fbpx Skip to main content

Atualizado em 10/08/2024

Abordagem Fisioterapêutica em Pacientes Portadores de Síndrome de West – Relato de Dois Casos

Saiba mais sobre a abordagem fisioterapêutica em dois pacientes portadores de Síndrome de West. Neste artigo, você encontrará informações sobre como a fisioterapia pode ajudar a melhorar os resultados clínicos.

Abordagem Fisioterapêutica em Pacientes Portadores de Síndrome de West – Relato de Dois Casos


INTRODUÇÃO

A Síndrome de West é uma afecção caracterizada por espasmos infantis, que aparece nos lactentes entre seis e doze meses, podendo ser a primeira manifestação de uma encefalopatia pré, peri ou pós-natal 1. Esta afecção trata-se de uma situação rara, representada em 0,7/100.000 crianças, sendo que há um predomínio do sexo masculino, representando em média a proporção de 1,5 – 2:1. As crises costumam se manifestar entre o terceiro e o sétimo mês de vida, onde o pico máximo de início ocorre no quinto mês 2. Foram observados em estudos realizados no Serviço de Neurologia do Hospital das Clínicas de FMUSP, em 1976, que a relação masculino-feminino foi de 2,1:1 2. Outro estudo relatou que a prevalência de epilepsia em familiares dos pacientes com Síndrome de West foi de apenas 7%. O risco entre irmãos apresentou-se na ordem de 1,5 ± 3:1.000 e em parentes de primeiro grau de 7 ± 3:1.000 3.

A Síndrome de West consiste numa tríade de sinais clínicos e laboratoriais, como: atraso do desenvolvimento, espasmos infantis e traçado eletroencefalográfico com padrão de hipsiarritmia, caracterizada por: desorganização marcante e constante da atividade basal, elevada amplitude dos potenciais; ondas lentas delta de voltagem muito elevada (“ondas em montanhas”); períodos (salvas) habitualmente breves de poliondas e polipontas; período de atenuação da voltagem que, em alguns casos, parece chegar a silêncio elétrico 4 (Figura 1).

A hipsiarritmia pode desaparecer ou se transformar no decorrer do tempo. O controle das crises não significa reversão de sinais e sintomas antigos 4.

A etiologia dos espasmos infantis é muito variada e quase sempre é consequência de uma lesão cerebral, estrutural e metabólica. Existem casos criptogênicos onde o lactente é normal até o início dos espasmos, sem qualquer lesão cerebral detectável, e casos sintomáticos onde há prévio desenvolvimento neuropsicomotor anormal, alterações ao exame neurológico e/ou lesões cerebrais que podem ser identificadas por exames de imagem 4. Os espasmos em flexão são contrações breves, maciças, simétricas, com predominância de flexão da cabeça e do tronco “Tic Saalam”, levando-se os membros superiores para frente e para fora, flexionando os músculos do abdômen 5. Essas crises costumam repetir-se em série, algumas vezes com 3 ou 4 espasmos consecutivos, podendo ocorrer 30 a 50 espasmos seguidos. Cada espasmo pode durar alguns segundos, caracterizados como mioclonia que pode acometer a musculatura mais distal, ou seja, dos quatro membros 6. Tais espasmos podem ocorrer tanto no sono como em estado de vigília, havendo descrição por autores de uma frequência maior nos estados de transição entre o sono e a vigília. Há também a descrição de que os estímulos sensoriais bruscos podem precipitar uma crise, porém, cabe diferenciar nestes casos os espasmos de flexão ou de reações de medo ou sobressalto 5. Ao exame neurológico, podem também ser encontradas outras alterações que muitas vezes estão relacionadas com a encefalopatia preexistente e não propriamente com o início da Síndrome de West, tais como microcefalia, sinais de liberação piramidal, estrabismos, dupla hemiplegia, hemiparesia, monoparesia e hipotonia difusa 6.

A tomografia computadorizada é anormal em 58-75% das crianças, demonstrando mais frequentemente a presença de calcificações intracranianas, anomalias congênitas e atrofia 7.

O prognóstico, mesmo nos casos tratados precocemente, permanece reservado, observando-se em 90% dos casos a presença de deficiência mental com distúrbios psiquiátricos frequentes 8.

O eletroencefalograma é fundamental para diagnóstico e se caracteriza pelo seu aspecto anárquico, com ondas de grandes amplitudes, lentas e pontas-ondas lentas, não havendo ritmo de base organizada 4.

