Analisando as razões do fracasso escolar no ensino fundamental
RESUMO
As razões para o fracasso escolar, principalmente no ensino fundamental, podem ser diversas, começando pelas condições físicas e psicológicas da criança, passando pelas condições da escola e dos profissionais que nela atuam, e culminando com as precárias condições em que vive a maioria das pessoas no país. As comunidades sem as menores condições, consideradas fundamentais para a sobrevivência, e, ultimamente abaladas pela violência, não podem pensar em oferecer um preparo adequado para suas crianças, visto que estão preocupadas, em primeiro lugar, com a própria sobrevivência. Sabe-se que mesmo uma criança oriunda de carências afetivas, herdadas por uma infância difícil, pode ter a capacidade de recuperação ou adaptação às más condições de vida, se observadas as necessidades e oportunizadas mudanças para que ela mesma alcance suas necessidades. O presente trabalho visou colher dados nas escolas da cidade de Alto Rio Doce para análise. Conclui-se que as razões do fracasso escolar são diversas e que a comunidade escolar não tem como solucioná-las sozinha; é necessário que haja uma articulação-interação comunidade-escola para alcançar uma educação de qualidade para todos.
Palavras-chave: educação – fracasso – reflexões
INTRODUÇÃO
As causas para o fracasso escolar são inúmeras e muitas delas já são bastante conhecidas através de publicações de autores consagrados que se dedicam ao assunto. Este estudo visa fazer um apanhado dessas causas, mas também ir um pouco além, procurando avaliar as causas específicas do fracasso escolar de uma certa localidade.
A questão é que as razões para o fracasso escolar não são poucas e não estão isoladas umas das outras. Pode ser pelo aspecto pedagógico, apropriado ou não à criança, pelas políticas educacionais que nem sempre têm a educação como meta principal, ou ainda pela situação geral pela qual passa a economia do país, e como resultado, o ambiente onde vivem milhares de crianças, inadequados para o seu desenvolvimento e crescimento.
A escola conta com uma equipe que poderá estar atenta a problemas sociais dos alunos. O supervisor pedagógico tem a função de auxiliar o professor, orientando-o em práticas pedagógicas que poderão superar o problema do fracasso escolar. Uma ação que pode ser significativa é manter contato com a família do ‘aluno-problema’ na busca de entender o porquê do ‘não aprender’. É fundamental no processo de aprendizagem conhecer o aluno e sua origem para escolher a melhor forma de trabalhar com ele. Neste sentido, o educador propiciará excelentes oportunidades para elevar o rendimento escolar dos educandos, elevando também o auto-conceito deste, tornando a aprendizagem mais agradável.
Existem várias razões para o fracasso escolar, assim como existem várias razões para se desenvolver um trabalho neste sentido. E um dos motivos é a preocupação dos educadores em geral em achar uma solução cabível para amenizar o problema do fracasso escolar. Para mais informações sobre práticas pedagógicas, veja Habilidades da BNCC: Matemática no Ensino Fundamental 1.
Sendo assim, foi desenvolvida essa pesquisa nas escolas da cidade de Alto Rio Doce no intuito de investigar o que faz a escola no sentido de amenizar o problema do fracasso escolar. O trabalho se justifica pela necessidade que se tem de entender quais são as dificuldades encontradas pelos educadores em geral, em buscar a inovação para auxiliá-los nas práticas pedagógicas, bem como pelo fato de ser um tema muito polêmico. Acredita-se ainda que esse estudo contribuirá com outros professores que se interessam pelo tema em questão.
Neste sentido, os estudos teóricos que se pretende realizar possibilitarão reunir um maior número de concepções teóricas e práticas para uma melhor compreensão do fenômeno, na busca de entender as causas e possíveis intervenções para a solução do problema.
I. BUSCANDO EXPLICAÇÕES PARA O FRACASSO ESCOLAR
Uma das explicações dadas para o fracasso escolar no Brasil é que a democratização do acesso à escola, ocorrida a partir dos anos 70 do século passado, levou a escola a lidar com crianças que teriam, em razão de suas condições de vida, sérias deficiências culturais e linguísticas que acarretariam dificuldades de aprendizagem. Teriam problemas de indisciplina e não valorizariam a escola. Sua linguagem oral seria muito distante da língua escrita. Em seu ambiente familiar, não vivenciaram usos da escrita nem um ambiente que as valorizasse e motivasse seu aprendizado.
De fato, os dados estatísticos (SAEB) mostram que o fracasso tende a se concentrar nas crianças oriundas de meios menos favorecidos. No entanto, diferentes estudos mostram também que, ao contrário do que em geral se afirma, essas crianças possuem um adequado desenvolvimento cultural e linguístico e que é a escola que apresenta sérias dificuldades para lidar com a diversidade cultural, linguística e étnica da população brasileira.
Esse trabalho tematiza justamente o fracasso escolar de crianças de meio menos favorecido. Seus principais objetivos são: discutir as diferentes explicações para esse fracasso e mostrar que, mesmo experimentando difíceis condições de existência, essas crianças apresentam um adequado desenvolvimento cultural e linguístico.
