Introdução
Alfabetizar jovens e adultos é uma preocupação antiga que não se limita a uma tarefa meramente escolar; está intimamente ligada a sonhos, expectativas e anseios de mudança. A escolha do tema deste trabalho se deu com o convívio com jovens e adultos durante o estágio supervisionado na EJA.
Geralmente, é depois da adolescência que o indivíduo reconhece que necessita do conhecimento escolar e passa a buscá-lo. As causas de não ter se alfabetizado na infância podem ser várias, como o fato de ter que trabalhar para sobreviver, não ter acesso à escola no local onde mora e até mesmo a evasão escolar. Por isso, é comum ainda haver escolas que alfabetizam jovens e adultos.
É muito gratificante para uma pessoa leiga poder aprender a ler e escrever, consciente da necessidade e importância de tal ato para a sua vida. Um mundo novo se abre para ela; é como se fosse cega e, de repente, abrisse os olhos e enxergasse coisas que até então não via. Alfabetizar tais pessoas é proporcionar a elas grandes mudanças, uma nova visão de mundo e a chance de ter uma vida melhor, pelo menos com mais oportunidades.
Para os professores, já docentes ou em formação, é fundamental saber como acontece e vem acontecendo o processo de alfabetização nessas fases da vida. É nítido que, com os jovens e adultos, a alfabetização não acontece da mesma forma que na infância. Os adultos precisam ser incentivados para que tenham motivação e não deixem que os problemas rotineiros os afastem da escola. O professor precisa conhecer as metodologias atuais e as que foram aplicadas e tiveram êxito para melhor atender ao seu aluno, que, independente de ser criança ou adulto, também necessita de formação crítica e social.
A educação de jovens e adultos é um direito assegurado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), que é garantido gratuitamente aos que não tiveram acesso na idade própria. Segundo a LDBEN, o poder público deverá estimular o acesso e a permanência do jovem e do adulto na escola.
Existem diversos fatores que muitas vezes não possibilitam a alfabetização no período da infância. No decorrer dos anos, o indivíduo sente a necessidade de inserir-se nesse processo e procura a EJA (Educação de Jovens e Adultos), oferecida por escolas públicas e por projetos comunitários de alfabetização. Essa pesquisa enfatiza esse processo de alfabetização, analisando informações sobre o tema e a validade das metodologias aplicadas.
Essa pesquisa possibilitou a compreensão da necessidade e eficácia da educação de jovens e adultos para cidadãos que desejam adquirir conhecimento e o papel dos professores nesse processo. Poderá contribuir para o entendimento de como acontece e está acontecendo a Educação de Jovens e Adultos no Brasil e, especificamente, na cidade de Santa Maria – DF. Tem como objetivo analisar os processos de alfabetização, procurando identificar as metodologias utilizadas, investigar a eficácia das propostas de alfabetização e identificar os anseios dos jovens e adultos ao inserirem-se nesse processo.
No primeiro capítulo, é abordado o histórico da EJA no Brasil, a trajetória até os dias atuais e cita também a alfabetização como um todo. O segundo capítulo traz as reflexões teóricas sob a visão de alguns autores, como Paulo Freire, que dedicou sua vida à educação popular e é referencial para a EJA. Fala sobre a evasão, o perfil do aluno e do professor da EJA.
O terceiro capítulo trata-se de uma pesquisa de campo, apresentando os dados coletados por meio de questionários aplicados a professores alfabetizadores e alunos da EJA. A pesquisa de campo possibilita conhecer a opinião dos jovens e adultos, os seus anseios e a opinião dos docentes que atuam na EJA. A pesquisa foi qualitativa, o que permitiu uma compreensão detalhada das opiniões referentes ao tema. A pesquisa qualitativa tem um caráter descritivo e foco amplo; os dados obtidos são analisados e comentados no terceiro capítulo, no intuito de esclarecer e justificar a relevância do tema.
Com este trabalho, concluiu-se que os alunos da EJA esperam muito mais que aprender a ler e a escrever. Eles pretendem continuar estudando e serem atuantes na sociedade. Muitos que não pensam em seguir com os estudos pretendem aprender a ler e escrever por uma realização pessoal; este trabalho proporcionou um amplo conhecimento sobre a EJA.
