INFÂNCIA SOLITÁRIA: ANGÚSTIA, FRUSTRAÇÃO E DESEJO. DIAGNÓSTICO INFANTIL: A DEPRESSÃO E A AUSÊNCIA COTIDIANA DOS PAIS NA CONTEMPORANEIDADE
A Deus por tudo que sou e tenho. E por permitir que neste período eu encontrasse pessoas de paz e cheias de sabedoria.
Ao Maurício, meu marido, pelo amor e força, meu guia nas florestas da vida.
À Anna Beatriz, minha filha, pelos seus ensinamentos e seu sorriso.
À Jaqueline, minha amiga, pelo carinho e força.
Ao “Japão”, meu amigo, pelos momentos felizes, por tudo que me ensinou e pelas boas lembranças que me deixou.
AGRADECIMENTOS
Ao professor e orientador Mauro Giffoni de Carvalho, por sua atenção e dedicação durante o estágio. Muito Obrigada!
À professora Eliane Maria Freitas Monken, pelo carinho, amizade, dedicação e paciência, ao me transmitir seus conhecimentos sobre métodos de pesquisa. Muito Obrigada!
Estátuas e cofres e paredes pintadas
Ninguém sabe o que aconteceu
Ela se jogou da janela do quinto andar
Nada fácil de entender (…)
(…) Quero colo
Vou fugir de casa
Posso dormir aqui com vocês?
Estou com medo, tive um pesadelo.
Só vou voltar depois das três (…)
(…) Já morei em tanta casa que nem me lembro mais
Eu moro com meus pais (…) (Renato Russo)
1 – TÍTULO: Infância solitária: Angústia, frustração e desejo.
2 – TEMA: Diagnóstico infantil: A depressão e a ausência cotidiana dos pais, na contemporaneidade.
3 – OBJETO: Como diagnosticar problemas de depressão infantil, relacionados com a ausência dos pais no cotidiano da criança.
4 – OBJETIVOS:
- Identificar o efeito da ausência dos pais, na contemporaneidade, no desenvolvimento da criança;
- Verificar o grau de depressão na criança, que está impedida de conviver com os pais no seu cotidiano;
- Analisar, a partir da visão psicanalítica, qual o efeito desta separação.
5 – JUSTIFICATIVA
5.1 – Aspectos Empíricos
Neste fim de século, e início de uma nova era, foram impostos à nossa sociedade paradigmas de comportamento: a economia internacional manifesta na tão falada globalização.
Hoje, as preocupações veiculadas pela mídia não são estar empregado ou não, e sim ter um bom cargo, um bom salário, uma boa situação financeira, que permita a febre do consumo.
A sociedade está criando pessoas cada vez mais ocupadas com atividades diversas, preocupadas com um padrão familiar consumista, na qual a renda paterna torna-se muitas vezes insuficiente para suprir o enorme consumo. Todavia, a mulher também evoluiu culturalmente; já não é normal para uma miríade de mulheres ser uma simples ecônoma. A mulher sai para o mercado de trabalho, juntamente com o homem. Na sociedade moderna, torna-se impossível estar com os filhos no cotidiano, pois cada dia mais é necessário atualizar-se, reciclar-se para enfrentar um mercado competitivo. Então, o tempo torna-se pequeno demais…
E as crianças? Como elas estão nesse contexto?
De um lado, para suprir a falta dos pais, as crianças nascidas nas camadas mais favorecidas têm um dia atarefado: ginástica, natação, escola, inglês, ballet, futebol, etc. Elas estão a cada dia mais tristes, melancólicas, envolvidas em seu mundo: televisão e computador. De outro lado, as crianças cujos pais pertencem a camadas populares não têm acesso a boas escolas, convivem geralmente com a violência na sua comunidade e muitas têm que cuidar de casa e dos irmãos menores para os pais trabalharem, e muito precocemente estão de frente com a responsabilidade de um adulto. E ficaram para trás as brincadeiras de amarelinha, esconde-esconde, rodinha. Modificou-se o referencial familiar, os valores. As crianças não sabem contar histórias, mas sabem falar de Pokémon; sabem violência e aí encaram de frente a depressão. A sociedade moderna trouxe o progresso, o avanço técnico-científico e, paralelamente, a angústia – o adulto está cada dia mais sozinho. E nossas crianças também.
A infância modificou-se, logo cedo há o confronto com a ausência materna, a pressa, horários e devagar vai chegando uma tristeza.
A modernidade tem pregado a ideia de que o futuro precisará de super-homens e mulheres maravilhas, esquecendo que serão capacitados profissionalmente, porém emocionalmente infantilizados.
Depressão não é apenas tristeza. É uma doença que deve ser tratada. Se os adultos muitas vezes não conseguem perceber o problema, o que se dirá de uma criança?
Muito embora as crianças estejam sujeitas à maioria dos transtornos emocionais encontrados nos adultos, na maioria das vezes seu diagnóstico é pobremente realizado, quando realizado. A maioria das pessoas ainda acredita que criança não fica “nervosa”, porque criança não tem problemas ou coisas assim. Outros, infelizmente mais ignorantes, acham que “criança nervosa” é falta de correção enérgica, porque quando eram crianças apanhavam se não se comportavam adequadamente. Enfim, a falta de informação sobre psiquiatria infantil é a responsável pela maioria das dificuldades de relacionamento, escolares e sociais das crianças, bem como, responsável por inúmeras sequelas emocionais no futuro. Na realidade, temos visto que a família só é mobilizada a procurar ajuda para suas crianças quando fica evidente ou está ameaçado o rendimento escolar e a aprendizagem. E, infelizmente, na maioria das vezes essa ajuda é buscada incorretamente, desde que a família alivie-se do estigma cultural de ter que procurar ajuda de um psiquiatra; qualquer coisa parece servir: neurologista, psicólogo, terapeutas e pedagogos, etc. Não que tais profissionais sejam indevidos ou inúteis em psiquiatria infantil, mas nem sempre o caso é mais adequadamente tratado por eles. Entretanto, o real motivo para a procura deles é o receio de ter um filho tratado por psiquiatras.