1.1. Reflexão sobre diferentes explicações para o fracasso escolar
Possivelmente, você já se deparou em sua escola, em sala de aula, com crianças que apresentam problemas de aprendizagem, particularmente na aquisição da leitura e da escrita. Com certeza essas crianças não são os únicos casos de “crianças problemas” existentes por aí: as crianças que estão diante de nós – não estão sozinhas… na minha escola, na sua escola, na escola vizinha, naquela escola da outra cidade e ainda na escola vizinha dessa escola – encontramos inúmeras crianças que não estão tendo sucesso, que fracassam em seu aprendizado. Por vezes, essas crianças passam anos frequentando a escola, até que um dia desistem, “entendem” que não têm “cabeça para o estudo”, é melhor fazer “um bico” e arranjar “um trocado” para ajudar em casa.
Assim como o problema de crianças que fracassam na escola não acontece apenas em sua escola, ele também não é um problema que surgiu somente agora, nos dias atuais. Pelo contrário, é um problema cuja história se inicia com a própria história da escolarização pública. Com a institucionalização do ensino obrigatório, surgem, tanto histórias de sucesso de alguns, como histórias de fracasso de muitos outros.
Segundo GRIFFO (1996):
Débil, deficiente mental educável, antiintelectual, criança com desvio de conduta, criança lenta, criança com repertório comportamental limitado, criança com distúrbios de aprendizagem, carente linguístico, carente cultural, criança com pobreza vocabular, com atraso de maturação, com distúrbio psicomotor, com problemas de socialização, hiperatividade, disléxica, portadora de necessidades especiais (p.23).
Esses são alguns nomes criados ao longo dos anos, segundo o autor acima, para identificar aqueles que fracassam na escola. É evidente que tais nomeações não surgem do acaso. Elas expressam diferentes perspectivas de entendimento das causas do fracasso escolar ao longo da história.
Ao longo do século passado, várias hipóteses causais foram apresentadas como explicação para o fracasso escolar, dando origem à consolidação de cinco diferentes abordagens para a interpretação desse fenômeno: organicista, instrumental cognitiva, afetiva, questionamento da escola e handicap sociocultural (Fijalkow, 1989).
Essas abordagens organizam-se em torno de questões, hipóteses explicativas e metodologias de pesquisa que orientam os profissionais de diversas áreas – médicos, professores, supervisores, psicólogos, etc. – em seu processo de estudo e intervenção junto a crianças com problemas de aprendizagem. Apresentamos, a seguir, uma breve caracterização de cada uma dessas abordagens.
A primeira teorização sobre as dificuldades de aprendizagem surgiu na França, no final do século XIX, e ficou conhecida como Abordagem Organicista (Fijalkow, 1989), por investigar as causas do fracasso escolar levantando hipóteses sobre os possíveis distúrbios e doenças neurológicas do aluno. As pesquisas realizadas nessa linha de investigação promoveram uma verdadeira classificação médica dos problemas de aprendizagem.
Nos dias de hoje, quando se encaminha um aluno para uma avaliação neurológica, buscando apoio na contribuição da medicina para a compreensão das dificuldades de aprendizagem, o resultado do diagnóstico aponta, geralmente, como causa do problema escolar o quadro de dislexia, disfunção cerebral mínima ou hiperatividade.
Várias críticas são apresentadas, atualmente, a essa abordagem do fracasso escolar e das dificuldades de aprendizagem. A abordagem organicista é sempre citada como a grande responsável pela medicalização generalizada do fracasso escolar, pois o tratamento proposto para sanar as dificuldades de aprendizagem da criança é o uso de remédios psiquiátricos. Uma das consequências mais indesejadas da utilização dessa abordagem é a identificação do aluno como alguém que possui uma falha orgânica, ou seja, um déficit neurológico. Ao se empregar termos como dislexia, hiperatividade e disfunção cerebral mínima, tende-se a ver o aluno como o único responsável pelo seu próprio fracasso.
Segundo VIDAL (1990; CYPEL, 1993)
A facilidade com que esse diagnóstico é utilizado nas escolas cria um quadro de encaminhamento para atendimento médico e prescrição de medicamentos, levando à biologização de um fenômeno da esfera escolar, produzindo gerações que acabam por se tornar conhecidas como “geração gardenal” (p.43).
Como consequência, limita-se, assim, o campo de investigações do fracasso escolar, uma vez que outros fatores intervenientes na produção desse fenômeno são desconsiderados.
A segunda abordagem do fenômeno do fracasso escolar surgiu do desenvolvimento de pesquisas no campo da psicologia cognitiva. Trata-se de uma abordagem instrumental cognitiva, assim designada por buscar as causas das dificuldades de aprendizagem em possíveis disfunções relativas a um dos quatro processos psicológicos fundamentais: a percepção, a memória, a linguagem e o pensamento.
Segundo SENA (1999),
… o diagnóstico realizado utiliza-se basicamente do processo de investigação diferencial (comparando um grupo considerado normal a outro considerado atrasado) e busca identificar os seguintes sintomas de lateralização, o desenvolvimento inadequado da linguagem, os transtornos perceptivos visuais e auditivos, os déficits de atenção seletiva, os problemas de memória (p.62).
Mas Fijalkow (1989), Nunes, Buarque e Bryant (1992) analisam um grande conjunto de pesquisas desenvolvidas a partir dessa perspectiva e apontam alguns problemas que precisam ser considerados ao interpretar os resultados das mesmas. Um desses problemas diz respeito, por exemplo, à não neutralidade e objetividade das situações de teste a que as crianças são submetidas, a dificuldade de se isolar variáveis para que essas possam ser testadas independentemente uma das outras. Além disso, deve-se considerar que a abordagem cognitivista, como a organicista, procura causas do fracasso das crianças apenas em suas características individuais, desconsiderando possibilidades explicativas em outras esferas.
