no Congresso Nacional para aprovação e implementação desta Lei foi longa e conflituosa, mas, apesar das inúmeras tentativas de eliminar as conquistas obtidas, ao final, a Lei promulgada oferece novas oportunidades educacionais a todo o povo brasileiro, trazendo um conjunto de definições políticas que visam orientar o sistema educacional e introduzir mudanças significativas na educação básica do país.
Após a retrospectiva histórica da educação brasileira acima descrita, atentemos às mudanças ocorridas na estrutura educacional no Brasil, após a atual LDB, vigorando em todo o território nacional brasileiro.
Educação Infantil
A especificidade atribuída a essa etapa da escolarização opõe-se à visão da pré-escola com base na noção de privação ou carência cultural, tão expressivo no passado, segundo o qual o papel da pré-escola seria o de suprir as “deficiências” das crianças, especialmente as de origens populares.
A manutenção da educação infantil como primeira etapa da educação básica representa uma vitória e a dimensão pedagógica do atendimento de crianças de 0 a 6 anos tem por objetivo o desenvolvimento integral da criança em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social (artigo 29 da LDB).
Segundo Corrêa (2007), as primeiras instituições voltadas para a educação infantil no Brasil surgiram em 1896, na cidade de São Paulo, e a difusão deste nível de ensino só se deu em meados de 1940, principalmente na cidade de Porto Alegre, capital gaúcha, que já contava com 40 jardins de infância. Foi a partir de 1970 que creches, jardins de infância e pré-escola expandiram-se de maneira tímida, principalmente em função da pressão promovida às autoridades competentes pela sociedade civil.
Foi somente com a Constituição Federal de 1988 que começou a alargar os horizontes do ensino infantil no Brasil, pois, em seu artigo 208, inciso IV, afirma que “o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: atendimento em creches e pré-escolas a crianças de 0 a 5 anos”. Isso significa que o Estado é obrigado pela Constituição Federal a disponibilizar vagas para este nível de ensino, pois a família que achar-se lesada por não conseguir matrícula na rede pública para o ensino infantil pode recorrer à promotoria pública que, por sua vez, acionará judicialmente os órgãos competentes. Direitos estes conquistados com a Constituição Federal de 1988, principalmente devido à enorme procura de vagas para crianças de 0 a 6 anos, uma vez que cada vez mais as mulheres conquistavam, de maneira significativa, postos no mercado de trabalho, não dispondo mais do tempo que outrora tinham para cuidar de suas crianças. É importante ressaltar que hoje este nível de ensino, por força da Emenda Constitucional nº 53 de 2006, corresponde às crianças de 0 a 5 anos de idade.
A respeito do Estatuto da Criança e do Adolescente (E.C.A), Lei federal nº 8.069, de 1990, que é mais uma conquista da sociedade civil em defesa dos direitos da criança, principalmente das de 0 a 5 anos de idade. Pois, em seu artigo nº 4, afirma:
- É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 1990).
Ainda em seu artigo nº 53, o Estatuto da Criança e do Adolescente (E.C.A) afirma que a criança tem o direito de ser respeitada por seus educadores em razão de suas limitações de autodefesa por serem de pouca idade. Pois, são comuns muitas instituições de ensino infantil praticar castigos de toda natureza, inclusive físicos, além do espaço ser inadequado e a falta de formação própria dos profissionais para este nível de ensino. Tanto a Constituição Federal quanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (E.C.A) buscam a proteção e a garantia dos direitos das crianças, garantindo o acesso das mesmas em instituições de ensino de 0 a 5 anos. Pois, no artigo nº 54 da (E.C.A) reafirma o dever do Estado em assegurar o atendimento em creches e pré-escolas.
Para reforçar o que acima foi descrito, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (L.D.B), lei Federal nº 9394 de 1996, afirma em seu artigo nº 29 que a educação infantil é a primeira etapa da educação básica e tem como finalidade o seu desenvolvimento físico, psicológico, intelectual e social. Já no artigo 31 diz que na educação infantil a avaliação não terá o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental. Vale ressaltar que em seu artigo nº 30, a LDB subdivide a educação infantil em creches para crianças de até 3 anos e pré-escola para as crianças de 4 a 5 anos de idade.
Em virtude dos acontecimentos já mencionados, chegamos à conclusão que, apesar dos enormes esforços por parte do governo federal e sociedade civil em prol da melhoria na qualidade do ensino infantil, ainda tem muito que se fazer, principalmente na formação dos educadores que atuam neste nível de ensino. Não precisamos de mais leis que assegurem os direitos das crianças, mas sim cumprir as que já existem.