Nem os pediatras sabem disso e foi pensando na importância de esclarecer a situação que o psiquiatra BELIZÁRIO, que atua no Centro Geral de Pediatria (CGP), realizou uma pesquisa sobre o assunto. O resultado é impressionante: 11% das crianças hospitalizadas têm depressão e outras 20% apresentam sintomas da doença. “Trata-se de um grau de sofrimento psíquico alto, que exige intervenção”, alerta.
A pesquisa, que teve orientação dos professores Paulo Camargo, pediatra da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), e Francisco Assunção, psiquiatra da Universidade de São Paulo (USP), faz parte da tese defendida por Belizário e aprovada pelo departamento de Pós-graduação em Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG.
Esta mesma pesquisa foi realizada com 90 crianças da faixa etária entre 7 e 13 anos, durante as 36 primeiras horas de internação no Centro Geral de Pediatria (CGP). O estudo aponta a necessidade de despertar a comunidade médica para a existência de uma patologia dentro do hospital que precise ser notada. Belizário lembra, no entanto, que a situação é semelhante nos consultórios, onde os pediatras também devem estar atentos e acompanhar processos de depressão infantil.
As crianças foram submetidas ao Questionário de Depressão Infantil criado na década de 60 pela psiquiatra norte-americana Maria Kovacs, em entrevistas padronizadas abordando 27 itens, entre os quais “ideação suicida”, “relacionamento escolar”, “relacionamento familiar”, “rendimento escolar”, “renda familiar”, “escolaridade da mãe”, “internações hospitalares anteriores”, “faixa etária”, “tipo de doença” e outros.
BELIZÁRIO explica que quanto maior a pontuação, maior o estado de depressão da criança. Consideram-se portadores de sintomatologia depressiva todas as que alcançaram pontos iguais ou superiores a 18. A pesquisa revela que 20% das crianças hospitalizadas encontram-se nessa situação de sofrimento psíquico. Acima de 22 pontos, considera-se que a criança está com transtorno depressivo, ou seja, a própria depressão – detectada em 11% das crianças.
Segundo BARBOSA; LUCENA, citados por BALLONE, devido à diversidade dos locais onde os estudos são realizados e das populações observadas, vários índices de prevalência têm sido estabelecidos para a depressão na infância. Estudos norte-americanos revelam uma incidência de depressão em aproximadamente 0,9% entre os pré-escolares; 1,9% nos escolares e 4,7% nos adolescentes. A família é um dos grandes fatores estressantes da depressão infantil. Foi realizado um estudo com 100 crianças deprimidas e inferiu que 33 sofriam de privação emocional, 58 pertenciam a famílias rotas, sendo ilegítimos 22% destes filhos, 23% perderam o pai e 7% a mãe, antes dos 15 anos. Disso pode-se concluir que a família exerce um papel fundamental como coadjuvante etiológico da depressão. Podemos citar as disputas familiares, as enfermidades crônicas dos pais e a instabilidade da convivência familiar, tudo isso como características que descrevem o insatisfatório ambiente familiar e como causas geradoras da depressão. Vivemos um momento em que as famílias passam por difíceis problemas de reestruturação, caracterizados em sua grande maioria pela provação psicossocial ou, por outro lado, pela preocupação dos pais com a manutenção de seu “status”, sendo isto, portanto, um elemento facilitador do aparecimento da depressão em larga escala em nossa sociedade.
ROTH; COLS., citados por BALLONE, dizem que, muito embora os atuais manuais de classificação de doenças mentais tratem separadamente os quadros ansiosos dos afetivos, pesquisas e autores têm se preocupado em estabelecer relações entre esses dois estados psíquicos. Ao longo de cinco anos de observação, constatou-se que o diagnóstico de depressão passa para ansiedade em 2% dos casos e, no sentido contrário, da ansiedade para a depressão em 24% dos casos. Constatou-se também que antigos quadros ansiosos costumam evoluir no sentido da depressão. Sustenta ainda a ideia da evolução do estresse para ansiedade e em seguida para depressão. No campo da investigação, só recentemente é que se esboçaram estudos sobre os transtornos de ansiedade e da depressão na área infanto-juvenil.
Estudos reavaliam pesquisas dos últimos 15 anos, na qual sugere três tipos de abordagem da questão Ansiedade versus Depressão:
1- Ansiedade e Depressão diferem qualitativamente;
2- Ansiedade e Depressão diferem quantitativamente e;
3- Ansiedade se associa à Depressão.
MINEKA, citado por BALLONE, estuda a base cognitiva da ansiedade e depressão sob o enfoque da percepção humor-congruente dos estados ansiosos. De fato, a insegurança típica dos estados ansiosos pode ser mais bem entendida à luz de uma autopercepção pessimista e de uma representação temerosa da realidade, ambos de conotação depressiva. PAPAZIAN E COLS., também citados por BALLONE, afirmam que metade dos casos observados por eles na escola encontraram a presença da inibição e que, passivo ou defensivo, o pensamento intelectivo se rompe. O mesmo ocorre, de maneira geral, com a motricidade. Segundo PARRAGA, citado por BALLONE, do ponto de vista cognitivo, as crianças com transtornos distímicos e depressão maior são as que mais frequentemente têm dificuldades para estarem atentas em classe e entender as explicações dos professores. Em consequência, seu rendimento será insuficiente. Para se ter uma ideia da correlação entre depressão e rendimento escolar, dos 27 itens que compõem o inventário de depressão infantil (CDI), nove incidem, de forma direta ou indireta, sobre o comportamento escolar da criança, perfazendo-se, portanto, 33% do total do inventário.
Geralmente, os professores também se queixam de que as crianças deprimidas apresentam déficit em habilidades sociais, apesar de as crianças depressivas serem mais aceitas por seus companheiros em classe.