A abordagem afetiva caracteriza-se por privilegiar como explicação causal do fracasso escolar os transtornos afetivos da personalidade. Partidários dessa abordagem defendem que a ideia de que as causas das dificuldades de aprendizagem devem ser buscadas em perturbações no estado socioafetivo da criança e não em supostos problemas neurológicos ou cognitivos. Nessa perspectiva, o atraso do aluno é uma manifestação de suas dificuldades originadas de algum conflito emocional (consciente ou inconsciente), cuja origem encontra-se na dinâmica familiar. Por meio da utilização do método clínico, propõe-se, primeiro, investigar se a dificuldade é de fato um problema de ordem pedagógica ou psicológica, para, posteriormente, buscar compreender porque uma determinada criança elege um determinado sintoma e não outro como expressão de suas dificuldades emocionais. Uma das críticas feitas a essa abordagem decorre do fato de que essa acaba por dar subsídios para que se responsabilize a criança e sua família por dificuldades que surgem na esfera escolar, transferindo para fora da escola – para as famílias, para as clínicas – a busca de soluções para os problemas da criança.
A abordagem denominada questionamento da escola reúne estudos que investigam diferentes fatores escolares como intervenientes na produção do fracasso dos alunos. Entre esses destacam-se, por exemplo, a inadequação dos métodos pedagógicos, as dificuldades na relação professor-aluno, a precária formação do professor e a falta de infraestrutura das escolas da rede pública de ensino.
Segundo Sena (1999: p. 35) “deslocando a questão do aluno que não aprende para a escola que não ensina”., seguidores dessa abordagem propõem modificações na estrutura e organização da escola, a fim de que essa instituição cumpra seu papel social.
A abordagem denominada handicap sociocultural identifica no meio sociofamiliar a origem do fracasso das crianças na escola. Adeptos dessa abordagem consideram a bagagem sociocultural dos alunos e de seus familiares um fator decisivo, tendo em vista que a maioria dos alunos que fracassam na escola é oriunda das camadas populares. Um argumento central na articulação dessa abordagem é que essas crianças apresentam uma linguagem deficitária, o que, em consequência, implicaria em déficit cognitivo. Segundo Soares (1987), teorias do déficit cultural, linguístico e cognitivo ocultam a verdadeira causa da discriminação das crianças das camadas populares na escola – a desigual distribuição de riqueza numa sociedade capitalista – e terminam por responsabilizar as crianças e suas famílias por suas dificuldades e isentar de responsabilidade a escola e a sociedade.
De acordo com SENA (1999),
… apenas do número significativo de pesquisas comprovando o caráter ideológico do discurso que fundamenta essa abordagem, ainda hoje podemos constatar como seus pressupostos estão presentes e influenciam fortemente a opinião dos profissionais da educação” (p.64).
1.2. Elementos para o questionamento de teorias do déficit.
A breve caracterização das diferentes abordagens do fracasso escolar apresentada permite constatar que os fracassados são situados em uma mera posição de objeto do conhecimento, marcados por um processo diagnóstico que, embora oscile entre oferecer como explicação causal do fracasso escolar ora uma disfunção neurológica, ora cognitiva, ora um transtorno afetivo, ora problemas linguísticos, não vacila em apontar esses sujeitos como deficitários.
Um mito se faz especialmente presente na escola em relação às crianças das camadas populares: o mito da existência de um déficit linguístico e cultural por parte dessas crianças e de seus familiares.
SOARES (1987) explica que o mito da deficiência linguística e cultural baseia-se na suposição de que:
… as crianças das camadas populares chegam à escola com uma linguagem deficiente, que as impede de obter sucesso nas atividades e aprendizagem: sua linguagem é pobre – não sabem o nome dos objetos comuns; usam frases incompletas, curtas, monossilábicas; sua sintaxe é confusa e inadequada à expressão do pensamento lógico; cometem ‘erros’ de concordância, de regência, de pronúncia; comunicam-se muito através de recursos não verbais do que de recursos verbais. Em síntese, são crianças deficitárias linguisticamente (p.20).
Essa suposta deficiência linguística seria atribuída à ‘pobreza’ do contexto linguístico familiar em que vive a criança. Adeptos dessa abordagem associam a essa visão de um contexto familiar deficiente linguística e culturalmente à ideia de que os familiares dessas crianças (seus pais ou responsáveis) não demonstrariam interesse por seu desenvolvimento escolar e não se empenhariam em dar suporte para que elas tenham condições de aprender na escola.
Diversas pesquisas, desenvolvidas a partir dos anos 70 do século passado, fornecem elementos para se refutar a hipótese do déficit como causal do fracasso escolar. O trabalho de Labov (Soares, 1987) por exemplo, forneceu elementos para que o questionamento das situações de teste a crianças negras, moradores de guetos em grandes cidades americanas, fossem submetidas. Segundo ele, a artificialidade e a diferença de classes do entrevistador e dos entrevistados comprometeriam o desempenho dessas crianças, levando-as a se mostrarem desarticuladas e monossilábicas nas situações de entrevista. A análise da produção linguística dessas crianças em interação com seus pares ou em entrevistas feitas por pessoas do seu próprio grupo social revelou que essas crianças possuíam uma gramática sistemática, coerente e lógica. Segundo Soares, Labov adotaria uma posição contrária às dos partidários da teoria do déficit linguístico. Para ele, crianças das camadas populares “narram, raciocinam e discutem com muito mais eficiência que os falantes pertencentes às classes mais favorecidas, que contemporizam, qualificam, perdem-se num excesso de detalhes irrelevantes” (Soares, 1987, p.47).
