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A escola de atenção às diferenças

Este artigo discute a importância da inclusão escolar e as políticas de educação especial no Brasil, abordando como a escola pode atender às diferenças e promover um ambiente inclusivo para todos os alunos.

A escola de atenção às diferenças

A escola de atenção às diferenças

A discussão sobre a inclusão escolar é objeto de interesse em muitos países. E no Brasil não poderia ser diferente. Do ponto de vista da legislação, o Brasil está na vanguarda em relação a muitos países da Europa e da América do Norte no que diz respeito à educação inclusiva.

A política de Educação Especial na Perspectiva de Educação Inclusiva de janeiro de 2008 (MEC-SEESP, 2008) assegura o direito de toda criança frequentar a escola comum, esclarecendo ações que são de competência da educação especial e daquelas que são de competência do ensino comum.

Este último é responsável pela escolarização de todos os alunos, indistintamente, nas classes comuns de ensino, enquanto o primeiro é responsável pelos serviços que podem ser necessários aos alunos público-alvo da educação especial, que incluem alunos que apresentam: deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades – superdotação. Dentre esses serviços, a política orienta para a oferta do Atendimento Educacional Especializado – AEE. De acordo com essa política, este atendimento assegura que os alunos aprendam o que é diferente do currículo do ensino comum e que é necessário para que possam ultrapassar as barreiras impostas pela deficiência. O Atendimento Educacional Especializado foi regulamentado pelo Decreto nº 6571 de 17/09/2008.

O referido decreto reestrutura a educação especial, consolida diretrizes e ações já existentes, voltadas à educação inclusiva, e destina recursos do Fundo da Educação Básica (Fundeb) ao atendimento de necessidades específicas do segmento. As escolas públicas de ensino regular que oferecem atendimento educacional especializado terão financiamento do Fundeb a partir de 2010. A matrícula de cada aluno da educação especial em escolas públicas regulares será computada em dobro, com base no censo escolar de 2009, aumentando o valor per capita repassado à instituição.

O Atendimento Educacional Especializado – AEE – destinado aos alunos público-alvo da educação especial é um serviço que identifica, elabora e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades específicas. O AEE complementa e/ou suplementa a formação do aluno com vistas à autonomia e independência na escola e fora dela.

Este atendimento privilegia o desenvolvimento dos alunos e a superação dos limites intelectuais, motores ou sensoriais. Visa especialmente o acesso ao conhecimento, permitindo ao sujeito sair de uma posição passiva e automatizada diante da aprendizagem para o acesso e apropriação ativa do próprio saber.

O Atendimento Educacional Especializado tem como objetivo dar apoio complementar à formação dos alunos que apresentam deficiência física, mental, sensorial (visual e pessoas com surdez parcial e total), além de alunos com transtornos gerais de desenvolvimento e com altas habilidades. Quando necessário, esses alunos devem ser atendidos em suas especificidades, para que possam participar ativamente do ensino comum. O AEE deve ser realizado no período inverso ao da classe comum frequentada pelo aluno e na própria escola ou em outra escola próxima desse aluno.

De acordo com a política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva de janeiro de 2008, o AEE se realiza na sala multifuncional, que é um espaço equipado e organizado preferencialmente em escolas comuns das redes de ensino. Nessa sala, podem ser atendidas as crianças da escola e de escolas vizinhas.

O professor de AEE oferece acompanhamento em sala de aula para ensinar o uso de recursos destinados aos alunos com deficiência aos professores e demais alunos. O professor do AEE deve identificar e desenvolver estratégias educativas visando à superação das dificuldades de aprendizagem dos alunos. Ele inclui em suas ações: avaliação do aluno, a gestão do seu processo de aprendizagem e acompanhamento desse aluno na sala de recurso multifuncional e na interlocução com o professor do ensino comum.

Apesar de assegurado pelo decreto 6571/2008, o AEE ainda não está implementado em todas as escolas brasileiras e, como se trata de um serviço recente, não dispomos de pesquisas que indiquem o impacto desse atendimento na aprendizagem dos alunos que dele se beneficiam.

O atendimento educacional por si só não garante a aprendizagem dos alunos; mudanças substanciais no interior da escola e nos sistemas de ensino são necessárias para garantir a aprendizagem de todos os alunos. A colaboração entre os diversos agentes da escola, tais como os gestores e equipe técnica, os professores da sala comum e os professores do AEE, é imprescindível para o desenvolvimento de uma prática sintonizada com as necessidades dos alunos.