Na reportagem “Mãe, estou deprê”, o diagnóstico da enfermidade na garotada cresce e assusta os médicos. Na Santa Casa de Misericórdia do Rio, por exemplo, o número de casos aumentou 10% de 1995 até agora. Dos pacientes atendidos nesse período, 76% chegaram ao hospital sem que os pais soubessem do estado depressivo dos filhos. As Santas casas do Rio e de São Paulo e a Universidade Federal de Goiânia, por exemplo, analisarão em conjunto 100 crianças até o final de 2001. Trata-se do 1º Estudo Epidemiológico e Terapêutico do Brasileiro, baseado num modelo americano que detectou sinais depressivos em 8% a 12% das crianças nos Estados Unidos. Esse fato representou um grande avanço para tratar a depressão infantil. Antes, para ser considerada deprimida, a criança tinha de chorar muito e se isolar totalmente. Foi a partir da década de 80 que se percebeu que ela não é um adulto em miniatura e que tem características diferentes. Muitas vezes, os sintomas da depressão infantil são captados na escola. Anita Alves, ex-professora de Luana, de oito anos, foi quem percebeu problemas na aluna. A educadora recomendou aos pais da menina que procurassem um especialista. O psicólogo foi fundamental para que Luana desse a volta por cima. “Vemos como a criança brinca, se relaciona e estuda. Quando indicamos um psicólogo, muitos pais acham um absurdo”, afirma a educadora.
O tratamento é feito com antidepressivos e psicoterapia. Nas sessões, os especialistas conversam com os pequenos. Também os avaliam por meio de desenhos. A maioria deles não tem vontade de criar figuras. Às vezes, quando eles se expressam no papel, o resultado é chocante. Surgem referências à tristeza, solidão e morte.
Em outra reportagem “Tristeza de criança”, adultos acham que criança não fica deprimida, mas isso é cada vez mais frequente. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, 1,9% das crianças e 4,7% dos adolescentes do mundo sofrem de depressão. Só nos Estados Unidos, estima-se que 5% da população até 18 anos padecem do problema.
Esse quadro sombrio não escolhe idade e torna-se visível em atividades corriqueiras, como desenhar. Tristeza, melancolia, solidão e dor transparecem no desenho em cores escuras e temas melancólicos. As figuras 1 e 2 são desenhos feitos por duas crianças com depressão.
Figura 1 (Nuvem solitária) – Menina, M.S.O., dez anos. Mesmo com amigos se sentia sozinha. Sentia negativa e achava ruim. Disse que, na verdade, achava que as amigas não gostavam dela.
Fonte: “TRISTEZA DE CRIANÇA” – ISTO É de 09.07.1997
Figura 2 (A flor que chora) – Menina, M.L.L., 13 anos. Chegou com queixa de insônia e fortes dores no peito. Não tinha apresentado melhora com analgésicos comuns. Recuperou-se da depressão com psicoterapia associada a remédios.
Fonte: “TRISTEZA DE CRIANÇA” – ISTO É de 09.07.1997
ASSUMPÇÃO contabiliza que dos 1.700 pacientes mirins tratados nos últimos dois anos com algum tipo de mal psicológico, 150 sofrem de depressão. Muitas vezes, a irritação ou insônia podem ser confundidas com distúrbio físico. Na Tese da psiquiatra Eliana, 20% das 257 crianças pesquisadas em duas escolas públicas da Grande São Paulo apresentam fortes traços de depressão. “Mas um único sinal não faz o diagnóstico”, ressalva a especialista. No Rio de Janeiro, no Hospital Pedro Ernesto, que tem um dos principais serviços de psiquiatria infantil do Estado, cerca de 5% das crianças com problemas psicológicos têm depressão. Até pouco tempo, acreditava-se que as crianças não apresentavam quadro depressivo, pois não tinham atingido um completo desenvolvimento psíquico. “É mais fácil aceitar uma anemia do que qualquer problema psíquico”, explica a psiquiatra CURATOLO (2001).
Para se ter uma ideia da gravidade desses transtornos, os dados abaixo foram referendados pela Sociedade Brasileira de Pediatria, informando que estudos disponíveis nos EUA sugerem que de 15 a 20% da população de adultos sofrem níveis significativos de sintomas relacionados à depressão. Pelo menos 12% experimentam depressão grave o suficiente para pedirem tratamento em algum período de suas vidas.
Para BALLONE (2001), crianças também podem sofrer de depressão, que pode ser caracterizada por apresentar dificuldades para dormir, pouco apetite, falta de interesse por brincadeiras e dificuldades com a aprendizagem, além de se sentirem culpadas por achar que estão em falta com alguma coisa. A depressão acontece em qualquer faixa etária, desde bebês até adultos: as causas podem ser ambientais, existenciais e biológicas. Nas crianças, pode estar relacionada com a vida, a história familiar e o ambiente. Para a criança, o isolamento e a falta de contato com os pais levam a quadros depressivos. A depressão infantil atinge 20% das crianças brasileiras, ataca inclusive bebês recém-nascidos e deixa marcas profundas, que vão interferir não só na infância, mas também na adolescência e na vida adulta. Das crianças hospitalizadas, 115 têm depressão e outras 20% apresentam sintomas da doença.
Ainda o autor acima citado diz que dificuldades escolares podem ocorrer em 4 situações:
1. Quando há severo prejuízo do interesse da criança;
2. Quando a performance global da criança está prejudicada;
3. Quando há prejuízo da atenção;
4. Quando há prejuízo na cognição. Esta se subdivide em:
4.a – Prejuízo na apreensão de informações;
4.b – Prejuízo no processamento das informações.
A depressão e ansiedade infantis se relacionam aos 2 primeiros itens, ou seja, se relacionam ao prejuízo do interesse e da performance global.
