Distúrbios comportamentais na infância: uma abordagem neurológica
Descubra como a abordagem neurológica pode ser usada para ajudar a lidar com distúrbios comportamentais em crianças. Saiba mais sobre como essa abordagem pode ser usada para promover o bem-estar e o desenvolvimento saudável das crianças.
Abordagem Neurológica dos Distúrbios Comportamentais na Infância
Autor: Antônio Carlos De Farias
Introdução
A diferenciação entre um comportamento normal e patológico nem sempre é clara; não existe um critério uniforme e inequívoco do que seja um comportamento normal. As pessoas são diferentes umas das outras, crescem em ambientes com variadas culturas e crenças, vivenciam as situações da vida com suas próprias maneiras de ser. Não se pode julgar as alterações comportamentais de uma criança sem antes entender sua história de vida, a herança genética e a experiência herdada dos seus pais, o ambiente em que cresceu e a forma como interagiu e interage com ele.
A Determinação genética e as influências ambientais
O comportamento humano é o resultado da interação entre a programação genética que controla a formação e organização do sistema nervoso e as circunstâncias ambientais em que o indivíduo se encontra ao longo do seu processo de evolução.
Os genes contêm as instruções iniciais para a formação do sistema nervoso, incluindo as estruturas anatômicas e químicas que participarão do processo de modulação comportamental com a finalidade de adaptar o indivíduo ao seu meio ambiente. Codificações genéticas inadequadas podem ocasionar cérebros malformados em sua estrutura anatômica ou química, gerando distúrbios cognitivos e/ou comportamentais. Muitos aspectos do que somos, que antes eram imputados às influências ambientais, são hoje mais corretamente reconhecidos como déficits cerebrais por herança genética. A maioria dos genes implicados com os distúrbios mentais varia no modo e intensidade como se manifestam nas sucessivas gerações familiares: um pai pode apresentar uma forma leve de distúrbio mental e o seu filho pode apresentar uma forma mais grave.
O ambiente, através dos vários estímulos externos, determina quais circuitos cerebrais serão mais desenvolvidos com a finalidade de adaptar o indivíduo ao seu meio externo; esses processos ocorrem de forma dinâmica ao longo de toda a vida. Em cada novo aprendizado, se estabelece um novo circuito de memória. A ação ambiental inadequada pode reforçar circuitos cerebrais de memória para a má conduta. Se uma criança é agredida, ela memoriza o ato e aprende a agredir; se uma criança se desenvolve em um meio de amor e diálogo, ela memoriza o ato e aprende a dialogar e amar.
Abordagem das alterações agudas do comportamento
Transtornos agudos do comportamento devem ser abordados como um quadro emergencial, uma vez que várias situações médicas podem causá-los, sendo algumas delas um risco potencial de morte para o paciente. Se no passado recente a maioria desses pacientes recebia atendimento em hospitais psiquiátricos, a evolução dos meios diagnósticos e a necessária humanização dos serviços médicos propiciaram atendimentos de melhor qualidade nos hospitais gerais. Situações causadoras de distúrbios comportamentais, como intoxicações, distúrbios metabólicos e hidroeletrolíticos, hematomas intracerebrais, requerem atendimento em locais com estrutura física adequada, equipe especializada, laboratórios e serviços de imagem – 24 horas, porque viabilizam diagnóstico e intervenção precoce. Passada essa fase de atendimento, é prudente que a hospitalização seja de curta duração, sendo o paciente posteriormente encaminhado para um ambulatório de saúde mental ou para outras especialidades, dependendo do seu diagnóstico clínico.
• Inespecíficos: pânico, euforia, desinibição verbal, agressividade
• Agitação psicomotora: hiperatividade psíquica e motora sem finalidade aparente.
• Confusão: desorientação
• Delírios: desorientação, despersonalização, alteração da percepção
• Alucinação: visuais e auditivas.
A: Sintomáticas – Relacionadas a enfermidades sistêmicas que possam comprometer secundariamente o sistema nervoso. Geralmente cursam com alteração do nível de consciência.