Alfabetizar jovens e adultos não é um ato apenas de ensino-aprendizagem; é a construção de uma perspectiva de mudança. No início, época da colonização do Brasil, as poucas escolas existentes eram para o privilégio das classes média e alta. Nessas famílias, os filhos possuíam acompanhamento escolar na infância; não havia a necessidade de uma alfabetização para jovens e adultos, pois as classes pobres não tinham acesso à instrução escolar e, quando a recebiam, era de forma indireta. De acordo com Ghiraldelli Jr. (2008, p. 24), a educação brasileira teve seu início com o fim dos regimes das capitanias. Ele cita que:
“A educação escolar no período colonial, ou seja, a educação regular e mais ou menos institucional de tal época, teve três fases: a de predomínio dos jesuítas; a das reformas do Marquês de Pombal, principalmente a partir da expulsão dos jesuítas do Brasil e de Portugal em 1759; e a do período em que D. João VI, então rei de Portugal, trouxe a corte para o Brasil (1808-1821).”
O ensino dos jesuítas tinha como fim não apenas a transmissão de conhecimentos científicos e escolares, mas a propagação da fé cristã. A história da educação de jovens e adultos no Brasil, no período colonial, se deu de forma assistemática. Nesta época, não se constatou iniciativas governamentais significativas.
Os métodos jesuíticos permaneceram até o período pombalino, com a expulsão dos jesuítas. Neste período, Pombal organizava as escolas de acordo com os interesses do Estado. Com a chegada da família Real ao Brasil, a educação perdeu o seu foco, que já não era amplo.
Após a proclamação da Independência do Brasil, foi outorgada a primeira constituição brasileira e, no artigo 179 dela, constava que a “instrução primária era gratuita para todos os cidadãos”. Mesmo a instrução sendo gratuita, não favorecia as classes pobres, pois estes não tinham acesso à escola. Ou seja, a escola era para todos, porém inacessível a quase todos. No decorrer dos séculos, houve várias reformas. Soares (2002, p. 8) cita que:
“No Brasil, o discurso em favor da Educação popular é antigo: precedeu mesmo a proclamação da República. Já em 1882, Rui Barbosa, baseado em exaustivo diagnóstico da realidade brasileira da época, denunciava a vergonhosa precariedade do ensino para o povo no Brasil e apresentava propostas de multiplicação de escolas e de melhoria qualitativa de ensino.”
A constituição de 1934 não teve êxito, pois Getúlio Vargas, o então presidente da república, tornou-se um ditador através do golpe militar e criou um novo regime, o qual chamou de “Estado Novo”. Sendo assim, cria-se uma nova constituição escrita por Francisco Campos. Ghiraldelli Jr. (2008, p.78) cita que:
“A constituição de 1937 fez o Estado abrir mão da responsabilidade para com a educação pública, uma vez que ela afirmava o Estado como quem desempenharia um papel subsidiário, e não central, em relação ao ensino. O ordenamento democrático alcançado em 1934, quando a letra da lei determinou a educação como direito de todos e obrigação dos poderes públicos, foi substituído por um texto que desobrigou o Estado de manter e expandir o ensino público.”
A constituição de 1937 foi criada com o objetivo de favorecer o Estado, pois o mesmo tira a sua responsabilidade. Uma população sem educação (educação para poucos) torna a sociedade mais suscetível a aceitar tudo que lhe é imposto. Logo, se entende que esta constituição não tinha interesse que o conhecimento crítico se propagasse, mas buscava favorecer o ensino profissionalizante. Naquele momento, era melhor capacitar os jovens e adultos para o trabalho nas indústrias.