Muitos relatórios clínicos (desde os primeiros estudos de histeria, conduzidos por Freud, até os numerosos estudos feitos nos anos recentes, cujo volume aumenta dia a dia) atestam que as experiências de separação e de perda, ocorridas no passado imediato ou em anos anteriores, desempenham relevante papel no surgimento de muitas condições clínicas.
O psicodiagnóstico é um processo científico e, como tal, parte de pergunta específica, cujas respostas prováveis se estruturam na forma de hipóteses que serão confirmadas ou não através dos passos do processo.
O DFH (desenho da figura humana) é um dos testes que pode ser utilizado para avaliação de aspectos específicos, tais como ansiedade e outros aspectos emocionais em crianças. Como também o HTP (desenho da casa, árvore e pessoa) para identificar traços característicos como depressivos e como hipomaníacos.
Segundo TÁRCIO (2001), até quase o início dos anos oitenta, a depressão na infância era avaliada através de técnicas psicométricas tradicionais, sobretudo as técnicas projetivas onde se utilizava desenhos e testes projetivos, como o Rorschach; esses métodos permitem uma avaliação clínica limitada, principalmente no âmbito dos estudos clínicos epidemiológicos, pois não permitem uma avaliação objetiva. Os primeiros instrumentos de avaliação objetiva para a depressão na infância surgiram em 1977. Desde então, tem sido desenvolvidos numerosos instrumentos de avaliação para a depressão na infância, com muitos deles já tendo sofrido várias revisões, de uma maneira geral, tratam-se de questionários ou entrevistas (estruturadas ou semi-estruturadas), nas quais se avalia a sintomatologia depressiva, entretanto, algumas entrevistas estruturadas cobrem não só a depressão, como também outros diagnósticos. Com o advento desses instrumentos, está sendo possível uma melhor padronização dos estudos clínicos e epidemiológicos da depressão na infância.
5.2-Aspectos Teóricos
O presente projeto está baseado no eixo psicanalítico, e a aluna pesquisadora trabalhará de acordo com os conceitos que dizem respeito ao psicodiagnóstico e à depressão infantil, relacionada com a ausência dos pais no cotidiano e qual o reflexo na aprendizagem.
Apesar da tamanha importância da depressão da infância e adolescência em relação ao suicídio, às dificuldades na escola e no ajuste pessoal, dificuldades estas que podem continuar na vida adulta, esse quadro não tem sido devidamente diagnosticado. Embora na maioria das crianças a sintomatologia da depressão seja atípica, algumas podem apresentar sintomas clássicos de depressão, assim como a tristeza, ansiedade, expectativa, mudanças no hábito alimentar e no sono ou, por outro lado, problemas físicos, como dores inespecíficas, fraqueza, tonturas, mal-estar geral que não respondem ao tratamento médico habitual. A maioria das crianças maiores e dos adolescentes, entretanto, apresenta a depressão de forma atípica, escondendo seus sentimentos depressivos sob uma máscara de irritabilidade, de agressividade, hiperatividade e rebeldia. As crianças mais novas, devido à falta das habilidades para uma comunicação que expresse seu verdadeiro estado emocional, também manifestam a depressão de forma atípica, notadamente com hiperatividade.
De acordo com OLMOS (2001), os principais sinais sugestivos de depressão infantil esquematicamente, são:
- Tristeza excessiva em motivo aparente ou motivo incompatível (como nota 7 em uma prova).
- Ideia de que as coisas nunca vão dar certo para ela ou de que faz sempre tudo errado.
- Desinteresse pelas coisas que costumava gostar.
- Sentimento de culpa excessiva.
- Autocrítica exagerada.
- Sensação frequente de aborrecimento e irritação.
- Preferência por estar sempre sozinha.
- Não consegue decidir e sofre com perda do que escolheu.
- Cansaço excessivo ou com atividades que estava acostumada a fazer.
- Perda da iniciativa (assiste TV, o tempo todo, sem pique para mais nada, por exemplo).
- Distúrbios do sono.
- Sentimento de solidão mesmo quando em grupo.
- Não consegue se divertir com nada e brinca pouco.
- Queda no rendimento escolar.
- Achar que não é amada.
- Submissão aos outros. Facilmente manipulada pelos colegas na escola.
- Agitação exagerada ou eventual, atuação por situação de riscos como brincar em muros altos.
- Ansiedade.
- Enurese ou encoprese.
Deve ficar claro não ser obrigatório a criança depressiva completar todos os itens da listagem supra-referida para se fazer o diagnóstico. Ela deve satisfazer um número de itens suficientemente importantes para despertar a necessidade de atenção especializada.
Tendo em vista a característica atípica das depressões na infância, alguns autores começam a pensar no diagnóstico diante de outras patologias bem definidas, como é o caso do Déficit de Atenção por Hiperatividade, Distúrbios de Conduta (notadamente a rebeldia, oposição e agressividade) e Transtorno Fóbico-Ansioso. Supõe-se haver uma íntima relação da depressão infantil em todos esses quadros citados e, principalmente na ansiedade da infância.
Segundo BALLONE (2001), dependendo da intensidade da depressão pode haver substancial desinteresse pelas atividades rotineiras, queda no rendimento escolar, diminuição da atenção e hipersensibilidade emocional. Surgem ainda preocupações típicas de adultos, tais como, a respeito da saúde e estabilidade dos pais, medo da separação e da morte e grande ansiedade.
Os quadros que se apresentam como fobia escolar, evitar a ida à escola, surgimento de dores inespecíficas, febre, etc. para fugir das aulas, podem refletir altos índices de ansiedade e sintomas depressivos.
Em criança no final da 2ª infância (dos 6 aos 12 anos), pode-se encontrar quadros de depressão muito grave e com sintomatologia francamente psicótica, como delírios humor-congruente bem organizados, alucinações e severo prejuízo das atividades sócio-familiares. Dentro da depressão infantil atípica podemos ainda encontrar crianças erroneamente tomadas por delinquentes e, não raro, crianças que chegam de fato ao suicídio.