Esses profissionais devem aprender a trabalhar juntos e orquestrar seus esforços em favor do desenvolvimento de uma educação de qualidade. Faz-se necessário às redes de ensino conceberem um modelo de formação e acompanhamento que permita a cada um desses grupos desenvolver um saber e um saber fazer que valorize a participação de cada um como membro que contribui com as ações daquela comunidade educativa.

Este mesmo preceito deve ser observado no interior da sala de aula, espaço pedagógico em que cada aluno se constitui em sujeito de aprendizagem que contribui efetivamente para a elaboração de um saber que só tem sentido quando compartilhado por todos os membros da classe.

A concretização da política de inclusão se expressa pela criação de salas multifuncionais nas escolas públicas brasileiras, por uma política de formação de professores em Atendimento Educacional Especializado voltado para o atendimento das crianças nessas escolas, bem como pela transformação das práticas pedagógicas e da gestão escolar nas redes de ensino. Deste modo, o desafio de escolarizar todas as crianças no ensino comum não é tarefa da educação especial, mas das redes públicas de ensino.

Uma política de vanguarda não garante a acessibilidade aos saberes escolares se não houver uma verdadeira transformação no interior da escola. É necessário concretizar no cotidiano dessa instituição o que já está assegurado por lei. Não basta garantir a acessibilidade; é preciso criar as condições para que a escola se transforme em um espaço verdadeiro de trocas que favoreçam o ato de ensinar e aprender. Neste sentido, nosso país ainda tem um importante caminho a percorrer para assegurar educação a todos os jovens, crianças, adultos e adolescentes que integram o sistema público de ensino.

De acordo com a nova Política de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, os sistemas de ensino devem se organizar para oferecer a TODAS as crianças, não somente o acesso e a permanência na escola, mas também os serviços educacionais que forem necessários para garantir a aprendizagem escolar. A articulação entre o ensino comum e a educação especial, sobretudo através do atendimento educacional especializado, deve visar sempre a aprendizagem dos alunos que se beneficiam desse serviço.

Transformar a escola significa criar as condições para que TODOS os alunos possam atuar efetivamente nesse espaço educativo, focando as dificuldades do processo de construção do conhecimento para o ambiente escolar e não para as características particulares dos alunos.

Segundo Hemmingson e Borell (2002), promover a educação inclusiva tem como pré-requisito a participação efetiva dos alunos, a qual está relacionada ao ambiente escolar. Os autores desenvolveram na Suécia um estudo que teve como objetivo identificar as barreiras para a participação em escolas inclusivas a partir da perspectiva dos próprios estudantes com deficiência física. Os resultados mostram que dois terços dos estudantes experimentaram barreiras na participação, tanto no ambiente físico quanto no social.

A maioria das barreiras teve origem na maneira como as atividades da escola estão organizadas e são executadas. Por exemplo, mesmo com todas as salas adaptadas fisicamente, o fato de as atividades se desenvolverem em lugares diferentes dependendo da disciplina dificultava a participação dos alunos com deficiência física, simplesmente pelo fato desses alunos apresentarem maior lentidão na locomoção de um espaço a outro da escola.

As falhas em conseguir os ajustes ambientais adequados resultaram na restrição da participação ou exclusão destes alunos de algumas das atividades em classe. Os resultados do estudo sugerem que a maneira como as atividades estão organizadas na escola deve ser o principal alvo de transformação para garantir uma total participação dos alunos que apresentam deficiência. Este aspecto não prevê apenas a previsão de atividades didáticas, mas também o ambiente sócio-interacional da escola.

Em relação ao ambiente escolar favorável à inclusão, Soodak (2003) faz referência ao desenvolvimento de estratégias para melhorar a qualidade global do ambiente da sala de aula para acolher os alunos com deficiência. Essas estratégias contemplam a organização de um ambiente no qual os alunos se sintam acolhidos, seguros e apoiados.

Suas principais sugestões são: criar uma comunidade inclusiva, promover o sentimento de pertença, facilitar a aproximação das crianças, favorecendo a amizade entre os alunos, desenvolver a colaboração entre pais e professores e entre professores e outros membros da escola, apoiar e incentivar comportamentos positivos em todos os alunos e não apenas naqueles que demonstram comportamentos inadequados ao ambiente escolar, evitando punições e expulsões.

