Trabalho Infantil
A proteção da criança e do adolescente é, acima de tudo, uma questão de direitos humanos. Quando foi criada a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a grande novidade foi a universalização desses direitos, afirmando-se que todos os seres humanos têm direitos básicos iguais. Mas e as crianças e adolescentes? Hoje em dia parece claro que eles também têm esses direitos. Porém, se voltarmos ao início do Século XX, veremos que as crianças eram tratadas como adultos pequenos, com direitos inferiores. Eram mão-de-obra barata, abundante e descartável. Em 1959, com a declaração dos direitos da criança, esse quadro começou a mudar. Um dos direitos mais importantes desta declaração é o direito a uma infância feliz. Esta infância feliz é de alto interesse social. Está provado que uma criança que sofreu maus-tratos durante a formação de sua personalidade será, com grande probabilidade, um adulto violento. Nessa Declaração já constava o princípio de que deve haver uma idade mínima para o ingresso no trabalho.
Em 1989, foi editada pela ONU a Convenção sobre os Direitos da Criança, ratificada pela quase totalidade dos membros da ONU, excetuando apenas a Somália e os Estados Unidos da América. Também neste documento consta a exigência de uma idade mínima.
No âmbito da Organização Internacional do Trabalho, foram editadas as Convenções 138 e 182. A primeira estabelece a idade mínima de 15 anos para o trabalho e a segunda reconhece que existem formas de trabalho infantil que devem ser combatidas prioritariamente. O Brasil ratificou ambas as convenções.
A Constituição Brasileira, em acordo com a legislação internacional, fixa em 16 anos a idade mínima para o trabalho, permitindo que um jovem trabalhe como aprendiz a partir dos 14 anos. O nosso país tem levado a sério a proibição e o Governo Federal formulou um programa específico, denominado Programa de Erradicação ao Trabalho Infantil (PETI), implantado em grande parte dos municípios brasileiros. E na prevenção existe o programa Bolsa-Escola Federal.
Por outro lado, tomemos como exemplo duas das piores formas de trabalho infantil: a exploração sexual comercial e a exploração pelo narcotráfico. Quanto à primeira, já no governo Fernando Henrique, se criou o Projeto Sentinela, um programa de enfrentamento do problema concreto, embora tímido. No atual governo, anunciou-se que o tema terá prioridade.
Quanto à exploração de crianças e adolescentes pelo narcotráfico, o governo mal começou o debate. Quanto às crianças e adolescentes que já estão sendo exploradas, reconhecemos a dificuldade de implantação de projeto específico, apesar de não ser impossível. Porém, existem medidas imediatas de prevenção que já deveriam estar sendo buscadas, que passam pela criação de alternativas de geração de renda, de lazer, de esporte e de cultura. Mas, acima de tudo, é preciso que os jovens vejam exemplos de pessoas da sua comunidade que conseguiram melhorar de vida por meio do estudo e do trabalho digno.
Existe ainda uma outra forma de trabalho infantil que se enquadra entre as piores formas por prejudicar a saúde, a segurança ou a moral das crianças, que é o trabalho nas ruas. No Distrito Federal, o Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil sugeriu ao Governo local, em novembro de 2001, que promovesse o cadastramento das crianças que trabalham nas ruas para inscrição no PETI. Paralelamente, houve articulação com Prefeituras das cidades próximas e com o Governo Federal para que estas crianças e adolescentes pudessem efetivamente ser inscritas no programa. Contudo, até hoje não foi feito tal cadastramento, resultando na presença de crianças e adolescentes em cada sinal de trânsito do Distrito Federal, em cada bar da cidade, vendendo todo tipo de produto.
A sociedade tolera o trabalho infantil partindo da premissa de que o trabalho faz distanciar da vadiagem, da droga, da prostituição. É preciso criar, então, uma terceira alternativa: a da criança que frequenta a escola, que come pão com goiabada no recreio, que brinca de boneca e carrinho, que vai ter lembranças felizes do que é brincar, correr e se divertir. É urgente e indispensável que toda criança saiba disputar no “bafão” a figurinha premiada, a difícil do pacotinho, que vale a troca de bala de goma com o companheiro da calçada ou a corrida de rolimã.
Os exemplos de Lula, que perdeu o dedo como jovem torneiro mecânico e chegou à Presidência da República, ou de Marina Silva, que saiu dos cafundós das seringueiras para ser ministra de Estado, ou da menina empregada doméstica que transformou Benedita da Silva em outra ministra, são exceções à regra de que é preciso trabalhar jovem para vencer na vida. Na verdade, é o contrário: a criança que trabalha, que não é protegida, que não tem estimulado o seu desenvolvimento físico e mental, sem infância segura e afetuosa, não constitui um adulto sadio e produtivo e ainda tem sequelas emocionais e de acidentes de trabalho.
As causas do trabalho infantil, portanto, são múltiplas e complexas. Além disso, as relações entre educação e trabalho infantil também não são comuns. A solução do problema pede ações do Estado e da sociedade em várias frentes. A questão exige a mobilização da energia social, criatividade na concepção do marco legal e mecanismos eficazes para sua aplicação, além da elaboração e do desenvolvimento de programas eficientes de combate a esse fenômeno socialmente indesejável.
Autor: Alexandre Modesto Pacci
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