Dos 2-3 anos até a idade pré ou escolar, a depressão infantil pode se manifestar ainda com quadro de ansiedade de separação, onde existe um grande apego da criança à figura de maior contato (normalmente a mãe) ou até sinais sugestivos de regressão psico-emocional, como trejeitos mais atrasados da linguagem, encoprese e enurese. Partindo-se do grande interesse que atualmente vem surgindo em relação aos transtornos que mais acometem os infantes e adolescentes, a depressão e a ansiedade têm sido muito frequentes em nosso meio, como sendo os dois transtornos mais agravantes no desenvolvimento infanto-juvenil, os quais desencadeiam diversas reações e alterações psicopatológicas, tendo como consequência danos, que, na maioria das vezes, são irreparáveis ou de difícil remissão, devido também à falta de diagnósticos destes transtornos. A depressão e a ansiedade têm sido de interesse não somente da classe médica, como também de outras áreas do conhecimento, dizendo respeito de perto aos pedagogos, psicólogos, educadores e aos próprios pais. Estes profissionais têm procurado buscar alternativas no sentido de sanar as alterações resultantes destes transtornos, como também prevenir suas consequências, que são as mais variadas possíveis e onde podemos destacar a agressividade, a frustração, a violência, o suicídio, a apatia, os problemas escolares etc.
A partir dos anos setenta, o tema depressão na infância tem despertado o crescente interesse dos profissionais que trabalham com psiquiatria da infância e saúde mental. Atualmente, a existência do transtorno depressivo na infância constitui um fato indiscutível e amplamente aceito pela maioria dos autores, como um fenômeno progressivo. Entretanto, o diagnóstico da depressão na infância apresenta algumas dificuldades, o próprio desenvolvimento emocional, cognitivo e social faz variar a expressividade clínica do transtorno nas diferentes etapas evolutivas; uma outra dificuldade sobreposta à anterior, é que uma parte importante da sintomatologia constitui-se num fenômeno intrapsíquico, e, portanto, muito mais complexo de se explorar em crianças. As manifestações de conduta constituem um aspecto a mais, embora nem sempre seja o mais importante nem o mais específico do transtorno.
No desenvolvimento infantil, a criança internaliza os pais e seus objetos internos têm para ela tanto um aspecto bom como um mau. Os objetos bons são aqueles que ela experimenta de bem-estar. E estes objetos bons fundem-se com o eu; e dessa forma os estados de ansiedade ou depressivos se relacionam com objetos internos maus ou destruídos. “O fato de que sentimentos de frustração ou gratificação predominem no bebê em relação ao seio, está sem dúvida, amplamente influenciado por circunstâncias externas (…)” (KLEIN citada por BARANGER, 1981, p.46).
Na relação da criança com os pais durante seu desenvolvimento, principalmente no estágio do complexo de Édipo, é totalmente influenciado por sentimentos a respeito dos pais internos, pelos temores de ser por eles perseguidos ou medo de perdê-los.
KLEIN (1969) sustenta que todos os processos de internalização participam na formação do superego e que este se inicia com o primeiro objeto internalizado – o seio materno. Na sua opinião, há uma contínua interação entre o desenvolvimento do ego, o complexo de Édipo e o superego.
Em 1911, pela primeira vez, a psicologia psicanalítica do pesar, da depressão, do luto e da tristeza normais, e a psicopatologia das depressões anormais se desenvolveram e foram elaborados conceitos novos. Estados depressivos independentes de idade ou sexo foram tratados em crianças de curta idade, como de dois anos e três meses, e adultos de até sessenta anos.
A criança fantasia não apenas fantasias bonitas, mas também fantasias cruéis, operadas pela pulsão destrutiva. E esta conduz ao desenvolvimento de mecanismos do ego – mecanismos de defesa.
No bebê, a fome traz vontade de sugar, através do seio ou seu substituto e, através da sensação de engolir, sugar, respirar, cheirar, ocorre a sensação de um “algo bom” que penetra no mundo interior. Esse algo bom é designado – objeto. Ao evacuar, a criança começa a perceber (ainda sem muita clareza) que tanto o mundo interno como o externo são ‘bons’. Por outro lado, a fome pode não ter uma experiência satisfatória. Pode ser sucedida de frustração, berros, movimentos coléricos. E a micção e evacuação durante a ira, conduzem à sensação que o mundo interno e externo são “maus”.
Mas cedo ou mais tarde, o bebê percebe que as lembranças do seio amoroso e satisfatório e as do seio frustrante e odiado são do mesmo seio ou substituto. Assim, a criança compreende que o amor ou ódio pode ambos ser expressos ou sentidos em relação ao mesmo objeto, e de que esse pode ser tanto satisfatório como frustrante. Isto é, que o mesmo eu pode tanto amar como odiar; o ego pode tanto amar como odiar o mesmo objeto; e, o mesmo objeto ou pessoa tanto podem ser gratificantes como frustrantes.
Se a ira é superior ao amor – as lembranças ou substitutos simbólicos de atos, pulsões ou imaginações agressivas são muito fortes – surgem a desesperança, ansiedade e depressão. Surge daí a situação em que se quer destruir o eu, para proteger a si próprio das pessoas e dos objetos. De outro lado, essas lembranças, em uma criança de idade mais avançada, podem dar a sensação de que a frustração é fruto do eu. Ela pensa que pratica maldade e dela só pode ser esperado coisas más. Isto pode acarretar a situação em que se deve destruir o eu, para proteger da própria maldade as pessoas e os objetos que compõem seu mundo interno e externo.
Esse processo de desenvolvimento emocional é produzido inconscientemente, assim como as várias defesas contra os sintomas.
Referindo-se à figura materna, na psicanálise, esta pode tomar a simbolização de figura materna e paterna: “Pais sm.pl.1. O pai e a mãe. 2. Os antepassados.” (FERREIRA, 1988, p.370.)