Ainda em relação à interação entre os alunos em contexto de inclusão, Bloom e Perlmutter (1999) alertam que problemas relacionados a comportamentos devem ser abordados como problemas pertencentes a toda a classe e não apenas ao professor. Os autores ressaltam a importância de se construir um ambiente acolhedor e interativo entre as crianças, contrapondo-se à punição e repreensão.

Os autores apontam alguns aspectos importantes para o processo de inclusão de crianças com deficiência no que se refere a comportamento e interação da turma toda: – a preparação dos demais alunos, que devem desde sempre ser ensinados a respeitar, a cuidar uns dos outros e a expressar afetividade; – a auto-regulação das crianças com deficiência no que concerne aos comportamentos apropriados para viver em comunidade.

Os autores observam que algumas crianças com deficiência não possuem habilidades de selecionar e controlar seu próprio comportamento de modo a interagir socialmente de forma positiva; – trabalhar tendo em vista uma abordagem do tipo resolução de problemas: a cada acontecimento perturbador provocado por um comportamento inadequado, o professor procurava discutir com todas as crianças as medidas que deveriam ser tomadas para contornar ou resolver aquele problema.

Os autores exemplificam com o caso de uma criança com síndrome de Down que frequentemente fugia da sala. O professor discutiu o problema com a turma e pediu que escrevessem possíveis soluções para fazer a criança ficar em sala. As soluções apresentadas pelos colegas estavam vinculadas aos aspectos afetivos e atitudinais, tais como: demonstrar que gosta do colega com síndrome de Down e dar mais atenção para ele.

Os autores ressaltam também a importância da crença no sucesso do trabalho para que o processo de inclusão aconteça. Eles enfatizam que é fundamental não apenas o professor acreditar que a participação daquela criança na sala de aula regular é possível, como também fazer as outras crianças acreditarem nisso. E isso está diretamente ligado à capacidade de acreditar em si mesmo e de manter a auto-estima de todos os alunos.

Os comentários de Bloom e Perlmutter (1999) causam estranheza pelo fato de ressaltarem a intervenção do professor sobre o comportamento da criança com deficiência, quando na verdade essa intervenção deve ser efetuada sobre o comportamento de qualquer criança que seja considerado inadequado à convivência do grupo classe.

Em estudo realizado por nós (FIGUEIREDO, 2008) em uma escola pública em contexto de inclusão escolar, constatamos que o tipo de convivência estabelecida na classe independe da presença de alunos com deficiência, bem como as dificuldades de inserção não estão relacionadas à deficiência, mas à forma como a criança é educada. No espaço da sala de aula, a convivência se torna mais harmoniosa quando a professora consegue estabelecer com seu grupo um ambiente no qual as crianças se sentem seguras, respeitadas, acolhidas e percebem o reconhecimento do outro sobre as suas ações.

Para isso, o professor deve ser uma referência de segurança sobre a qual a criança pode se apoiar, estabelecendo rotinas de trabalho cotidiano da sala de aula, assegurando a participação de todos os alunos nas atividades da classe. Ainda no contexto da convivência da classe, é importante reconhecer que a criança é fonte de um saber e de uma cultura, logo ela participa da construção de um saber coletivo, de modo que a participação de cada aluno nas atividades da classe é reconhecida pelos demais colegas.

O acolhimento é garantido quando o professor faz o acompanhamento das estratégias utilizadas pelas crianças em suas aprendizagens, sendo capaz de ouvi-las, manifestando interesse e afetividade por elas (pelos seus sucessos, suas dificuldades, suas preocupações). Estes aspectos dizem respeito diretamente à gestão da sala de aula, mas estão relacionados também à gestão da escola. Esses dois aspectos se constituem elementos centrais na mudança de uma escola que exclui para aquela que inclui.

A gestão da escola e a atenção às diferenças

Mudanças na gestão da escola se configuram no sentido de torná-la mais democrática e participativa para alunos, professores e demais atores desse espaço pedagógico. Significa compartilhar projetos e decisões e desenvolver uma política que compreenda o espaço da escola como um verdadeiro campo de ações pedagógicas e sociais, no qual as pessoas compartilham projetos comuns, cada um deles representando uma oportunidade real de desenvolvimento pessoal e profissional. A gestão na escola inclusiva tem um caráter colaborativo que implica no desenvolvimento de valores que mobilizam as pessoas a pensarem, viverem e organizarem o espaço da escola, incluindo nele todos os alunos.