Um dos precursores em favor da alfabetização de jovens e adultos foi Paulo Freire, que sempre lutou pelo fim da educação elitista. Freire tinha como objetivo uma educação democrática e libertadora. Ele parte da realidade, da vivência dos educandos. Segundo Aranha (1996, p.209):
“Ao longo das mais diversas experiências de Paulo Freire pelo mundo, o resultado sempre foi gratificante e muitas vezes comovente. O homem iletrado chega humilde e culpado, mas aos poucos descobre com orgulho que também é um ‘fazedor de cultura’ e, mais ainda, que a condição de inferioridade não se deve a uma incompetência sua, mas resulta de lhe ter sido roubada a humanidade. O método Paulo Freire pretende superar a dicotomia entre teoria e prática: no processo, quando o homem descobre que sua prática supõe um saber, conclui que conhecer é interferir na realidade, de certa forma. Percebendo-se como sujeito da história, toma a palavra daqueles que até então detêm seu monopólio. Alfabetizar é, em última instância, ensinar o uso da palavra.”
Na época do regime militar, surge um movimento de alfabetização de jovens e adultos, na tentativa de erradicar o analfabetismo, chamado MOBRAL. Esse método tinha como foco o ato de ler e escrever. Essa metodologia assemelha-se à de Paulo Freire, com codificações, cartazes com famílias silábicas, quadros, fichas; porém, não utilizava o diálogo como a de Freire e não se preocupava com a formação crítica dos educandos.
A respeito do MOBRAL, Bello (1993) cita que:
“O projeto MOBRAL permite compreender bem esta fase ditatorial pela qual passou o país. A proposta de educação era toda baseada nos interesses políticos vigentes na época. Por ter de repassar o sentimento de bom comportamento para o povo e justificar os atos da ditadura, esta instituição estendeu seus braços a uma boa parte das populações carentes, através de seus diversos Programas.”
A história da Educação de jovens e adultos é muito recente. Durante muitos anos, as escolas noturnas eram a única forma de alfabetizá-los após um dia árduo de serviço. Muitas dessas escolas, na verdade, eram grupos informais, onde poucos que já dominavam o ato de ler e escrever transferiam esse conhecimento a outros. No começo do século XX, com o desenvolvimento industrial, é possível perceber uma lenta valorização da EJA.
O processo de industrialização gerou a necessidade de se ter mão de obra especializada. Nesta época, criaram-se escolas para capacitar os jovens e adultos. Por causa das indústrias nos centros urbanos, a população da zona rural migrou para o centro urbano na expectativa de melhor qualidade de vida. Ao chegarem nos centros urbanos, surgia a necessidade de alfabetizar os trabalhadores, e isso contribuiu para a criação dessas escolas para adultos e adolescentes.
A necessidade de aumentar a base eleitoral favoreceu o aumento das escolas de EJA, pois o voto era apenas para homens alfabetizados. Na década de 40, o governo lançou a primeira campanha de Educação de adultos, que propunha alfabetizar os analfabetos em três meses. Dentre educadores, políticos e sociedade em geral, houve muitas críticas e também elogios a esta campanha. O que é nítido é que, com esta campanha, a EJA passou a ter uma estrutura mínima de atendimento. Com o fim desta primeira campanha, Freire foi o responsável por organizar e desenvolver um programa nacional de alfabetização de adultos. Porém, com o golpe militar, o trabalho de Freire foi visto como uma ameaça ao regime; assim, a EJA voltou a ser controlada pelo governo, que criou o MOBRAL, conforme foi citado anteriormente.
O ensino supletivo foi implantado com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, LDB 5692/71. Nesta Lei, um capítulo foi dedicado especificamente para a EJA. Em 1974, o MEC propôs a implantação dos CES (Centros de Estudos Supletivos), que tinham influências tecnicistas devido à situação política do país naquele momento.
Em 1985, o MOBRAL findou-se, dando lugar à Fundação EDUCAR, que apoiava tecnicamente e financeiramente as iniciativas de alfabetização existentes. Nos anos 80, difundiram-se várias pesquisas sobre a língua escrita que, de certa forma, refletiam na EJA. Com a promulgação da constituição de 1988, o Estado amplia o seu dever com a Educação de jovens e adultos.
De acordo com o artigo 208 da Constituição de 1988:
“O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria;”
Na década de 90, emergiram iniciativas em favor da Educação de jovens e adultos. O governo incumbiu também os municípios a se engajarem nesta política. Ocorreram parcerias entre ONG’s, municípios, universidades, grupos informais, populares, fóruns estaduais e nacionais. A partir de 1997, a história da EJA começa a ser registrada no intitulado “Boletim da Ação Educativa”.