Segundo estudos sobre a relação entre linguagem, cultura e escolarização, alguns levam em conta a existência de diferenças linguísticas e culturais entre crianças das camadas populares, minorias étnicas e crianças das camadas economicamente favorecidas da população. O fato da escola não estar preparada para lidar com essas diferenças seria um dos principais fatores que contribuem para a produção do fracasso escolar.
Estudos de Fijalkow (1989) apresentam evidências contrárias à ideia de que existe desinteresse por parte dos familiares das crianças das camadas populares em relação à sua carreira escolar, pois para essas famílias o sucesso na escola representaria a possibilidade de um futuro melhor para seus filhos.
Estudos desenvolvidos por Griffo (1996) e Costa (1993) demonstram o empenho dos familiares em contribuir para a reversão da situação de fracasso em que seus filhos se encontravam. Castanheira (1991) apresenta análise de como crianças das camadas populares, moradores de um bairro da periferia de Belo Horizonte, eram preparadas para o ingresso na 1ª série por seus pais ou por seus irmãos mais velhos. As interações dessas crianças com a escrita criavam oportunidades de um contato cotidiano com esse objeto de conhecimento, fosse em brincadeiras de rua, aulinhas com os amigos ou atividades orientadas por seus pais ou irmãos mais velhos. Essas experiências com a escrita preparavam essas crianças para o seu ingresso na escola em melhores condições para a aquisição da leitura e da escrita. Em muitos casos, ao preparo e envolvimento da criança com a escrita antes do ingresso na escola de 1° grau não se seguiria uma continuidade do ensino de forma adequada dentro da instituição.
Essas formas de suporte variam de família para família e incluem desde a preocupação em garantir que se tenham livros de referência para consulta na hora dos estudos em casa, como atitudes persuasivas, como conversas ou castigos. Os dados nos levam à conclusão de que não existe uma relação causal direta entre o sucesso escolar e o empenho das famílias em acompanhar os filhos em suas atividades escolares. Observa-se que em alguns casos a intervenção familiar, embora positiva, tem efeito limitado sobre a aprendizagem do aluno, como, por exemplo, quando se garante a posse de livros de referência, mas esses não são efetivamente utilizados pelos adultos da família. Além disso, demonstrou-se que as diferentes atitudes tomadas pelas famílias não são valorizadas da mesma forma nas diversas escolas onde esses alunos são atendidos.
II. ANALISANDO O FRACASSO ESCOLAR
Este trabalho busca fundamentação teórica que mostra e justifica muitas razões para o fracasso escolar, mas fica ressalvado que muitas das constatações citadas foram feitas numa localidade, embora não sejam necessariamente demonstráveis através de números e dados estatísticos.
É nas tramas do fazer e do viver o pedagógico quotidianamente nas escolas que se pode perceber as reais razões do fracasso escolar das crianças advindas dos meios sócio-culturais mais pobres.
No desenrolar de nossa pesquisa de campo, o que temos ouvido e observado nas escolas visitadas reforça a afirmação de que se imputa o fracasso dessas crianças, oriundas das classes trabalhadoras, à desnutrição, às verminoses, enfim, a uma condição adversa de saúde. Ignora-se o fato de que estas estudam em escolas de periferia, onde se concentram todos os vícios e distorções do sistema social e, especificamente, do educacional, e tenta-se encontrar nessas crianças causas orgânicas, inerentes a elas, que justifiquem o seu mau rendimento.
Quais são as crianças desnutridas que estão hoje frequentando nossas escolas? São aquelas portadoras de desnutrição leve, a chamada pelos especialistas de desnutrição de primeiro grau. Não estamos aqui afirmando que este tipo de desnutrição não tem importância; ela a tem tanto que constantemente é apontada como forte indicador da situação de penúria e miséria em que vive grande segmento de nossa população.
Entretanto, o que estamos querendo enfatizar é que este grau de desnutrição [leve] não afeta o desenvolvimento do sistema nervoso central, não o lesa irreversivelmente e, portanto, não torna a criança deficiente mental, incapaz de aprender o que a escola tem a lhe ensinar. A criança portadora de desnutrição leve apenas sacrifica o seu crescimento físico para manter o seu metabolismo. Exames clínicos e laboratoriais indicam que a criança é normal, com exceção de um déficit de peso e estatura em relação à sua idade.
É necessário que desmistifiquemos as ‘famosas’ causas externas desse fracasso escolar, pela articulação àquelas existentes no próprio âmbito escolar, e que tenhamos clareza dos fatores que as determinam e as articulam.
2.1. Analisando as causas do fracasso escolar na localidade pesquisada
O drama do insucesso escolar é relativamente recente. É a partir dos anos sessenta que encontramos as suas primeiras manifestações. Foi então que se começou a exigir que as escolas, por razões econômicas e igualitárias, encontrassem formas de garantir o sucesso escolar de todos os seus alunos. O que era atribuído até então ao foro individual tornou-se subitamente um problema insuportável sob o ponto de vista social. A preguiça, a falta de capacidade ou interesse, deixou de ser aceitas como explicação para o abandono todos os anos de milhares e milhares de crianças e jovens do sistema educativo. A culpa do seu insucesso escolar passou a ser assumida como um fracasso de toda a comunidade escolar. O sistema não fora capaz de os motivar, reter, fazer com que tivessem êxito. O desafio tornou-se tremendo, já que todos os casos individuais se transformaram em problemas sociais. A escola secundária era a menos preparada para a mudança. Durante séculos assumira como sua vocação hierarquizar os alunos de acordo com o seu rendimento escolar, selecionando os mais aptos e excluindo os que não fossem capazes de acompanhar as exigências que ela mesma impunha. A sua nova missão era agora igualizar todos no sucesso educativo, garantindo 0% de negativas. Este era o novo padrão que permitia aferir o sucesso de cada escola.