Segundo Hines (2008), a atuação da direção é fundamental para o sucesso na transformação de uma escola para uma perspectiva inclusiva. A ação da direção é importante no sentido de guiar, estimular e facilitar a colaboração entre os professores do ensino comum e entre estes e os professores especializados, tendo o trabalho coletivo como tarefa incontornável por parte do contexto escolar.

De acordo com o autor, quatro princípios devem fundamentar o trabalho do diretor na perspectiva da construção de uma escola que inclui. O primeiro diz respeito à manutenção de uma comunicação aberta com o corpo docente da escola, bem como estimular e intermediar a comunicação livre e honesta. Dentro deste princípio, ele enxerga seis atividades que devem ser sugeridas aos professores: compartilhar experiências bem-sucedidas, agendar tempo para planejamento conjunto, registrar suas atividades, suas preocupações e o modo como conseguiram resolvê-las, visitar outras instituições que tenham experiência no processo de inclusão, coletar material de fontes diversas sobre a temática da inclusão e, finalmente, comemorar cada acerto, como forma de valorizar as pequenas conquistas.

O segundo princípio consiste em compartilhar a liderança e estimular a troca de conhecimento. Empoderar os professores, fazendo-os capazes de compartilhar suas experiências como professores especializados, de modo a estimular a união de forças e não a concorrência entre eles.

O terceiro princípio refere-se ao estabelecimento de metas viáveis e objetivos comuns. Neste ponto, o autor reforça a ideia de trabalho conjunto entre professores do ensino comum e aqueles do ensino especial, sugerindo atividades que podem ser divididas ao mesmo tempo em sala de aula por ambos. Por fim, o autor reforça a importância de trabalhar mediante uma sistemática de resolução de conflitos. O diretor deve esforçar-se para explorar de forma aprofundada as estratégias de resolução dos conflitos que surgirão.

Ouvir cada professor, estimular a comunicação entre eles, esclarecer pontos de divergência, deixando claro para cada um a fonte do problema e sugerindo que cheguem a um ponto em comum, deve ser parte indispensável do trabalho de uma gestão escolar inclusiva. O aspecto da comunicação e da colaboração também foi identificado por Penaforte (2009) como fundamental no processo de construção de uma escola inclusiva.

A gestão compartilhada aumenta as possibilidades dos atores escolares assumirem os projetos da escola como de todos, minimizando as dificuldades do contexto e aquelas enfrentadas pelos alunos, favorecendo as mudanças necessárias na gestão da sala de aula e, consequentemente, nas práticas pedagógicas. Isto significa transformar as práticas que temos hoje (na sua maioria pautadas no conceito de homogeneidade) em práticas que atentem para as especificidades dos alunos.

A gestão da sala de aula na escola das diferenças

A gestão da sala de aula corresponde à capacidade do professor para orquestrar a interação entre os alunos em situação de aprendizagem, organizando os espaços, os tempos e os agrupamentos pertinentes às suas propostas didáticas, constituindo-se ele mesmo em mediador entre os conteúdos escolares e aqueles trazidos pelos alunos. A escola que está atenta à questão das diferenças dispensa grande relevância ao ensino e à gestão da sala de aula, uma vez que a grande marca dessa escola é a valorização do papel social do aluno, qualquer que sejam suas características, pois tem como referência o princípio da contribuição.

Deste modo, a classe do ensino regular se constitui em um agrupamento no qual cada aluno deve colaborar com o processo de construção do conhecimento dentro de suas possibilidades. A valorização do papel social do aluno só é possível na medida em que ele é reconhecido por seus pares como uma pessoa que traz uma contribuição, mesmo que seja modesta, ao desenvolvimento de saberes, de saber-fazer e do saber ser coletivo.

A criança percebe-se como um indivíduo que contribui para o desenvolvimento de saberes e do saber-fazer coletivo e retira disso múltiplas vantagens. Entretanto, essa participação ativa do aluno com deficiência no contexto da sala regular só é possível se o professor perceber esse aluno como sujeito de aprendizagem e se conseguir organizar propostas didáticas que favoreçam essa participação.

A percepção de professores de classes regulares a respeito de como eles organizam o trabalho tendo em vista a presença de um aluno com deficiência foi investigada na Austrália por O’Donoghue e Chalmers (2000).