- Intoxicações
- Drogas
- Infecções do SNC
- Distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos
- TCE
- Estado de mal convulsivo de crises tipo parcial complexa ou ausência
- Doenças crônicas sistêmicas.
B: Psicóticas – Relacionadas a doenças psiquiátricas. Geralmente preservam o nível de consciência, mas desestruturam o pensamento.
• Surto psicótico
• Mania
C: Não psicóticas – Relacionadas a doenças psicossomáticas. Não comprometem o nível de consciência e tampouco comprometem a qualidade do pensamento. Geralmente associam-se a conflitos psíquicos.
• Pânico
• Conversão
• Somatização
Todas estas causas podem ser facilmente diferenciadas através de uma anamnese detalhada. As pautas de atuação da equipe médica devem seguir a seguinte sequência:
• Observação da conduta para depois definir sobre a necessidade ou não de contenção – química ou física ou ambas.
• Descartar causas sintomáticas
• Diferenciar causas psicóticas de não psicóticas
O comprometimento do nível de consciência tende a direcionar o diagnóstico para uma causa sintomática; a desestruturação do pensamento para uma causa psicótica, lembrando que as esquizofrenias são distúrbios que se iniciam na adolescência ou início da vida adulta e têm uma evolução com períodos livres de sintomas. Não se deve suspeitar do quadro quando o primeiro surto ocorre em crianças de baixa idade. Antes da puberdade, geralmente o surto psicótico associa-se a doenças sistêmicas, como o Lúpus eritematoso sistêmico. Os quadros psicossomáticos geralmente associam-se a ganhos secundários e frequentemente relacionam-se a maus-tratos e agressões físicas.
Abordagem das alterações crônicas do comportamento
O atendimento a crianças com transtornos crônicos do comportamento geralmente demanda o trabalho de uma equipe multidisciplinar. O comportamento inadequado frequentemente desestrutura as relações acadêmicas, familiares e sociais da criança. O auxílio de uma equipe especializada, envolvendo médicos, psicólogos e assistentes sociais, propicia uma melhor análise e abordagem, ao considerar todas as variáveis médicas e não médicas que colaboram para o agravamento do quadro.
A interpretação entre um comportamento difícil, mas normal, e um comportamento patológico nem sempre é clara; muitos problemas, às vezes, erroneamente interpretados como patológicos, são típicos e esperados em certos estágios da vida infantil:
• Ansiedade de Separação – 8 a 24 meses – a criança adquire a capacidade de distinguir a mãe de outras pessoas e se assusta quando se aproxima de estranho ou quando a mãe momentaneamente se afasta.
• Comportamento Opositivo (birras) – 24 a 48 meses – tentativa de autonomia da criança.
• Pensamento mágico – 36 a 48 meses – a criança não separa o real do imaginário; nessa fase, são comuns o medo, as fobias e as mentiras.
• Fobia escolar – 6 a 7 anos
• Angústia da Puberdade – Adolescência
Outros são decorrentes de um padrão de temperamento ou associados a funções biológicas irregulares:
• Humor negativo – reações intensas a estímulos banais, inadaptação a situações novas, mau humor
• Distúrbio do ciclo do sono, alimentação e excreção
• Transtorno de ajustamento – reação a um estresse agudo claramente identificável
Ao abordar o problema, é sempre importante analisar:
A. As características dos pais:
Perfil comportamental, temperamento, expectativas em relação ao filho, doenças neuropsiquiátricas.
B. As características da criança
Fase do desenvolvimento psíquico, temperamento, ritmo biológico de sono-vigília, alimentação e excreções, hábitos, saúde pregressa.
C. O contexto em que o comportamento considerado patológico ocorre
Ambiente, dinâmica de funcionamento familiar e escolar.
Um comportamento patológico é mais provável quando possui uma característica crônica, mais de um tipo de problema comportamental envolvido, interferindo com a função cognitiva e social da criança, manifestando-se em todos os ambientes e sendo observado por diferentes pessoas do seu convívio. A prevalência desses comportamentos patológicos na população pediátrica varia de acordo com como os problemas são definidos e medidos; os índices oscilam entre 2 e 10%.