O tratamento clínico deve ser orientado, sobretudo com hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), além de uma dieta hipossódica e suplementação de cloreto de potássio. Entretanto, outros anticonvulsivantes têm sido utilizados, isoladamente ou em combinação nos casos de espasmos infantis, como Clonazepam, o Ácido Valpróico, o Fenobarbital e o Vigabatrin 9. O tratamento fisioterapêutico visa minimizar o atraso neuro-sensório-motor através de técnicas utilizadas que enfatizam a inibição de padrões posturais anormais e tem como meta a normalização do tônus que pode acometer as habilidades funcionais.

Os métodos terapêuticos para tratamento da motricidade são os métodos neurofisiológicos e, em particular, o método neuroevolutivo de facilitação (Bobath), sendo importante para a criança com deficiência cognitiva, visando a aquisição de uma resposta automática diante da perturbação ou manuseio da criança por uma pessoa, enquanto o método de controle motor exige a participação cognitiva do próprio paciente 10. No lactente de poucos meses, pode-se haver alguma vantagem em facilitar os ajustes de cabeça, tronco e membros, principalmente nos casos de bebês hipotônicos 10. Contudo, a eficácia do tratamento depende do tipo de intervenção terapêutica e da gravidade da deficiência intelectual do paciente; devendo ser incluído no tratamento o treino de atenção e controle visual e motor, treinamento das tarefas funcionais importantes.

Este trabalho teve como objetivo descrever a importância do tratamento fisioterapêutico no desenvolvimento neuro-sensório-motor de duas crianças com diagnóstico clínico de Síndrome de West.


RELATO DE CASOS

Caso 1

V.F.D. (1), um ano e dez meses de idade, iniciou acompanhamento na Clínica de Fisioterapia da UNIARA em janeiro de 2002 por apresentar hipertonia leve de membros inferiores (MMII), diminuição de força muscular de membros superiores e inferiores (MMSS e MMII) e assimetria nas posturas prono e supino. Como antecedentes, é gemelar e pré-termo (32 semanas), tendo necessitado de 2 semanas internado em incubadora, apresentava sinais de lesão cerebral. Em supino, apresenta espasticidade extensora de ação dos membros superiores e inferiores, Reflexo Tônico Cervical Assimétrico (RTCA), Reação Cervical de Retificação, preensão palmar e plantar, Reflexo Tônico Labiríntico (RTL). Na avaliação dinâmica, o paciente rolava em bloco quando estimulado e levava a mão à boca. Mantinha a cabeça em hiperextensão.

Em prono, apresentava Reflexo Tônico Cervical Simétrico (RTCS) e iniciava reação de anfíbio bilateralmente. Na posição de gatas, conseguia liberar as vias aéreas, mas não apoiava as mãos. Sentado, observava-se aumento da cifose torácica e, como limitação funcional, não controlava a cabeça, não engatinhava e não sentava.

Ao exame físico, apresentava hipotonia de tronco e pescoço e hipertonia leve de MMII, com diminuição de força muscular de membros superiores e inferiores, e assimetria nas posturas em prono e supino.

Caso 2

V.F.D (2), um ano e dez meses de idade, iniciou acompanhamento juntamente com V.F.D. (1), apresentou quadro clínico de Síndrome de West associado a Hidrocefalia; não manipulava objeto com as mãos e não possuía controle de tronco e cabeça. Como antecedentes, é gemelar e pré-termo (32 semanas), tendo necessitado de 12 semanas internado em incubadora, apresentava sinais de lesão cerebral. Ao exame físico, o paciente apresentou hipertonia extensora de membros superiores e inferiores e hipotonia de tronco e pescoço, diminuição de força de membros superiores e membros inferiores. Em supino, o paciente apresentava espasticidade extensora de ação dos membros inferiores, RTCA, Reação Cervical de Retificação, preensão palmar e plantar, RTL, e quando estimulado, rolava em bloco e levava a mão à boca, mantinha a cabeça em hiperextensão. Em prono, apresentava RTCS e iniciava a reação de anfíbio bilateralmente. Na posição de gatas, conseguia liberar as vias aéreas, mas não apoiava as mãos. Sentado, apresentava hipercifose tóraco-lombar. Como limitação funcional, não controlava a cabeça, não engatinhava e não sentava.