A pesquisa durou em torno de um ano letivo e teve como sujeitos 22 professores de escolas de ensino fundamental. Os resultados permitiram classificar os professores em três categorias:

1) os que realizavam adaptações seletivas com ênfase na organização da sala de aula,

2) os que realizavam o trabalho dando ênfase às metodologias (estratégias) de ensino e

3) aqueles que baseavam suas modificações tendo como foco os conteúdos curriculares. Tais categorias foram definidas a partir da forma como os professores elaboravam suas estratégias de manejo de sala de aula, tendo nela um aluno com deficiência.

De acordo com os autores, a adaptação das estratégias de sala de aula utilizadas pelos professores evoluiu nas seguintes etapas:

1) Diante da informação de que iriam receber alunos com deficiência em suas salas, os professores começavam a discutir as bases legais dessa inclusão e as possibilidades de recusar esses alunos. Uma certa resistência era observada.

2) O professor começava a considerar efetivamente o impacto desse processo na sua prática de sala de aula e no seu trabalho como um todo e começava a considerar alterações em sua atividade em sala para realização do trabalho.

3) Os professores definitivamente engajavam-se (ou não) no processo de inclusão de seus alunos. Nesta etapa, eles definem um ponto de vista e começam a racionalizar sua execução.

4) Os professores começam a identificar as práticas que deverão ser modificadas para acomodar o aluno incluído, desenvolvem essas práticas e reorganizam o trabalho de acordo com os resultados obtidos. E, por último, os professores fazem uma estimativa das mudanças realizadas em suas salas e dos resultados positivos do trabalho.

A pesquisa revela ainda que os professores consideram que o processo de inclusão modifica a vida escolar e a relação com os demais membros da sua escola. Figueiredo (2008) constatou que as professoras em contexto de inclusão atribuem transformações não somente na gestão da sala de aula, mas também em sua vida pessoal.

Essas mudanças não se fazem de modo similar, nem nas crenças dos professores quanto às próprias capacidades de efetuarem a mudança, nem nos aspectos de investimento dessa mudança. Alguns professores aderem rapidamente e demonstram confiança na possibilidade de desenvolverem uma pedagogia que contemple as diferenças de todos os alunos. Outros, ao contrário, resistem a essa ideia, e há aqueles que vão se apropriando pouco a pouco dessa concepção e, aos poucos, vão implementando pequenas mudanças no ensino e na gestão da classe.

Os aspectos de investimento das mudanças também se diferenciam. Alguns atentam rapidamente para a organização da classe e as formas de agrupamento de seus alunos, outros priorizam o desenvolvimento de atividades com diferentes propostas didáticas que favorecem as diferentes possibilidades de aprendizagem por parte dos alunos e há aqueles que começam a transformação pelo desenvolvimento da pedagogia de projetos.

A autonomia dos alunos se constitui no aspecto mais difícil a ser implementado pelos professores (Figueiredo, 2008B). Investigando o processo de mudança de práticas pedagógicas no contexto da inclusão escolar, Lustosa (2009) observou resultados semelhantes no processo de mudanças das professoras que fizeram parte de sua pesquisa.

Em uma escola que organiza as situações de aprendizagem considerando as diferenças dos alunos, o ensino e os apoios ao ensino se integram para orquestrar a aprendizagem, garantindo a participação efetiva dos alunos em todas as práticas educativas. Elas se embasam na implementação de um ensino que leve em conta as especificidades de cada sujeito e que faz apelo à cooperação entre os alunos em situação de aprendizagem.

O professor deve respeitar os diferentes ritmos de aprendizagem dos alunos, favorecendo a atividade conjunta entre alunos com e sem deficiência no momento da realização de projetos comuns. A colaboração estabelecida entre os professores, conforme já descrito anteriormente, é outro aspecto que deve ser ressaltado também na escola das diferenças.

Thousand e Villa (2006) realizaram um estudo no qual exploraram os benefícios do planejamento colaborativo e concluíram que, quando os professores trabalham em cooperação no seu planejamento e em suas atividades práticas de ensino, eles tornam-se mais capazes de suprir as necessidades específicas de seus alunos e podem cumprir melhor os objetivos propostos.