Ensino Fundamental
Relembrando o histórico desta modalidade, no Brasil a educação obrigatória e gratuita foi introduzida com a Constituição Federal em 1934 e era composta de apenas cinco anos; somente por força da Lei nº 5.692/71 esse ensino obrigatório estendeu-se para oito anos com a nomenclatura de primeiro grau. Mas foi com a Constituição de 1988 que esta nomenclatura foi alterada para Ensino Fundamental.
Segundo Romualdo (2007), o ensino fundamental é uma etapa da educação básica destinada a crianças e adolescentes com duração mínima de nove anos, obrigatório e gratuito a partir dos seis anos de idade, de acordo com a Lei nº 11.114/05 e conforme a LDB em seu artigo nº 32, afirma que o Ensino Fundamental terá como objetivo a formação básica do cidadão mediante inciso III: “o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores.” É importante observar que esse artigo, mediante a eliminação do limite de idade para o direito ao ensino fundamental obrigatório, significa a possibilidade de todos os brasileiros, de qualquer faixa etária acima de sete anos de idade, ter acesso a esta etapa da escolarização, podendo exigi-la legalmente do poder público, pois antes a obrigação do Estado na oferta dessa escolarização excluía os que ultrapassassem a faixa dos quatorze anos.
Essa alteração na LDB do ensino fundamental de 8 anos para 9 anos é devido à necessidade da melhoria no ensino obrigatório, sendo assim, o Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, sancionou no dia 06/02/2006 a Lei nº 11.274 que regulamenta o ensino fundamental de nove anos, alterando os artigos 29, 30, 32 e 87 da LDB, que estabelece as diretrizes da educação nacional.
No entanto, devemos estar atentos para o fato de que a inclusão de crianças de seis anos de idade não deverá significar a antecipação dos conteúdos e atividades que tradicionalmente foram compreendidos como adequados à primeira série. Faz-se necessário, portanto, que se construa uma nova estrutura e organização dos conteúdos em um ensino fundamental, agora de nove anos.
Outra inovação da LDB em seu artigo 26 é a obrigatoriedade do ensino de Artes na grade curricular do ensino fundamental, porém, o ensino da educação física compõe a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino, mas, torna-se facultativa aos cursos noturnos.
Todas essas mudanças que ocorreram na estrutura do ensino fundamental têm melhorado de maneira significativa a qualidade neste nível de ensino, no entanto, ainda não é o suficiente.
Ensino Médio
Segundo os artigos 35 e 36 da LDB, esta fase do ensino é a etapa final da educação básica, e observamos que ela vem buscando sua identidade. Ora lhe é delegada a função de preparatório para a universidade, ora sua finalidade é atender ou preparar para o mercado de trabalho.
Segundo Pinto (2007), o governo Vargas, em 1937, implantou um sistema de ensino profissionalizante para atender as camadas populares com o objetivo de preparar “Mão de obra para o mercado de trabalho”, porém, somente o ensino médio propedêutico permitia acesso ao ensino superior.
Mas foi no governo do regime militar em que o ensino médio teve grandes alterações, pois o presidente Médici, através da Lei nº 5692/71, determinou que todas as escolas do país ministrassem um ensino médio de 3 anos estritamente de caráter profissionalizante; tudo indica que era uma tentativa de diminuir a demanda de vagas nas universidades públicas e barrar as manifestações estudantis que ocorriam pelo país.
No atual texto da LDB (artigo 35, inciso III), o ensino médio objetiva preservar o caráter unitário, partindo da proposta de educação geral. Este nível de ensino desempenha a função de contribuir para que os jovens consolidem e aprofundem conhecimentos anteriormente adquiridos, visando uma maior compreensão do significado das Ciências, arte, letras e de outras manifestações culturais.
Outra função delegada a esta fase final do ensino básico é de possibilitar que os jovens possam ter acesso à educação profissionalizante, aprofundando sua compreensão sobre os fundamentos científicos e tecnológicos.
Assim, a Lei objetiva-se em possibilitar o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico.
Por fim, destaca-se a ampliação da carga horária mínima anual de 200 dias letivos de efetivo trabalho escolar, no nível fundamental e médio, segundo o artigo 24, inciso I. E também a progressão continuada, uma inovação que viabilizou procedimentos que contribuíram para minimizar os problemas de evasão e repetência, bem como o tratamento dado com relação à educação indígena e a educação especial.
A educação de Jovens e Adultos (EJA)
Segundo Kruppa (2007), em 1990 (ano internacional da Alfabetização), com Paulo Freire à frente da Secretaria de Educação do Município de São Paulo, organizava-se a Primeira Conferência Brasileira de Alfabetização, na qual representantes do Ministério da Educação (MEC) se comprometeram em priorizar a alfabetização de adultos. Em 1997, o governo Federal desvinculou a EJA do MEC e criou o Programa Alfabetização Solidária, com o objetivo de reduzir as altas taxas de analfabetismo que ainda vigoravam em algumas regiões do país. Programa este presidido pela primeira dama do país e atendendo 1,5 milhão e meio de brasileiros em 1200 municípios brasileiros de 15 Estados, trabalhando em parcerias com empresas, instituições universitárias, pessoas físicas, prefeituras e o Ministério da Educação (MEC).