Os pais são o primeiro contato da criança. No início do século XX, a mãe tinha a função de mãe-de-família e assim o pai era o senhor-da-casa. Havia um rompimento do pai com a criança e a mulher internas.
“Quando um pai cuida de seu filho pequeno, só consegue fazê-lo com sucesso identificando-se a uma imagem materna. Assim, caso o pai queira fornecer ‘cuidados’ de qualidade ao lactente, será necessário que não tenha rompido completamente com a criança e a mulher dentro dele.” (WINNICOTT, citado por MANNONI, 1986, p.17).
Na complexidade dos termos “masculinos” e “feminino” para a psicanálise temos ainda, como conceito:
“Nem do ponto de vista biológico, nem do ponto de vista psicológico, as características de um dos sexos num indivíduo excluem as do outro. De fato, todo ser humano apresenta, do ponto de vista biológico, uma mistura de características genitais próprias de um sexo e de características próprias do sexo oposto, assim como uma mistura de elementos ativos e passivos, quer esses elementos de ordem psíquica dependam ou não das características biológicas.” (FREUD, citado por MANNONI, 1986, p.18).
A presença-ausência (dos pais) articula-se precocemente para a criança.
Segundo afirma BURLINGHAM; FREUD, citados por BOWLBY (1984), a inacessibilidade é uma situação que desperta medo em crianças. A relação entre a criança e os pais é muito forte e cheia de estados emocionais. Quando há uma separação por largos períodos, estados de angústia e depressão se manifestam de maneira sistemática.
A “figura materna” entende-se aquela a qual a criança orienta-se, de acordo com preferências, seu comportamento de apego.
“A mãe, por ser aquela que provê suas necessidades, é também aquela que se torna agente de sua frustração. E é também a escansão no apelo à mãe ausente que introduz a ordem simbólica (o grito de apelo participa da palavra), na medida em que destaca, para além do objeto real, uma outra dimensão e outras possibilidades de relacionamentos, marcados pela sequência de reencontros e de perdas. (…) na ausência, a mãe é percebida como agente simbólico, decorre que ela é objeto de amor (objeto que vale por sua presença). É por surgir como presença num fundo de ausência que a mãe aparece como totalidade, dona de todos os dons.” (LACAN, citado por MANNONI, 1986, p.24).
No final de sua vida, FREUD (1926) fala de separação, de perda, e do fato da angústia e o perigo de perder o objeto amado; fala na dor e no luto.
De acordo com BOWLBY (1984), junto com outros fatores, a separação da criança de seus pais conduz à tristeza, à raiva e à subsequente angústia, nas crianças com mais de dois anos de idade, não tão diferenciada das crianças com menos de dois anos. Os pais são uma variável-chave na determinação do estado emocional e do comportamento das crianças.
A perda simples ou a ausência do objeto pode produzir uma intolerância a este afastamento. Os estados comuns de bem-estar do objeto ou de felicidade, por comparação com o ideal, sejam estes vividos com insuficiência, o sujeito infantil continuará buscando o ideal. Ao não se satisfazer e não encontrar o bem-estar, de felicidade o objeto, cai na depressão. Isto acontece quando se representa o objeto real ou fantasiado como danificado, infeliz, morto ou ausente.
O termo depressão pode significar um sintoma que faz parte de inúmeros distúrbios emocionais sem ser exclusivo de nenhum deles, pode significar umas síndromes traduzidas por muitos e variáveis sintomas somáticos ou ainda, pode significar uma doença, caracterizada por marcantes alterações afetivas. Sendo a sintomatologia depressiva muito variada e muito diferente entre as diferentes pessoas, a psicopatologia recomenda como válido a existência de apenas três sintomas depressivos básicos e suficientes para sua detecção, no entanto, estes sintomas básicos darão origem a infinitas manifestações desta alteração afetiva. Está relacionada com a: inibição psíquica, o estreitamento do campo vivencial e o sofrimento moral. “Depressão” sf.1.Ato de deprimir-(se).(…)4.Abatimento moral ou físico. “Deprimir” v.t. 1.Causar depressão em; abaixar. 2.Debilitar, enfraquecer. 3.Angustiar.P.4. Sofrer depressão (…). (FERREIRA, 1988, p.156)
No enunciado freudiano, a depressão é a reação ante a perda do objeto libidinal. A estrutura depressiva tem três classificações: a) depressão narcisista; b) depressão culposa; c) perda simples ou separação do objeto.
Na depressão narcisista, a identificação com o negativo do ego ideal constitui uma situação de tensão dolorosa, frente a qual o sujeito tende a identificar-se com o ego ideal. A tensão narcisista, como a tensão de necessidade, têm o desejo e buscam um reencontro. A tensão de necessidade marcha ao reencontro com a experiência de satisfação. E a tensão narcisista marcha ao reencontro com a identificação com o ego ideal.
A depressão culposa pode começar porque o sujeito se vê como agressivo, ou porque vê o objeto danificado porque ele é mau e o agrediu.
A perda simples do objeto é quando a libido é separada de suas representações, que se descarrega sob a forma de angústia. Aquilo de que o sujeito sofre é uma ausência de simbolização da excitação somática.
“As depressões são entidades que, junto ao comum que permite englobá-las sob uma única categoria, oferecem diferenças que as convertem em subcategorias. (…) muitas depressões aparecem nos momentos de mudança durante o ciclo vital (…) têm lugar quando, alteradas as circunstâncias em que se era o ego ideal, as novas condições enfrentam a pessoa com a impossibilidade de manter tal identidade.” (BLEICHMAR, 1987, p.112).
Outro aspecto relacionado com a ausência do objeto é o luto. Segundo KLEIN, citado por BOWLBY (1985), os bebês e crianças pequenas sofrem luto e atravessam fases de depressão, e sua maneira de reagir são determinantes na fase adulta da vida.