É em grande parte por esta razão que hoje o principal problema educativo é o de identificar as manifestações e as causas do insucesso escolar. A listagem destas não pára de aumentar à medida que prosseguem os estudos.
2.1.1. Manifestações
As manifestações de insucesso escolar são múltiplas, mas três delas são particularmente referidas pela possibilidade que oferecem de se poder medir a própria eficácia do sistema educativo:
- Abandono da escola antes do fim do ensino obrigatório;
- As reprovações sucessivas que dão lugar a grandes desníveis entre a idade cronológica do aluno e o nível escolar; Os níveis de fracasso que podem ser totais (em todas as disciplinas ou quase) ou parciais (numa ou duas disciplinas).
- A passagem dos alunos para tipos de ensino menos exigentes, que conduzem a aprendizagens profissionais imediatas, mas os afasta do ingresso no ensino superior.
2.1.2. Causas
É na listagem das causas onde aparecem naturalmente as maiores controvérsias, o que se compreende já que a sua própria realização pressupõe que se identifiquem também os seus responsáveis. Neste ponto, ninguém se acha inteiramente culpado, o que em certo sentido é mesmo verdade. A grande dificuldade dessas análises, como veremos, reside na impossibilidade de se isolar as causas que são determinantes em todo o processo.
2.1.3. Alunos
– Atrasos do desenvolvimento cognitivo. As escalas psicométricas de inteligência têm sido apontadas como um bom indicador para identificar essas causas individuais de insucesso escolar. O problema é que a grande maioria dos alunos que falham nos resultados escolares tem um desenvolvimento normal. Há que não abusar dessa explicação…
– A instabilidade característica na adolescência consta entre as muitas causas individuais do insucesso. Ela conduz muitas vezes o aluno a rejeitar a escola, a desinvestir no estudo das matérias e, frequentemente, à indisciplina.
2.1.4. Famílias
– Pais autoritários, conflitos familiares, divórcios litigiosos, fazem parte de um extenso rol de causas que podem levar a que o aluno se sinta rejeitado e comece a desinteressar-se pelo seu percurso escolar, adaptando um comportamento indisciplinado.
– O ciúme e a vingança dos pais contribuem também para fazer estragos nos resultados escolares dos alunos. Muitas vezes, com medo que os filhos lhes deixem de manifestar afeto, trocando-os pela escola ou os professores, adotam atitudes que contribuem para os afastar dos estudos. Outras vezes, fazem-no para se vingarem de não lhes terem sido proporcionadas também na infância as mesmas oportunidades.
– A origem social dos alunos tem sido a causa mais usada para justificar os piores resultados, sobretudo quando são obtidos por alunos originários de famílias de baixos recursos econômicos, onde, aliás, se encontra a maior percentagem de insucessos escolares. Os sociólogos construíram a partir dessa relação causa-efeito uma verdadeira panóplia de determinantes sociais que permitem explicar quase tudo:
a) Nas famílias desfavorecidas, por exemplo, os pais tendem a ser mais autoritários, desenvolvendo nos filhos normas rígidas de obediência sem discussão. Ora, quando estes chegam à adolescência revelam-se pior preparados para enfrentarem as crises de identidade-identificação, na afirmação da sua independência. A sua instabilidade emocional torna-se mais profunda, traduzindo a ausência de modelos e valores estáveis, levando-os a não investir na escola;
b) Os alunos oriundos destas famílias raramente são motivados pelos pais para prosseguirem os seus estudos; pelo contrário, ao mais pequeno insucesso, estes colocam logo a questão da saída da escola, o que explica as mais elevadas taxas de abandono por parte destes alunos;
c) A linguagem que estes alunos são obrigados a utilizar nos níveis mais elevados de ensino, sendo cada vez mais afastada da que utilizavam no seu meio familiar, aumenta-lhes progressivamente as suas dificuldades de compreensão e integração, levando-os a desinteressarem-se pela escola. Para prosseguirem nos estudos, são obrigados a renunciarem à linguagem utilizada no seio familiar.
d) Os valores culturais destas famílias são, segundo alguns sociólogos, opostos aos que a escola propõe e supõe (mérito individual, espírito de competição, etc). Perante este confronto de valores, os alunos que são oriundos destas famílias estão por isso pior preparados para os partilharem. O resultado é não se identificarem com a escola. Nesta linha de ideias, Holligshead afirmou que os mais desfavorecidos norteiam-se por objetivos a curto prazo (o presente), o que estaria em contradição com os objetivos visados pela educação (a longo prazo). Esta diferença de objetivos (e valores) acaba por os conduzir a um menor investimento escolar.
– A demissão dos pais da educação dos filhos é hoje uma das causas mais referidas. Envolvidos por inúmeras solicitações quotidianas, muitas vezes nem tempo têm para si próprios, quanto mais para dedicarem à educação dos filhos. Quando se dirigem às mesmas, raramente é para colaborarem; quase colocam-se na atitude de meros compradores de serviços, exigindo eficiência e poucos incômodos na sua prestação.