Após avaliação fisioterapêutica na Clínica de Fisioterapia da UNIARA, os bebês foram submetidos ao tratamento fisioterapêutico utilizando como conduta: exercícios com o paciente em decúbito ventral na bola, onde se gira a bola para frente e para trás, onde a criança foi estimulada a fazer extensão da cabeça e do tronco através de estímulo auditivo e visual, também estimulando a criança a descarregar peso sobre os MMII; ainda nesta postura, estimulou-se a apreensão e manipulação de objetos com brinquedos colocados à frente da criança; exercício com a criança sentada sobre a bola, estimulando retificação de tronco, com a terapeuta segurando, podendo provocar desequilíbrios para aquisição da reação de proteção dos braços para os lados e para frente; exercício no rolo com a criança em decúbito ventral, onde se estimulou a descarga de peso sobre as mãos e joelhos, estimulando a reação de proteção dos braços para frente, a descarga de peso nos joelhos e a postura quadrúpede; exercícios na prancha com a criança em prono para melhorar equilíbrio; estimulou-se a criança a pegar objetos na linha média; exercícios de co-contração para controle de cabeça, tronco e membros, bem como, mobilização passiva e dissociação de cinturas nas posturas supino e lateral; paciente em decúbito dorsal, estimulou-se o rolar com a criança com quadril e joelhos fletidos junto ao peito e os braços entrelaçando as pernas; e após, repetindo o exercício com os braços entrelaçando as pernas posteriormente junto aos glúteos; descarga de peso em membro inferior, com a criança em decúbito lateral e a perna fletida à frente do corpo, empurrando o joelho para frente e para trás; treino das fases do desenvolvimento, estimulando o rolar, a posição de puppy, gatas, sentar e arrastar utilizando pontos-chave.

Foram realizadas 25 sessões numa frequência de duas vezes por semana, com duração de 50 minutos cada, no período de julho a novembro de 2002. As crianças foram fotografadas no início, durante e no final do período de acompanhamento, com o consentimento livre e esclarecido dos pais, para posterior análise da evolução do desenvolvimento neuro-sensório-motor.


RESULTADOS

Após análise dos dados de evolução e das fotos das crianças, observou-se como resultados no Caso 1, melhora do controle de cabeça durante o exercício em decúbito ventral na bola Bobath, no rolo e quando puxado para sentar; na atividade de ponte sem auxílio; melhora da apreensão e manipulação de objetos; melhora das habilidades dos MMSS em prono, iniciando o rastejar.

Já no Caso 2, observou-se melhora do controle de cabeça em decúbito ventral na bola e com descarga de peso em membros inferiores, no rolo e na posição sentada; manteve-se melhor em decúbito lateral; apoiou bem os membros superiores (principalmente o membro superior direito) quando na posição em decúbito ventral no rolo; na posição de gatas, iniciou o rastejar; melhorou a apreensão e manipulação de objetos; teve uma melhora na atenção; diminuição do padrão extensor; consegue rolar sem auxílio; realiza exercício de ponte sem auxílio.


DISCUSSÃO

A Síndrome de West consiste numa tríade de sinais clínicos e laboratoriais, como: atraso do desenvolvimento, espasmos infantis e traçado eletroencefalográfico com padrão de hipsiarritmia 4. Os espasmos infantis causados pela Síndrome de West não possuem uma causa única, mas sim multifatorial, representando o resultado de muitas e diferentes condições. Algumas vezes, ocorrem com bebês cujo desenvolvimento está abaixo da média por possuírem condições neurológicas que acometem o desenvolvimento do cérebro. Estas condições podem se iniciar antes, ou durante o nascimento, ou ainda por doença nos primeiros meses de vida 11.

O eletroencefalograma é fundamental para diagnóstico e se caracteriza pelo seu aspecto anárquico, com ondas de grandes amplitudes, lentas e pontas-ondas lentas, não havendo ritmo de base organizada 4.

Os elementos que mais frequentemente se correlacionam com um prognóstico mais grave são: grupo sintomático; precocidade no início dos espasmos (menos de três meses); existência de outros tipos de crises; desenvolvimento neuro-sensório-motor anormal precedendo o aparecimento dos espasmos; anormalidades no exame neurológico; início do tratamento tardiamente 6.

Os lactentes com atraso no desenvolvimento neuro-sensório-motor são um tanto comprometidos no que se refere à capacidade para sentar e ficar em pé sem ajuda, bem como de usar as mãos sem apoio 10. Isso foi observado em ambos os casos, onde os pacientes não permanecem sentados e em pé sem apoio, sendo que estas posições são adquiridas até um ano de idade em uma criança com desenvolvimento normal.