Quando a separação é passageira, da parte da criança pequena, a reação muitas vezes é de cólera contra o ausente. No adulto, nos casos de depressão, o objeto perdido é sentido como localizado no ventre, e o que o sujeito introduz por intermédios da somatizações e o ódio. E se o ego fracassa, não encontra solução senão no suicídio ou na mania.
A separação ou perda simples de uma pessoa amada é uma das experiências aflitivas para o pequeno sujeito. Podendo este chegar à melancolia.
Durante o período em que há ausência da figura materna, a criança esforça-se pela esperança e expectativa que a mãe volte. Porém, o desespero surge. O anseio pela volta do ser amado não diminui, mas a esperança de sua satisfação esmorece. A criança torna-se apática e retraída. Ela passa a um estado de sofrimento.
“Se a criança é retirada dos cuidados maternos nessa idade, quando está apegada (…), é na verdade como se seu mundo desabasse. Sua intensa necessidade da mãe permanece insatisfeita e a frustração e saudade podem torná-la desesperada de dor. É necessário um exercício da imaginação para sentir a intensidade dessa aflição. A criança fica esmagada quanto qualquer adulto que tenha perdido, pela morte, uma pessoa amada. Para a criança (…), com sua falta de entendimento e total incapacidade para tolerar a frustração, é como se a mãe realmente tivesse morrido. Ela não conhece a morte, mas apenas a ausência, e, se a única pessoa que pode satisfazer sua necessidade imperativa está ausente, é como se estivesse morta, tão esmagador é o seu sentimento de perda.” (ROBERTSON, citado por BOWLBY, 1985, p.6).
O anseio de uma criança pela figura materna está impregnado de uma hostilidade e agressividade. Grande parte da raiva da criança separada de seus pais é dirigida para os próprios ausentes. Em geral, a criança torna-se cada vez mais egocêntrica e inclinada a estabelecer relações passageiras e superficiais com as pessoas à sua volta.
No pensamento kleiniano, a agressão se refere a uma expressão de uma pulsão de morte, e a ansiedade é o resultado de sua projeção. “A perda de uma pessoa amada é tão traumática, psicologicamente falando, quanto o são um ferimento ou uma queimadura graves, fisiologicamente falando.” (BOWLBY, 1985, p.42).
Na visão psicanalítica kleiniana, a angústia de separação equivale-se à angústia depressiva, onde a criança acredita que a ausência é a consequência de seus sentimentos de ambivalência em relação à mãe. Dado ao fato de em seu íntimo existir uma pulsão de morte. Como resultado de projetar a agressão, a criança ou o bebê enxerga na mãe um perseguidor, pensando assim que o afastamento é pelo motivo dela estar zangada ou desejar puni-lo. Tendo assim a classificação de angústia persecutória.
FREUD, citado por BOWLBY (1984), relata em Além do princípio do Prazer, que seu neto, com um ano e meio de idade, apanhava toda a espécie de pequenos objetos e os jogava nos cantos ou embaixo da cama, com expressão de quem dissesse “sumiu”. E isso aparentemente se confirmou mais tarde, quando o menino conseguiu um carretel preso à extremidade de uma corda e passou à dupla brincadeira de lançá-lo para longe, com uma expressão ‘sumiu’, e puxá-lo de volta, com um alegre ‘apareceu’. Essa brincadeira simples, aliada ao fato de o menino ‘ser muito apegado à mãe’, levou Freud a uma interpretação da brincadeira como a renúncia da satisfação pulsional, que se fizera ao permitir que sua mãe afastasse, sem ele protestar. E assim, compensava-se, encenando o desaparecimento e a volta de objetos que achava a seu alcance.
Concluindo o pensamento psicanalítico,
a perda do objeto pode provocar agudo sofrimento mental, fazendo surgir um ferimento no eu. Essa maneira de ver coincide com o que Abraham e outros descreveram como a ‘severa ferida ao narcisismo infantil’, acarretada pela perda do objeto.” (BOWLBY, 1985, p.408).
À medida que as pesquisas vêm demonstrando a importância dos fatores emocionais na depressão e a influência de muitas variáveis, é necessário refinar a avaliação diagnóstica.
Mas, o que é o psicodiagnóstico? “É uma avaliação psicológica, feita com propósitos clínicos. É um processo que visa a identificar forças e fraquezas no funcionamento psicológico, com um foco na existência ou não de psicopatologia.” (CUNHA, 2000, p.23).
No psicodiagnóstico é realizado todo um processo. Começa com uma consulta, a partir da qual se delineiam os passos para do exame. As questões básicas, segundo CUNHA (2000) são, esquematicamente:
1- O problema: É identificado quando são reconhecidas alterações ou mudanças nos padrões de comportamento comum, de natureza quantitativa ou qualitativa.
2- O contato com o paciente: O papel do psicólogo é nesta fase do processo, lidar com as inúmeras resistências ao processo, sentimentos ambivalentes e situações desconhecidas.
Existem alguns recursos básicos para se processar o psicodiagnóstico. Onde a princípio é feita uma entrevista clínica, visando uma investigação, recomendações, orientações. Ela está presente no início e no final do processo.
A história e o exame do estado mental do paciente também constituem um recurso do diagnóstico. Compreende-se aqui a história pessoal, anamnese, a história clínica ou da doença atual e avaliação psicodinâmica.
Os testes são usados para identificar a causa interna ou externa que está provocando o sintoma no sujeito. Com base no projeto em epígrafe, esses testes serão voltados para o sujeito infantil e o diagnóstico da depressão e a ausência dos pais.
Segundo CUNHA (2000), para crianças, pode ser usado o CAT (Children Apperception Test), ou Teste de Apercepção Temática Infantil.
