fbpx Skip to main content

Atualizado em 02/08/2023

INFÂNCIA E CURRÍCULO: PARADOXOS, MUDANÇAS E RISCOS

Descubra quais são os paradoxos, mudanças e riscos da educação da infância e seu currículo! Entenda as grandes questões sobre as experiências e aprendizagens desde cedo. Clique aqui para saber mais.




Apresentação:

Reunimos neste livro versões ampliadas e revistas de textos que serviram de base a mesas do II Colóquio Luso-brasileiro sobre Questões Curriculares, nos quais pesquisadores/as de Portugal e do Brasil abordaram questões referentes a currículo com base em diferentes pontos de vista e referenciais teóricos. Expressam um movimento que tem caracterizado, contemporaneamente, a construção do campo do currículo em diferentes países – diversificação dos objetos de estudo e das fontes teóricas.

As origens do campo remontam aos Estados Unidos e podem ser situadas na virada do século XIX para o século XX. Iniciou-se, então, a primeira fase dos estudos sobre currículo, vista, por William Pinar (2005), como correspondendo ao início e à estabilização do paradigma do desenvolvimento curricular. Nesse momento, a preocupação central foi investigar e teorizar sobre o interior da escola, sobretudo no que se refere ao planejamento e à avaliação das atividades pedagógicas, de modo a influir no processo ensino-aprendizagem. Os olhares se dirigiram para os problemas micro curriculares, em detrimento dos problemas macro curriculares (Pinar, 2005). Exemplo emblemático dessa primeira etapa do campo é a obra de Ralph Tyler, escrita em 1949 e difundida internacionalmente, Princípios básicos de currículo e ensino, na qual o especialista propõe-se a ajudar o professor a bem escolher e redigir objetivos, selecionar e organizar experiências de aprendizagem e avaliar.

O caráter burocrático desse primeiro momento sofreu fortes críticas no final da década de 60 e foi aos poucos sendo abandonado. O campo passou a marcar-se por um discurso acadêmico mais diversificado, mais voltado para o esforço de compreender o currículo e não para desenvolvê-lo.

Ocorreu um processo de reconceptualização do campo, a produção teórico-prática foi se ampliando e aprofundando, o que levou os/as pesquisadores/as a buscar novas fontes teóricas, novos enfoques, novos métodos e novos temas. Quanto mais foram avançando os estudos e as pesquisas, mais novas questões eclodiram e foram investigadas e empregadas no enriquecimento da prática. A despeito das continuidades e dos elos com o primeiro momento, o campo foi-se tornando irreconhecível, tanto pela diversificação que passou a caracterizá-lo quanto pelos novos posicionamentos e pelo compromisso político que se evidenciou nos textos da chamada teorização crítica (Silva, 1999).

A abordagem histórica das teorizações mais tradicionais acabou sendo substituída por uma marcante consciência histórica, indispensável ao propósito de compreender o processo curricular. Desenvolveram-se, no bojo das aceleradas transformações por que foi passando o campo, estudos referentes à história do pensamento sobre currículo e à história das disciplinas, procurou-se entender melhor o currículo oculto e seus efeitos no cotidiano escolar, tentou-se desvendar a complexidade envolvida no currículo em uso, associaram-se à preocupação com as relações entre currículo e classe social as dinâmicas sociais de gênero e raça, sugeriram-se currículos multiculturalmente orientados, ampliou-se a própria concepção de currículo. Poder, ideologia, cultura, reprodução e resistência tornaram-se algumas das categorias mais empregadas nos estudos e textos produzidos nessa etapa.

Mais recentemente, tornou-se cada vez mais amplo o conceito de currículo, que passou a ser aplicado, em muitos momentos, a inúmeros espaços extra-escolares, como a mídia, os shopping centers, a internet etc. Intentou-se, então, analisar os efeitos desses “outros currículos” na vida dos estudantes e, portanto, no seu rendimento escolar. Para alguns estudiosos, nesse envolvente processo, o campo perdeu suas especificidades, o que fez com que ficassem indefinidas as prioridades a serem examinadas e enfrentadas, nas pesquisas, nas políticas e nas práticas. No caso particular do Brasil, secundarizaram-se, segundo os pontos de vista desses investigadores, os agudos problemas por que passam nossas escolas e nossos sistemas educacionais.
Na segunda metade da década de 90 o campo diversificou-se e expandiu-se de tal modo que autores como Pinar, Reynolds, Slattery e Taubman (1995) identificaram variadas tendências configurando a produção especializada. Reconheceram, nos estudos que examinaram, onze diferentes tipos de textos: históricos, políticos, de raça, de gênero, fenomenológicos, pós-modernos e pós-estruturalistas, biográficos e autobiográficos, estéticos, teológicos, internacionais e, ainda, textos centrados nas instituições escolares.

No século XXI, Pinar (2005) vislumbra o surgimento de novo paradigma no campo: a internacionalização, vista como um processo de criação de espaços transnacionais em que acadêmicos de diferentes localidades colaboram para o desenquadramento e o descentramento de suas próprias tradições epistemológicas e negociam a confiança recíproca para o desenvolvimento de um trabalho cada vez mais coletivo. Para o autor, esse novo paradigma encontra-se ainda em início de formulação.

Os organizadores do II Colóquio Luso-Brasileiro sobre Questões Curriculares acreditam que a colaboração entre pesquisadores do Brasil e de Portugal pode caminhar nessa direção e esperam que dela resultem novos e mais instigantes estudos e práticas. O II Colóquio, como os que o antecederam em Portugal, explicitou a colaboração que já se verifica entre investigadores dos dois países e caracterizou-se pela pluralidade de idéias, de enfoques, de fontes teóricas. Estamos certos de que os leitores deste volume poderão, ao refletir sobre toda essa multiplicidade de idéias e pontos de vista, encontrar subsídios para o esforço de construir uma escola de qualidade pautada por uma perspectiva emancipatória, já que os textos nele apresentados tendem a focalizar a escola, objeto permanente da preocupação dos pesquisadores de currículo.

No conjunto dos trabalhos que apresentamos, há os que abordam o início da escolaridade, ou seja, a educação infantil, assim como os que tratam da educação de jovens e adultos, que se propõe para os que tiveram, na idade adequada, seus direitos à escola negados e a ela retornam buscando recuperar o tempo perdido. Incluem-se também, nos textos em pauta, reflexões e resultados de pesquisas sobre a formação dos profissionais da escola, espaço no qual se constroem e reconstroem suas identidades profissionais. Outros estudos trazem à tona a discussão da influência da televisão e da mídia na vida dos estudantes, sugerindo e analisando experiências de incorporação dessas mídias como conteúdos pedagógicos ou culturais. Em outros textos, o foco é o que acontece no cotidiano da escola, no cotidiano da vida de cada um e de todos os/as alunos/as da escola.

De fato, os estudiosos de currículo aqui reunidos tendem a se referir à escola – aos seus sujeitos e seus processos, às suas relações e às diferentes lógicas que interagem no espaço escolar. Cabe destacar como esses pesquisadores estão sintonizados com as preocupações dominantes no cenário e no pensamento contemporâneos, incorporando-as como desafios a serem enfrentados nas escolas de diferentes níveis dos dois países. Desejamos que nosso leitor se estimule por esses desafios.

Autora: Sonia Kramer

Escreva um comentário

Não se preocupe, seu email ficará sem sigilo.