É notório que, nesta fase da história da Educação brasileira, a EJA possui um foco amplo. Para haver uma sociedade igualitária e uma Educação eficaz, é necessário que todas as áreas da Educação sejam focadas e valorizadas; não é possível desvincular uma da outra.
Reflexões sobre Alfabetização
A comunicação oral antecede a comunicação escrita. É oralmente que se expressam a maioria das pessoas desde os tempos mais remotos. A história nos mostra que até mesmo os povos humanos da pré-história utilizavam símbolos gráficos para fazer registros em cavernas, em grutas, em rochas; ou seja, já havia a necessidade de expressão gráfica. Bajard (2001, p. 15) diz que a escrita surgiu na Mesopotâmia por volta do ano 4000 a.C., entre os sumérios. Era uma escrita representada por desenhos e figuras rupestres, que indicavam ações cotidianas desses povos, como caçar e pescar. Essa fase ficou conhecida como pictográfica. Após ela, veio a fase ideográfica, onde os símbolos já representavam também ideias, tornando-se fonética, depois alfabética, e a partir daí a escrita foi evoluindo-se, com alfabetos surgindo de acordo com as particularidades de cada língua.
A fase alfabética determinou a necessidade de transmissão de códigos alfabéticos escritos, dando início ao que hoje chamamos de alfabetização. Ferreiro (2001, p. 12) cita que:
“A invenção da escrita foi um processo histórico de construção de um sistema de representação, não um processo de codificação. Uma vez construído, pode-se pensar que o sistema de representação é aprendido pelos novos usuários como um sistema de codificação. Entretanto, não é assim. No caso dos dois sistemas envolvidos no início da escolarização (o sistema de representação dos números e o sistema de representação da linguagem), as dificuldades que as crianças enfrentam são dificuldades conceituais semelhantes às da construção do sistema. Por isso, pode-se dizer que, em ambos os casos, a criança reinventa esses sistemas. Bem entendido: não se trata de que as crianças reinventem as letras nem os números, mas que, para poderem se servir desses elementos como elementos de um sistema, devem compreender seu processo de construção e suas regras de produção, o que coloca o problema epistemológico fundamental: qual é a natureza da relação entre o real e a sua representação?”
A alfabetização não é uma ação prioritária para a fase infantil da vida. Ferreiro (2001, p. 09) cita que “é recente a tomada de consciência sobre a importância da alfabetização inicial como a única solução real para o problema da alfabetização remediativa (de adolescentes e adultos)”.
Alfabetizar é um tema que está ligado ao ensino da leitura e da escrita de códigos alfabéticos. Existem inúmeros significados para este tema. Larousse (2003, p. 21) limita o significado de alfabetizar a ensinar a ler.
Vários conceitos definem alfabetizar como o ato de ensinar a ler. Aos poucos, esses conceitos vêm mudando. Ainda que livros e dicionários definam-no assim, hoje muitos educadores e alfabetizadores utilizam o termo “letramento”. Letrar vai além de alfabetizar; trata-se da compreensão da leitura e escrita. A criança está alfabetizada ao saber ler e escrever e letrada ao compreender o que leu e escreveu. Está letrada quando domina a leitura e a escrita e faz o uso social de ambas. Soares (2007) em uma entrevista a respeito de letramento cita, ao ser questionado sobre tal definição:
“Letramento é, de certa forma, o contrário de analfabetismo. Aliás, houve um momento em que as palavras letramento e alfabetismo se alteravam para nomear o mesmo conceito. Ainda hoje há quem prefira a palavra letramento; eu mesma acho alfabetismo uma palavra mais vernácula que letramento, que é uma tentativa de tradução da palavra inglesa literary, mas curvo-me ao poder das tendências lingüísticas, que estão dando preferência a letramento. Analfabetismo é definido como o estado de quem não sabe ler e escrever; seu contrário, alfabetismo ou letramento, é o estado de quem sabe ler e escrever. Ou seja: letramento é o estado em que vive o indivíduo que não só sabe ler e escrever, mas exerce as práticas sociais de leitura e escrita que circulam na sociedade em que vive.”