No lactente de poucos meses, pode haver alguma vantagem em facilitar os ajustes de cabeça, tronco e membros diante dos deslocamentos provocados por algum fator externo. É possível que, no caso do lactente normal, tais movimentos de endireitamento ocorram naturalmente, graças ao manuseio da criança pelos pais, enquanto o lactente mentalmente atrasado costuma ser movimentado menos, sobretudo se ele for hipotônico ou responder pouco aos estímulos 10. Isso também foi observado nos casos estudados, onde os mesmos apresentam hipotonia axial, dificultando o controle de cabeça e tronco. A família referiu excesso de cuidados ao movimentar as crianças, deixando-os mais tempo na postura deitada e, consequentemente, atrasando o desenvolvimento neuro-sensório-motor normal.

Considerando que no lactente observa-se maior facilitação dos ajustes de cabeça, tronco e membros com o tratamento fisioterapêutico 7, as crianças com 1 ano e 10 meses de idade encontram-se em tratamento clínico medicamentoso com as crises controladas, apresentando atraso no desenvolvimento neuro-sensório-motor, embora estejam respondendo bem ao tratamento fisioterapêutico.

É válido ressaltar que nos casos relatados, ambos apresentam patologias associadas que agravam o atraso do quadro neuroevolutivo. Contudo, considerando o grau de comprometimento dos casos, pode-se inferir que o tratamento fisioterapêutico tem auxiliado na aquisição da funcionalidade dos mesmos.

Estes casos ilustram as dificuldades do tratamento clínico e terapêutico e destacam que, a despeito do tratamento fisioterapêutico no desenvolvimento neuro-sensório-motor nesta síndrome, é possível observar evolução, ainda que o prognóstico para estes casos seja reservado até se obter o total controle das crises.


CONCLUSÃO

Crianças com Síndrome de West apresentam prognóstico neuro-sensório-motor reservado até que se obtenha total controle das crises;

O método fisioterapêutico utilizado parece ser adequado ao tratamento de crianças com atraso no desenvolvimento neuro-sensório-motor, associado à Síndrome de West;

Foi possível observar nos casos relatados os efeitos benéficos do tratamento fisioterapêutico, embora maiores estudos sobre a ação da fisioterapia na Síndrome de West devam ser realizados.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 – Ajuriaguerra, J., Manual de Psiquiatria Infantil, 2º edição, Editora Masson do Brasil Ltda, 1990, 16: 473-561.

2- Gastaut H., Roger J., Soulayarol R., Pinsard N. L, Encephalopatia Myoclonique Infantile avec Hypssarrytmie (Syndrome de West). Masson et Cie. Ed. Paris, 1964.

3- Jeavons, P.M.; Bonder, B.D., Infantile Spasms, In: Vinken PJ, Bruy GW. Ed. Hand book of clinical neurology, North Holland, Amsterdam, 1974, 5: 219.

4- Fernandes, P.V., 2001, Síndrome de West (online) Disponível na Internet via WWW.URL: http://www.interfisio.com.br.

5- Andrade, J.M.P., 1999, Síndrome de West (online) Disponível na Internet via WWW.URL: .

6- Dias, M.J.M. “Síndrome de West” – In: Diament & Cypel, S., Neurologia Infantil, 3ºedição, Editora Atheneu, São Paulo, 1996, 67: 972-976.

7- Painter, M. J.; Bergman, I. “Neurologia” In: Kliegman, B. Nelson, Princípios de Pediatria, 3º edição, Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 1999, 18: 590-600.

8- Zerati, E. Síndrome de West (on-line) Disponível na Internet via WWW.URL: .

9- Sanvito, W.L., Síndromes Neurológicas, 2º edição, Editora Atheneu, São Paulo, 1997, 542.

10- Sheperd, R.B., Fisioterapia em Pediatria, 3º edição, Livraria Santos Editora, São Paulo, 1980, 9: 165-184.

11-Fonseca, Durval., 2000, O que é Síndrome de West? (on-line) Disponível na Internet via WWW.URL: http://www.durvalfonseca.vilabol.uol.com.br/medic/west.html.

Autor: Melina Gaino Cassemiro

A importância da avaliação no ensino fundamental

Explore opções de bolas de fisioterapia para auxiliar no tratamento


Este texto foi publicado na categoria Educação Inclusiva e Especial.

 About Pedagogia ao Pé da Letra

Sou pedagoga e professora pós-graduada em educação infantil, me interesso muito pela educação brasileira e principalmente pela qualidade de ensino. Primo muito pela educação infantil como a base de tudo.

Escreva um comentário

Não se preocupe, seu email ficará sem sigilo.