O estudo explicita os diferentes modos de colaborar e co-ensinar, inclusive tendo os estudantes como parceiros colaborativos. Os autores ilustram esses modos de colaboração com os seguintes exemplos:

  • Suporte natural do colega: quando um colega da mesma idade ou mais velho pode assumir a responsabilidade de apoiar a participação de um estudante com deficiência em atividades curriculares e atividades sociais. Por exemplo, os colegas podem tomar notas pelo amigo, facilitar a comunicação com os outros colegas conhecidos, ajudar na locomoção, dentre outras possibilidades.
  • Suporte consultivo: ocorre quando um ou vários adultos, muitas vezes um professor especializado, encontram-se regularmente com o professor de sala de aula para trocar informações sobre o progresso do estudante, avaliar a necessidade de adaptar ou complementar materiais e solucionarem problemas em conjunto.

Segundo os autores, é possível ainda que dois ou mais professores trabalhem colaborativamente com grupos diferentes de estudantes em diferentes situações. Essas ações, certamente, se constituem em estratégias eficientes para a gestão da sala de aula que contempla todos os alunos da turma, permitindo ao professor seguir a evolução do desenvolvimento das competências dos alunos.

Muitas outras formas de colaboração são possíveis de serem implementadas no contexto de uma classe que vive o princípio da colaboração em detrimento da competição e compreende o processo de construção do conhecimento como eminentemente cooperativo, com o qual todos podem contribuir, independentemente de limites ou dificuldades.

Incluir é mais que inserir, é interagir e contribuir

Para finalizar, podemos concluir que a inclusão se traduz pela capacidade da escola em dar respostas eficazes à diferença de aprendizagem dos alunos, considerando o desenvolvimento dos mesmos como prioritário. A prática da inclusão implica no reconhecimento das diferenças dos alunos e na concepção de que a aprendizagem é construída em cooperação a partir da atividade do sujeito diante das solicitações do meio, tendo o sujeito de conhecimento como um sujeito autônomo.

O professor pode ampliar as possibilidades de aprendizagem do aluno a partir de diferentes propostas didáticas, as quais ele pode organizar no desenvolvimento das práticas pedagógicas. Para isso, é importante refletir sobre os desafios do cotidiano escolar. Este novo olhar e esta nova forma de atuar ampliam as possibilidades de desenvolvimento profissional e pessoal do professor.

A educação brasileira enfrenta o desafio de, no desenvolvimento das práticas cotidianas, se transformar para ser capaz de garantir a acessibilidade e a permanência de todas as crianças, de modo que elas possam se apropriar dos bens culturais traduzidos como conhecimentos escolares.

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva 01/2008 propõe a mudança de valores, atitudes e práticas educacionais para atender a todos os estudantes, sem nenhum tipo de discriminação, assegurando qualidade na educação. É também um desafio do sistema público de ensino ampliar o tempo escolar das crianças.

O tempo escolar praticado atualmente (meio turno) é insuficiente para a formação (acadêmica, intelectual, moral, ética e estética) do alunado das nossas escolas. A escola brasileira já avançou muito no que se refere à acessibilidade das crianças. No entanto, a concretização da democratização e, consequentemente, a inclusão escolar só será concretizada quando os sistemas de ensino garantirem educação de qualidade.

Para que a nova política de inclusão se traduza em ações concretas no curso dos próximos anos, se faz necessário que o Brasil adote um conjunto de ações que fortaleçam a escola pública e, consequentemente, a ação pedagógica dos professores. O Brasil precisa enfrentar o desafio de promover as condições reais para o ensino, a aprendizagem e a educação de TODOS os alunos.

A educação de qualidade passa pela organização do sistema público de ensino, dos espaços escolares, da gestão da escola e da sala de aula. A escola cumprirá seu papel de agência de formação quando for capaz de EDUCAR todos os alunos e não apenas parte deles.

A concretização da política de inclusão já se torna perceptível quando as redes de ensino começam a se organizar para receber e oferecer as condições de aprendizagem a todo seu alunado. A escola que entendeu o princípio da inclusão sabe que precisa rever práticas pedagógicas, não porque agora tem a presença de um aluno com deficiência na sala de aula, mas porque compreendeu que não pode ignorar a diferença de seus alunos. Esta mudança terá efeitos profundos sobre a sociedade e sobre as dinâmicas das interações entre os cidadãos brasileiros.

Referências

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  • FIGUEIREDO, Eliene Vieira. Práticas de Leitura e de Escrita na Diversidade da Sala de Aula. Dissertação (Mestrado em Educação Brasileira). Universidade Federal do Ceará. Fortaleza, 2008.
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Autora :Rita Vieira de Figueiredo


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