2.1.5. Professores
– Métodos de ensino, recursos didáticos, técnicas de comunicação inadequadas às características da turma ou de cada aluno, fazem parte igualmente de um vasto leque de causas que podem conduzir a uma deficiente relação pedagógica e influenciar negativamente os resultados.
– A gestão da disciplina na sala de aula é outro fator que condiciona bastante o rendimento escolar dos alunos. Mas estamos longe de poder afirmar que uma aula completamente disciplinada seja aquela onde o insucesso escolar desapareça.
– Os professores, no início do ano, criam expectativas positivas ou negativas sobre os alunos que acabam por influenciar o seu desempenho escolar. Embora não sejam os professores a inventar os bons e os maus alunos, as investigações de Rosenthal e Jacobson demonstraram que os preconceitos destes são muitas vezes inconscientes, prejudicando muitas vezes os alunos sem que os professores se apercebam. Uma coisa parece certa: os alunos de baixa expectativa são mais prejudicados do que são favorecidos os altamente expectados. Ora, acontece que os alunos de estatuto sócio-cultural mais baixo são os mais negativamente considerados, tornando-se as principais vítimas das expectativas negativas ou baixas. Os alunos mais baixamente expectados são em geral mais mal tratados pelos professores.
– Existe na cabeça da maioria dos professores um padrão de avaliação que tende a coincidir com uma curva normal. Assim, na avaliação que produzem, partem em geral do pressuposto que apenas alguns são bons, a maioria são médios, e proporcionalmente ao número dos primeiros, existem uns quantos que são mesmo maus e têm que ser eliminados.
– A avaliação, conforme demonstram inúmeros estudos, nunca é absoluta; pelo contrário, varia em função de uma multiplicidade de fatores. As modas pedagógicas, o contexto escolar, os métodos de avaliação, as disciplinas, os professores, os critérios utilizados, o modo como estes são interpretados, etc. Em resumo: a avaliação dá também um forte contributo para o insucesso escolar.
– A dificuldade dos professores em lidarem com fenômenos de transferência conduz, por vezes, a situações com graves reflexos no aproveitamento dos alunos. O docente, ao ser identificado com o pai (mãe) que o aluno se deseja afastar, torna-se alvo contra o qual o aluno dirige toda a sua agressividade, gerando deste modo permanentes conflitos na sala de aula, conduzindo-o ao insucesso.
– À crescente feminização do ensino são igualmente atribuídas culpas pelo insucesso. As professoras, conforme apontam alguns estudos, parecem ter uma maior preferência pelas meninas, o que poderá explicar o melhor aproveitamento destas face ao conseguido pelos meninos, os mais penalizados.
2.1.6. Escolas
A organização escolar pode contribuir de diferentes formas para o insucesso dos alunos. Frequentemente esquece-se esta dimensão do problema; vejamos alguns casos típicos.
– O estilo de liderança do diretor, presidente do conselho executivo, etc. A questão não é displicente, nem mesmo nas nossas escolas burocratizadas e muito dependentes do Ministério. Todos conhecemos diretores ou presidentes que quase sempre conviveram com excelentes resultados nas escolas por onde passaram, e outros que parecem atrair problemas ou maus resultados coletivos.
– Expectativas baixas dos professores e dos alunos em relação à escola. Nas escolas onde isso acontece, os resultados tenderão a confirmar o que todos afinal estão à espera.
– Clima de irresponsabilidade e de falta de trabalho. Os exemplos abundam para que esta afirmação careça de grandes justificações.
– Objetivos não partilhados. Se só alguns conhecem os objetivos prosseguidos pela escola, ninguém se pode identificar com ela. Não tarda que alguns se sintam como corpos estranhos, contribuindo para a sua desagregação enquanto organização, provocando a desmotivação generalizada.
– Falta de Avaliação. Ninguém sabe o que anda a fazer, numa organização que sistematicamente não avalia os seus resultados em função dos objetivos que definiu, e muito menos se não procura identificar as causas dos seus problemas. O clima de irresponsabilidade não tarda a instalar-se e com ele os maus resultados.
– A deficiente orientação vocacional que muitos alunos revelam no ensino pós-obrigatório é agravada pela ausência nas escolas de serviços de informação e orientação adequados. Quem pode negar a pertinência dessa causa?
– O elevado número de alunos por escola e turma tende igualmente não apenas a provocar o aumento dos conflitos, mas sobretudo a diminuir o rendimento individual.
– A organização de turmas demasiado heterogêneas não apenas dificulta a gestão da aula pelo professor, mas também a coesão do grupo, traduzindo-se no incremento de conflitos internos. Tudo somado tem mais uma causa para o insucesso.
– O clima escolar, isto é, a qualidade do meio interno que se vive numa organização, é consensual que influencia bastante o comportamento dos seus membros, contribuindo para o seu sucesso ou fracasso. O problema é que o clima escolar resulta de uma enorme variedade de fatores, sobretudo dos que são de natureza imaterial, como as atitudes, esperanças, valores, preconceitos dos professores e alunos, o tipo de gestão, etc., e não tanto do ambiente físico (instalações, localização da escola, etc). O problema é identificar quais são as causas determinantes para um mau clima escolar. Uma coisa é certa: os alunos que trabalham num bom clima tendem a obter melhores resultados que os restantes.