Além das turmas tradicionais da (EJA), em 2003, o governo do presidente LULA criou o Programa Brasil Alfabetizado, que priorizou de início as instituições filantrópicas, somente a partir do segundo ano as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação que receberam mais recursos do programa, chegando em 2007 com quase 50% de todos os recursos destinados ao Brasil Alfabetizado.
Em consonância com a Constituição, a LDB estabelece que “O dever do Estado com a educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de ensino, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria” (Artigo 4, já mencionado).
No seu artigo 37, refere-se à educação de jovens e adultos, determinando que “A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria”. No inciso I, deixa clara a intenção de assegurar educação gratuita e de qualidade a esse segmento da população, respeitando a diversidade que nele se apresenta.
O desafio imposto para a EJA na atualidade se constitui em reconhecer o direito do jovem/adulto de ser sujeito; mudar radicalmente a maneira como a EJA é concebida e praticada; buscar novas metodologias, considerando os interesses dos jovens e adultos; pensar novas formas de EJA articuladas com o mundo do trabalho; investir seriamente na formação de educadores; e renovar o currículo de forma interdisciplinar e transversal, entre outras ações, de modo que este passe a constituir um direito, e não um favor prestado em função da disposição dos governos, da sociedade ou dos empresários.
Educação Inclusiva
A educação inclusiva é uma educação onde os ditos “normais” e os portadores de algum tipo de deficiência poderão aprender uns com os outros. Uma depende da outra para que realmente exista uma educação de qualidade. A educação inclusiva no Brasil é um desafio a todos os profissionais de educação.
Diante deste desafio, é importante esclarecer que a Educação Inclusiva é:
- atender aos estudantes portadores de necessidades especiais na vizinhança da sua residência;
- propiciar a ampliação do acesso destes alunos às classes regulares;
- propiciar aos professores da classe regular um suporte técnico;
- perceber que as crianças podem aprender juntas, embora tendo objetivos e processos diferentes;
- levar os professores a estabelecer formas criativas de atuação com as crianças portadoras de deficiência;
- propiciar um atendimento integrado ao professor de classe comum do ensino regular.
E que a Educação inclusiva não é:
- levar crianças às classes comuns sem o acompanhamento do professor especializado;
- ignorar as necessidades específicas da criança;
- fazer as crianças seguirem um processo único de desenvolvimento, ao mesmo tempo e para todas as idades;
- extinguir o atendimento de educação especial antes do tempo;
- esperar que os professores de classe regular ensinem as crianças portadoras de necessidades especiais sem um suporte técnico.
Percebe-se ao longo da história e, também na atualidade, que a maioria dos profissionais envolvidos na educação não sabe ou desconhece a importância e a diferença da educação especial e educação inclusiva. Por essa razão, veio à realização deste item para o esclarecimento das pessoas envolvidas na educação e interessados.
Educação Especial
A Carta Magna é a lei maior de uma sociedade política, como o próprio nome nos sugere. Em 1988, a Constituição Federal, de cunho liberal, prescrevia, no seu artigo 208, inciso III, entre as atribuições do Estado, isto é, do Poder Público, o “atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”. No entanto, muito se tem falado sobre as carências do Sistema Educacional Brasileiro, mas poucas vezes é mencionado o seu primo pobre – a Educação Especial. Muito menos são reivindicadas melhores condições para esse segmento que, ao contrário do que parece à primeira vista, abrange um número significativo de brasileiros.
Segundo os últimos dados oficiais disponíveis do censo escolar, promovido pelo Ministério da Educação, existem milhões de crianças e jovens em idade escolar com algum tipo de deficiência. Boa parte deles não tem atendimento especializado, estando matriculados em escolas regulares ou pior, não estudam.
A Educação Especial Brasileira atinge somente pequena parcela dos deficientes, quase a metade deles através de escolas particulares e as demais são federais, estaduais e municipais.
A educação especial trata-se de uma educação voltada para os portadores de deficiências como: auditivas, visuais, intelectual, física, sensorial, surdocegueira e as múltiplas deficiências.
Para que esses educandos tão especiais possam ser educados e reabilitados, é de extrema importância a participação deles em escolas e instituições especializadas. E que eles disponham de tudo o que for necessário para o seu desenvolvimento cognitivo.
Autor: Alexandre