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) da Língua Portuguesa (BRASIL 2001, p. 21) falam explicitamente sobre este termo, mas a sua proposta vai de encontro às propostas do letramento. Isso é perceptível ao observar o que é citado nos PCN’s a respeito de pesquisas e investigações referentes à alfabetização nas séries iniciais.
Os resultados dessas investigações também permitiram compreender que a alfabetização não é um processo baseado em perceber e memorizar. Para aprender a ler e escrever, o aluno precisa construir um conhecimento de natureza conceitual: ele precisa compreender não só o que a escrita representa, mas também de que forma ela representa graficamente a linguagem.
A alfabetização é um processo contínuo, que inicia-se desde os primeiros anos de vida, com a linguagem. A partir daí, tudo que a pessoa aprende serve como base para uma aprendizagem eficaz. Ferreiro (2005, p.19) afirma que as crianças que crescem em famílias onde há pessoas alfabetizadas e onde ler e escrever são atividades cotidianas recebem esta informação através da participação em atos sociais onde a língua escrita cumpre funções precisas.
A respeito da aquisição de leitura e escrita, o PCN da língua portuguesa (Brasil, 2001, vol. 2, p.15) cita que: “O domínio da língua oral e escrita é fundamental para a participação social efetiva, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso a informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento.”
A alfabetização, como a educação em geral, é um direito de todos. Infelizmente, para muitos, ela não pode acontecer na infância. A preocupação de como fazê-la com qualidade e êxito impulsiona investigações de como alfabetizar para compreender a leitura e a escrita. Ferreiro (2005, p. 09) cita que:
“É difícil falar de alfabetização evitando as posturas dominantes neste campo. Por um lado, o discurso oficial e, por outro, o discurso meramente ideologizante, que chamarei ‘discurso da denúncia’. O discurso oficial centra-se nas estatísticas; o outro despreza essas cifras, tratando de desvelar ‘a face oculta’ da alfabetização, onde o discurso oficial fala de quantidade de escolas inauguradas, o discurso da denúncia enfatiza a má qualidade dessas construções ou desses locais improvisados que carecem do indispensável para a realização de ações propriamente educativas.”
A alfabetização de jovens e adultos não é uma ação recente; teve início desde a colonização, apesar de ter sido reconhecida oficialmente somente após o ano de 1945. Muitos motivos interferem no processo de alfabetização na infância de alguns jovens e adultos; outros nem sequer iniciam esse processo nesta fase e, ao longo dos anos, sentem a necessidade de alfabetizar-se. Segundo Moll (2004, p. 11):
“Nesse sentido, quando falamos ‘em adultos em processo de alfabetização’ no contexto social brasileiro, nos referimos a homens e mulheres marcados por experiências de infância nas quais não puderam permanecer na escola pela necessidade de trabalhar, por concepções que as afastavam da escola, como a de que ‘mulher não precisa aprender’ ou ‘saber os rudimentos da escrita já é suficiente’, ou ainda, pela seletividade construída internamente na rede escolar que produz ainda hoje itinerários descontínuos de aprendizagens formais. Referimo-nos a homens e mulheres que viveram e vivem situações limite nas quais os tempos de infância foram, via de regra, tempo de trabalho e de sustento das famílias.”
Ler e escrever é uma arte, principalmente para muitos que não aprenderam a ler e escrever na infância e, consequentemente, na vida adulta sentem falta desses atos. Nas últimas décadas, a oferta de ensino aumentou bastante; porém, o acesso ainda é limitado para muitos. Nem todos os brasileiros tiveram ou têm a oportunidade de alfabetizar-se na infância. Diversos fatores contribuem ou contribuíram para isso, como a necessidade de trabalhar nessa fase da vida, a falta de acesso à escola ou até mesmo a falta de interesse. Ao chegar na juventude ou na fase adulta, a pessoa percebe o quanto a educação básica lhe faz falta e começa a persistir em busca do conhecimento.