– As culturas organizacionais, sucedâneas no plano teórico do conceito de clima escolar, têm obviamente as suas cotas parte no insucesso escolar. O problema é que desde os anos 60 que não param de se identificar novos tipos de culturas escolares.
No início, apenas se diferenciou a cultura das escolas urbanas (antigas) e das suburbanas (recentes). Concluiu-se então que nas primeiras a questão da disciplina sobrepunha-se à preocupação com os resultados. As relações professor-aluno eram marcadas pela dureza, formalismo, etc. Nas segundas, talvez porque as instalações são mais recentes e o corpo docente mais novo, respirava-se um certo ar de descontração, o que conduzia a que os resultados escolares fossem postos em primeiro lugar face aos problemas disciplinares.
A partir deste modelo, começaram a ser construídos outros, entendidos como mais adequados para explicarem a diversidade das realidades escolares. Hoje temos modelos para todas as perspectivas ideológicas:
a) Na Escola Cívica, onde tudo está subordinado aos diplomas oficiais, não há lugar para as diferenças individuais, muito menos para a inovação pedagógica; o que conta são os regulamentos, as ordens dimanadas do Estado. Nesta escola, os que podem ter êxito são os mais obedientes, dóceis, ou seja, os que continuamente se anulam a si mesmos, na sua individualidade e nas suas aspirações.
b) Na Escola Doméstica, o estatuto de cada um depende da sua posição numa hierarquia definida por uma rede de dependências pessoais. Os laços pessoais, a importância relativa do grupo de pertença, a antiguidade no território, estes são os únicos dados que contam para se ter êxito ou não.
c) Na Escola Industrial e de Mercado, levam-se a sério os grandes desafios da atual sociedade, privilegiando-se valores como “competência”, “especialização” e “capacidade de inovação”. Estamos perante uma escola tecnocrática, apostada em responder de forma adequada às crescentes exigências do mercado. Os menos aptos, ou os que possuem ritmos de aprendizagem mais lentos, são naturalmente sacrificados em nome das exigências impostas pela competitividade.
d) A Escola Narcísica está sobretudo interessada na imagem de si a partir do reflexo que produz nos outros. Trata-se de uma escola construída a partir da produção de uma imagem de marca (“fachada”), onde tudo é feito em função deste objetivo mobilizador. Os resultados concretos do ensino são claramente subalternizados por um discurso retórico de auto-satisfação.
Em todas as culturas, uns são beneficiados, outros são conduzidos para o fracasso.
2.1.7. Currículos
– Defasagem no currículo escolar dos alunos. Os alunos ingressam em novos ciclos sem que possuam os pré-requisitos necessários. Não há documento sobre a avaliação curricular que não tenha uma referência crítica a esta questão.
– Currículos demasiado extensos que não permitem que os professores utilizem metodologias ativas, onde os alunos tenham o lugar central. A necessidade de cumprir os programas inviabiliza a adoção de estratégias mais ativas, mas sobretudo retira tempo ao professor para ultrapassar as dificuldades individuais de aprendizagem que constata nos alunos.
– Desarticulação dos programas. Esta situação faz, por exemplo, com que os alunos repitam os mesmos conteúdos, de modo diverso e incoerente ao longo dos anos e das disciplinas, levando-os a desinteressarem-se pelas matérias e a sentirem-se confusos. O rosário de queixas é conhecido.
– As elevadas cargas horárias semanais ocupadas pelos alunos em atividades letivas, mais tradicionais, são desde há muito consideradas excessivas. Os alunos têm pouco tempo para outras atividades de afirmação da sua individualidade, desenvolvimento de hábitos de convivência, participação em ações coletivas em prol da comunidade, etc. O resultado é sentirem-se numa escola-prisão, sem qualquer relação com os seus interesses.
III. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora estejam todas relacionadas entre si, sendo causas e efeitos uma das outras, as razões para o fracasso escolar podem, para efeito didático, serem classificadas ou agrupadas entre aquelas que estão relacionadas ao próprio indivíduo, ou aluno, como problemas físicos ou psicológicos; as causas que estão relacionadas à escola, como a qualidade de ensino, entre outras; causas que estão relacionadas à comunidade localizada, como o próprio ambiente comunitário no que diz respeito às condições de higiene e saúde, qualidade de vida e, ultimamente, ao elevado nível de violência; e, finalmente, as causas pertencentes ao ambiente maior, que são as condições gerais econômicas e políticas do país.
Quase sempre se ‘condena’ o fracasso escolar, centrando-se imediatamente, e quase que exclusivamente, no aluno, elegendo-o como o principal responsável pelo seu próprio fracasso.
O primeiro a se culpar é o próprio aluno. Não é raro vermos estudantes julgando-se incapazes ou incompetentes para assimilar o que é ensinado na escola.
Depois, quem os culpa são os professores, seja através das notas, seja através de comentários sobre a capacidade ou incapacidade do aluno, que acaba negativando ainda mais o já abalado nível de auto-estima do estudante.
E, na sequência, os pais colaboram com essa auto-destruição do filho, através de críticas ou mesmo pela falta de incentivo ao estudo.
Portanto, sabemos que quando se busca algo mais sólido para se apoiar e para entender as causas de tanto fracasso escolar, o aluno começa a deixar de ser o ‘vilão’ da história, para se tornar uma vítima. Quando se busca entender as razões do fracasso escolar analisando as condições em que vive o aluno, e também as condições em que ele frequenta a escola (sem contar as próprias condições da escola), realmente entendemos que precisamos mudar nossa opinião.