Os sintomas crônicos geralmente associados a comportamentos patológicos são:
• Ansiedade: (hipercinesia, impulsividade, irritabilidade, pânico, obsessão, compulsão)
• Distúrbios do humor: (depressão, isolamento, hipoatividade, insônia, fadiga, cansaço)
• Distúrbios do movimento: (tics)
• Pobre interação social
• Alterações cognitivas: (déficit de atenção, memória, linguagem, etc)
Dependendo da patologia, esses sintomas podem ou não estar presentes; também podem oscilar em intensidade e gravidade. As principais causas são doenças neuropsiquiátricas como:
• TDAH
• Síndrome de Tourette
• TOC
• Autismo
• Transtornos psiquiátricos
Estas doenças têm origem multifatorial (genética, ambiental) e são decorrentes de um mau funcionamento de circuitos cerebrais relacionados à regulação do comportamento. Ocorre déficit de neurotransmissores como, por exemplo, dopamina e serotonina, cursando com alterações afetivas, cognitivas e comportamentais, podendo ser comórbidas em um mesmo indivíduo. O diagnóstico diferencial entre elas envolve uma história clínica detalhada com aplicação de questionários específicos (DSM-IV). Os exames complementares são de pouquíssima utilidade para o diagnóstico.
Outras patologias cerebrais podem alterar os circuitos cerebrais relacionados com a regulação do comportamento, como por exemplo:
• Epilepsias
• Moléstia Reumática – Coréia de Sydenham
• Tumores cerebrais
• Doenças endocrinológicas
Nestes casos, os métodos complementares, como prova de atividade inflamatória, dosagens séricas de hormônios, eletroencefalograma e exames de neuroimagem, são importantes apêndices no diagnóstico e tratamento.
Tratamento
Terapia comportamental cognitiva
Terapia baseada em condicionamentos psicológicos que visam o rompimento de padrões patológicos de comportamento.
Psicofarmacoterapia
A psicofarmacoterapia vem ocupando um lugar de destaque no tratamento não só de adultos, mas também de crianças e adolescentes. Tem por objetivo melhorar as funções cognitivas (atenção, memória, concentração) e afetivas (humor, disposição) que possibilitem uma melhora da integração social da criança. Deve ser um recurso complementar à psicoterapia.
Prevenção
A prevenção dos distúrbios comportamentais deve iniciar já no momento em que o casal idealiza ter um filho. Futuros pais devem evitar a exposição a agentes ambientais que comprovadamente podem causar alterações nas células reprodutivas ou interferir sobre o processo de formação e desenvolvimento cerebral do futuro filho. O fumo, por exemplo, contém a nicotina responsável pela diminuição da circulação placentária, ocasionando um menor aporte de oxigênio para o feto, o que interfere com a migração natural dos neurônios e formação de novas conexões (sinapses). Mães fumantes têm 50% a mais de riscos que as não fumantes de apresentar filhos com retardo mental e TDAH. Drogas, álcool, desnutrição materna e infecções no período gestacional são outras possíveis causas. O homem também deve ter alguns cuidados, pois os espermatozoides são vulneráveis a esses agentes ambientais, considerando que eles possuem uma vida útil de 3 meses; este seria um período de segurança para o homem que prospectivamente deseja ter um filho. O aconselhamento genético é importante para casais que apresentam histórico de doenças neuropsiquiátricas ou retardo mental na família. A gestante deve regularmente realizar as consultas de pré-natal e realizar exames complementares para identificação precoce de problemas no feto. Sabe-se que o ambiente exerce uma importante influência sobre a plasticidade cerebral (formação de novos circuitos de memória, crescimento neuronal); a correta educação dos filhos, com a precoce imposição de limites, introduz desde tenras idades a noção de respeito ao outro e aceitação das regras sociais. “A criança reproduz e memoriza as condutas do seu ambiente”.
Construir e Incluir
http://construireincluir.blogspot.com/2011/05/abordagem-neurologica-dos-disturbios.html
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