No decorrer da história da educação, a alfabetização de jovens e adultos teve diferentes focos e contou com significativos projetos de alfabetização, como o MOBRAL e o Método Paulo Freire, que já foi visto neste trabalho. O processo de aquisição da leitura e da escrita não é uma preocupação apenas de professores e alfabetizadores; a alfabetização é a base para uma educação eficaz. Portanto, para o aluno estar bem nas séries posteriores, ele precisa de uma alfabetização sólida.
Vivemos atualmente na sociedade do conhecimento, não só do conhecimento do senso comum, como sempre foi, mas do conhecimento científico que facilita aos indivíduos uma vivência social de acordo com as imposições do meio. Para tal, o conhecimento transferido no ambiente escolar é fundamental.
Atualmente, a EJA tem objetivos maiores além da alfabetização por parte dos alunos, da necessidade de estar capacitado para o mercado de trabalho, ser atuante na sociedade e também o interesse político de reduzir ao máximo a estatística de analfabetismo no país. Este fator favorecerá a pretensão de um dia o Brasil se tornar uma grande potência mundial.
As primeiras formas de alcançar melhores condições de trabalho e ampliar conhecimento são que fazem com que muitos jovens e adultos que não se alfabetizaram na infância ingressem em uma turma de EJA, oferecida pelas escolas ou por grupos comunitários que desenvolvem projetos de alfabetização. Ser alfabetizado nessas fases da vida depende de muita motivação e força de vontade; não basta apenas querer. A alfabetização de jovens e adultos ocorre de maneira intencional e consciente. Segundo Pinto (2007, p.92):
“Os conceitos de ‘necessitar saber’ vêm da origem do interior do ser, considerado em sua plena realidade, enquanto o de ‘saber’ e ‘não saber’ (como fatos empíricos) coloca-se na superfície do ser humano. É um acidente social. Além de ser impossível definir com rigor absoluto os limites entre o ‘saber e o não saber’ (daí que não há uma fronteira exata entre o alfabetizado e o analfabeto). Porque o ‘necessitar’ é uma coisa que ou é satisfeita (se é exigência interior) ou, se não é, não permite ao indivíduo subsistir como tal entre (por exemplo: as necessidades biológicas). O ‘necessitar’ ao qual se referem a leitura e a escrita é de caráter social (uma vez que tem por fundamento o trabalho).”
É válido ressaltar que o direito à educação de jovens e adultos é assegurado por lei e as instituições de ensino devem realizá-la de maneira que atenda tal clientela, sem ignorar suas limitações.
Alfabetizar jovens e adultos é muito mais que transferir-lhes noções de leitura e escrita. O jovem ou adulto, ao ingressar em uma escola, tem um objetivo delimitado e compreende a escola como um meio para alcançar tal objetivo. O professor alfabetizador se torna, então, um mediador entre o aluno e o conhecimento; por isso, ele precisa estar bem informado, motivado e querer realizar um trabalho de construção.
Há algumas décadas, era comum grupos de pessoas adultas se reunirem para aprender a escrever o nome e conhecer as letras do alfabeto. Tais pessoas ficavam extremamente maravilhadas, pois, dentro do contexto delas, tal aprendizado era suficientemente satisfatório. Atualmente, grupos ainda se reúnem, mas as expectativas são outras; só o aprendizado do próprio nome não é suficiente. O mercado de trabalho exige mais; até mesmo o simples fato de precisar identificar o itinerário do ônibus requer leitura. Segundo Libâneo (2003, p.53):
- Formar indivíduos capazes de pensar e de aprender permanentemente;
- Prover formação global para atender à necessidade de maior e melhor qualificação profissional;
- Desenvolver conhecimentos, capacidades e qualidades para o exercício consciente da cidadania;
- Formar cidadãos éticos e solidários.
A motivação é a chave para o sucesso da educação de jovens e adultos. Desmotivados, eles não conseguirão enfrentar as barreiras cotidianas; tudo se tornará mais difícil. Cabe aos professores e à escola, em geral, incentivá-los para que não desistam.
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Recursos educacionais para a alfabetização
Brinquedos educativos para o aprendizado
Material de escola para jovens e adultos
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