Mas não só da escola depende essa carga. Houvesse uma escola de padrão ideal, e ainda assim nos depararíamos com essa grave situação de fracasso escolar, numa das fases mais importantes da educação do indivíduo, sendo exatamente por isso denominada de ensino fundamental. E quando seriam as razões para esse fracasso? Se o aprendizado, como todos sabem, é de suma importância para o crescimento da pessoa, por que não é levado a sério? Por que não se dá a ele a devida importância? Ou será que essa importância é dada, mas existem motivos bem mais profundos, enraizados em nosso meio, que impedem de encarar e levar adiante uma formação escolar digna de assim ser chamada?
FALCÃO (1993) faz uma comparação:
Já tentou ensinar um bebê a atender ao telefone? Ou ensinar datilografia a um analfabeto? Ou, quem sabe, em dia de jogo intencional do Brasil, com todo o país mobilizado, e na sala as pessoas coladas ao rádio ou à televisão, você experimentou chamar Juquinha ao quarto para uma aula sobre Capitanias Hereditárias? (p.42).
No dizer do autor, as perguntas acima são bastante simplórias, mas servem para chamar atenção para o fato de que nem todos estão prontos para aprender qualquer coisa em todos os momentos. Segundo ele, há um determinado pré-requisito que precisa ser preenchido, que é a maturação.
Devemos sempre estar atentos à real condição do educador e do educando. O professor, como representante do papel que lhe é socialmente atribuído, ou seja, ensinar, depara-se com vários dilemas seus que se misturam com o papel da profissão que ocupa. Os professores assumem, além de ensinar, a disciplina e em tornar uniforme o que é diferente, produzindo assim, via educação, os privilégios e os sofrimentos.
Sempre que a escola falha na assistência e na formação do aluno, quebra-se um elo no ritmo natural de um desenvolvimento potencial de conquistas, estabelecendo a desordem. Desordem que pode levar a vida do aluno ao caos e que se reflete na desestruturação da sociedade. Sempre que a escola desvirtua seu papel primordial, desencadeia-se um mecanismo automático de ressonância, que passa a repercutir na ordem social de uma cidade, de um país, do mundo.
Na criança problema nos dias de hoje não se faz igualdade social, se faz justiça social, pois não é todo mundo igual e devem-se reconhecer essas diferenças, mas a escola nivela todos como iguais e não se adequa à origem social de cada um. Dentro da escola, quem pode mais tem menos fracasso escolar. Mesmo uma criança oriunda de carências afetivas, herdadas por uma infância difícil, pode haver ainda a capacidade de recuperação ou adaptação às más condições de vida, se observadas as necessidades e oportunizadas mudanças para que ele mesmo alcance suas necessidades.
IV. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CASTANHEIRA, M. L. Da escrita no cotidiano à escrita escolar. Revista Leitura: Teoria e Prática, 20. Campinas: ABL, 1991.
COSTA, Dóris Anita Freira. Fracasso Escolar: diferença ou deficiência. Porto Alegre: Quarup, 1993.
CYPEL, Saul. O aprendizado escolar: reflexões sobre alguns aspectos neurológicos. Revista FDE, 19. São Paulo, 1993.
FALCÃO, Gerson Marinho. Psicologia da aprendizagem. 2ª ed. São Paulo: Ática, 1985.
FIJALKOW, J. Malos leitores: por quê? Madri: Pirâmide, 1989. In: Revista Pátio, n° 17, 2002.
GRIFFO, Clenice. Dificuldades de aprendizagem na alfabetização: perspectiva do aprendiz. Centro de referência do professor: Séries cadernos do professor e programas da pós-graduação da FAE/ UFMG, 1996.
NUNES, T; BUARQUE, L; BRYANT. Dificuldades na aprendizagem da leitura. São Paulo: Cortez e Autores Associados, 1992.
SENA, Maria das Graças de Castro. Dispositivo, 1. Belo Horizonte: Clínica d’Iss, 1999.
SOARES, Magda B. Linguagem e escola – uma perspectiva social. São Paulo: Ática, 1987.
VIDAL, G. Falso mal: médico denuncia a farsa da disritmia. In: Caderno do professor. n°12, 2004.
ANEXO I
ROTEIRO DE OBSERVAÇÃO
- Como é a relação professor/aluno.
- Como é o comportamento quando não conseguem fazer uma atividade.
- Como é o comportamento dos alunos repetentes diante de atividades propostas.
- Como estes alunos se relacionam com os colegas de sala de aula.
- Demonstram interesse por atividades extra-classe.
- Fazem atividades em tarefas de casa.
ANEXO II
ROTEIRO DE ENTREVISTA ÀS PROFESSORAS
- Como é sua relação com os alunos que têm dificuldade de aprendizagem?
- O que você planeja para ajudar alunos que fracassam?
- Qual é a sua relação com os familiares de seus alunos?
- Em sua opinião, qual é o fator principal para o fracasso escolar do aluno?
- Em sua opinião, quem/o quê é o culpado pelo fracasso escolar?
- Em sua opinião, o fracasso escolar tem raízes na situação sócio-econômica do aluno?
ANEXO III
ROTEIRO DE ENTREVISTA À SUPERVISORA
- Em sua opinião, existe um culpado para o fracasso escolar do aluno?
- A equipe docente recorre a você pedindo ajuda para sanar o problema do fracasso escolar?
- Qual é a sua atuação para superar o problema do fracasso escolar?
Autor: Marlene Aparecida Viana Abreu
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