Com base na literatura psicanalítica, as crianças identificam-se mais facilmente com personagens animais do que figuras humanas. Mas também existe o CAT-H, com figuras humanas. São testes projetivos, aperceptivos, temáticos, verbais, constituídos com uma série de 10 lâminas, que são aplicáveis a crianças, que deverão elaborar uma história a partir da cena em cada lâmina. A faixa etária das crianças é de 03 a 10 anos. Tem o objetivo de investigar o estágio de desenvolvimento infantil, especialmente para detectar desvios no desenvolvimento. Necessidade ou não de intervenção terapêutica e de orientação aos pais. E também acompanhamento da evolução do processo terapêutico.
O teste do Desenho da Família é uma técnica gráfica. No qual o desenho da família visa a avaliação dinâmica individual e familiar.
Outro teste seria o Desenho da Figura Humana (2), onde é solicitado o desenho de uma figura humana. Entretanto, nas diferentes versões e conforme objetivos diversos as instruções são variáveis. É indicada para avaliação da personalidade, avaliação de variáveis específicas da personalidade e identificação de indicadores emocionais e psicopatológicos.
O HTP, teste da casa-árvore-pessoa, é uma técnica psicométrica e projetiva, onde a hipótese tradicional é de que a figura humana representaria um auto-retrato, a casa e a árvore também aspectos de si mesmo. A casa relaciona com aspectos de nutrição, estabilidade e sentido de pertencimento, enquanto a árvore com sentido de crescimento, vitalidade e desenvolvimento. Ou, ainda, pessoa, casa e árvore poderiam representar o eu, a figura materna e a figura paterna. É uma técnica que pode incluir uma fase acromática (sem cores) e cromática (com cores). Avalia a personalidade e suas interações com o ambiente.
O Inventário de Depressão de BECK (BDI) é uma escala sintomática, de auto-relato. É usado em adolescentes, adultos e idosos.
O Teste de Fábula tem forma verbal, composto com dez fábulas incompletas, onde o sujeito termina a fábula subjetivamente, conforme a imaginação. É aplicada em crianças de 03 a 09 anos, deve-se utilizar a forma pictórica (pintura) com a verbal. Visa, neste caso, o objetivo de triagem de conflitos emocionais em crianças.
Além de todos estes testes, existe ainda a EFE (Entrevista Familiar Estruturada), onde é feita com todos os membros da família e são propostas tarefas. As dimensões a serem avaliadas são: comunicação, regras, papéis, liderança, conflitos, manifestação da agressividade, afeição física, interação conjugal, individualização, auto-estima. Seu objetivo é avaliar as relações familiares facilitadoras ou não de saúde emocional.
Durante todo o processo é feito o levantamento, análise e interpretação e integração dos dados.
No final é feita uma entrevista designada Entrevista de Devolução, a qual finaliza o processo, com o diagnóstico, prognóstico e causas externas e internas.
Dessa forma, o psicodiagnóstico pode auxiliar o encontro de sintomas, com também as possíveis causas. E também no diagnóstico da depressão e identificação da existência de fontes internas como a ausência dos pais no cotidiano da criança.
6-METODOLOGIA
Para a realização de uma pesquisa científica objetivando um trabalho bem estruturado, organizado, de forma bem sistematizada, visando atender a demanda do pesquisador, é necessário à aplicação de métodos e técnicas coerentes com o objeto em questão.
Sendo que a finalidade do projeto de estudo é a ampliação de conhecimentos teóricos, a metodologia escolhida para o desenvolvimento do projeto será a pesquisa bibliográfica, a qual possibilitará a fundamentação teórica, sustentada em abordagem específica, no caso a teoria psicanalítica, bem como futura articulação entre este objeto e a prática de campo, e torna-se por isso uma busca séria e dedicada por informações técnicas já publicadas.
GIL (1990) declara que para fazer a pesquisa coerente, é necessário: identificar, localizar e obter fontes, para que haja um bom desenvolvimento da pesquisa, deve-se seguir as seguintes etapas:
1. Pesquisa exploratória: é a primeira aproximação, identificação e obtenção das fontes para desenvolver o projeto.
1.1 Identificação de fontes – identificar fontes que sejam capazes de responder adequadamente ao problema proposto. Através de pesquisa na biblioteca, Internet, filmes e fazendo as devidas anotações.
1.2 Localização do material – é preciso localizar, depois da realização dos passos já citados, as fontes para que haja organização no trabalho. O material poderá ser obtido tanto por empréstimo quanto por consulta privativa, através de leitura exploratória do material identificado.
2) Leitura do material – Identificar as informações e dados do material, estabelecer relações entre as informações obtidas e o problema proposto, analisar a coerência das informações e dados dos autores. Os tipos de leitura podem ser classificados em:
- Leitura Exploratória: deve ser rápida, visando a exploração do assunto.
- Leitura Seletiva: seleciona-se o que interessa para a pesquisa. Deverá ser uma “triagem” do material. Não será definitiva, porém, já pode apresentar um cunho crítico.
- Leitura Analítica: Tem por finalidade ordenar as informações contidas, analisar e compreender, pois futuramente poderá auxiliar em respostas às questões levantadas.
- Leitura Interpretativa: última etapa do processo de leitura. É bem importante e mais complexa. Estabelece a relação entre as afirmações do autor e o problema para o qual se propõe uma solução, isto é, a articulação entre a teoria do autor e o argumento do pesquisador.
Tomada de apontamentos – é o registro de notas a partir do material lido. Registrando ideias, resumos dos capítulos e outras anotações relevantes à elaboração do trabalho.
Confecções de fichas – é uma maneira ordenada e precisa de conter informações lidas, após a tomada de apontamentos. Identificando as obras consultadas, registro do conteúdo e comentários acerca das obras e ordenando os registros. As fichas devem ser compostas por três partes: cabeçalho, referência bibliográfica e texto.
Redação de trabalho – é a última etapa da pesquisa bibliográfica, que será através da construção do artigo científico de forma crítica, impessoal e bem sistematizada, de acordo com as normas da ABNT.
Percorrendo todas estas etapas, e sua ordem, o aluno estará realizando uma pesquisa coerente, científica, analítica, organizada, estruturada e sistematizada.
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