Espertos, hiperativos, agitados, diabinhos e pestinhas
Introdução
Espertos, hiperativos, agitados, diabinhos e pestinhas. Estes são alguns dos adjetivos usados para caracterizar crianças que parecem ter uma fonte quase infinita de energia. São crianças que parecem sempre estar em movimento, que não conseguem ficar paradas mesmo que outras pessoas exerçam uma força enorme nesta direção.
Nem mesmo os pais destas crianças conseguem fazê-las ficar quietas. São estes, ou seja, os pais que mais sofrem com o comportamento inquieto destas crianças, passando pelo maior estresse psicológico. De um lado, estão os professores, familiares e a sociedade cobrando um comportamento mais calmo e sereno dos seus filhos.
Do outro lado, está a criança que se mostra resistente a todos os tipos de tentativas de mudança de atitude. Como se esta situação já não fosse suficiente, muitas vezes os pais ainda têm que arcar com outros problemas, como os prejuízos por danos causados a terceiros pelos seus “anjinhos” em algum acidente ou a conta do ortopedista no caso deste dano ser feito contra eles próprios.
Embora o assunto tenha sido tratado de forma leve no parágrafo acima, esta monografia é sobre um dos assuntos mais sérios e controvertidos da área educacional: o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade, conforme denominado na quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV) da Associação Psiquiátrica Americana (APA). Para facilitar a leitura, utilizaremos a sigla “ADD” (do inglês Attention Deficit Disorder) para nos referir a este transtorno ao longo do texto.
Talvez o maior problema que ocorra em relação à ADD esteja no fato de que o conhecimento sobre este transtorno seja muito pequeno na população leiga e até mesmo nas áreas médica e psicológica. Muitas das pessoas com ADD passam a vida inteira sendo acusadas injustamente de serem mal-educadas, preguiçosas, loucas, desequilibradas, temperamentais, etc., quando na verdade são portadoras de uma síndrome que simplesmente as faz agir de maneira impulsiva, desatenta e, às vezes, até mesmo caótica.
O desconhecimento que existe sobre ADD tem um motivo: a demora para se reconhecer este transtorno como um problema neuropsicológico e a controvérsia sobre se realmente o ADD pode ser reconhecido como um transtorno por si só.
Neste trabalho, tentamos reunir todas as informações que conseguimos coletar sobre os diversos aspectos deste transtorno, esperando que possa haver uma melhor compreensão do que seja ADD e quais os recursos disponíveis para o seu tratamento, além de fornecer novas alternativas para a integração do indivíduo na sociedade.
Iremos começar por um histórico sobre a ADD, onde será contado o progresso da ciência na tentativa de compreender melhor este problema que acreditamos acompanhar a espécie humana desde o seu nascimento, mas que somente começou a ser entendido há menos de 20 anos.
Depois, iremos passar pelas características clínicas do ADD, mostrando como se manifesta, quais problemas causa, como o diagnóstico pode ser feito, quais as características da ADD quando interage com outros problemas, sua etiologia e o que sabemos sobre o transtorno até o momento.
Em seguida, iremos discutir os diversos tipos de tratamentos que existem e como estes devem ser feitos.
Iremos apresentar uma proposta para o ensino de crianças com ADD, defendendo a sua integração na escola normal, alertando sobre a necessidade de conhecimento por parte dos educadores e propondo atividades que poderão ajudar estas crianças.
Finalmente, iremos concluir tudo que foi dito no trabalho.
Esperamos que o leitor, ao ler este trabalho, tenha a sensação de estar descobrindo e aprendendo coisas novas e, com isso, possa ter suas opiniões e, mais do que isso, possa criar novas hipóteses e ter novas ideias para que o nosso conhecimento sobre ADD possa crescer ainda mais e, se tivermos sorte, diminuir o sofrimento daqueles que sofrem ou ainda irão sofrer com ADD.
Histórico
Embora problemas com comportamentos de agitação e falta de atenção em crianças e até adultos estejam longe de ser uma novidade, e trabalhos científicos sobre o assunto estejam sendo feitos desde o começo do século XX, como um trabalho feito pelo médico George Frederic Still em 1902.
Still descreveu um grupo de 20 crianças que se comportavam de maneira excessivamente emocional, desafiadora, passional e agressiva e que mostravam resistência a qualquer tipo de ação com o objetivo de tornar o comportamento delas mais aceitável. O grupo tinha uma proporção de 3 meninos para cada menina e era composto de crianças que não tinham indícios de maus-tratos pelos pais. Still especulou que, devido à ausência de maus-tratos, os problemas destas crianças deveriam ser de origem biológica. A hipótese ganhou mais força ainda quando Still notou que alguns membros das famílias das crianças eram portadores de problemas psiquiátricos como depressão, alcoolismo, problemas de conduta, etc. (HALLOWELL et al., 1994- p.271)
O simples fato de que Still propôs uma base biológica para o problema, embora a evidência definitiva ainda demorasse mais algumas décadas para chegar, já foi um grande passo. Antes disso, as crianças e os pais eram considerados responsáveis pela “falha moral” e o tratamento era frequentemente feito através do uso de castigos e punições físicas. Os manuais de pediatria da época eram repletos de explicações de como bater em crianças e afirmavam a necessidade deste tipo de tratamento.
As observações e deduções de Still influenciaram o “pai” da psicologia norte-americana, William James, que especulou que estes distúrbios de comportamento seriam devido a problemas na função inibitória do cérebro em relação a estímulos ou a algum problema no córtex cerebral, onde o intelecto acabava se dissociando da “vontade” ou conduta social.
Em 1934, Eugene Kahn e Louis H. Cohen publicaram um artigo no famoso “The New England Journal of Medicine” afirmando que havia uma base biológica para a hiperatividade, baseado em um estudo feito com pacientes vítimas da epidemia de encefalite de 1917-1918. Os autores deste artigo foram os primeiros a mostrar uma relação entre uma doença e os sintomas da ADD (falta de atenção, impulsividade e hiperatividade).
Em 1937, Charles Bradley mostrou mais uma linha de relação da ADD com o biológico através da descoberta acidental de que alguns estimulantes, as anfetaminas, ajudavam crianças hiperativas a se concentrar melhor. Esta descoberta foi contrária à lógica tradicional, pois os estimulantes em adultos produziam um aumento de atividade no sistema nervoso central, enquanto o inverso acontecia em crianças com ADD. O porquê deste fenômeno ainda iria ficar mais algumas décadas sem resposta.
Em pouco tempo, as pessoas com este problema receberam uma nova e obscura descrição: “Disfunção Cerebral Mínima” e começaram a ser tratadas com dois estimulantes que tinham se demonstrado muito eficazes no tratamento do problema (Ritalina e Cyclert).
Em 1957, Maurice Laufer tentou associar os problemas da “síndrome hipercinética” com o tálamo, estrutura cerebral responsável pela filtragem de sinais somáticos provenientes do resto do corpo. Embora esta hipótese não pudesse ser provada, era o começo da ligação entre a ADD e alguma estrutura cerebral.
Nos anos 60, as observações clínicas se tornaram mais apuradas e ficou cada vez mais aparente que a síndrome tinha alguma origem biológica e talvez até genética, absolvendo os pais da culpa pelo problema definitivamente na comunidade científica. A população em geral continuou culpando os pais, como ainda acontece até hoje em populações menos informadas.
No final dos anos 60, muito já era sabido sobre ADD, mas a falta de novas evidências ligando a síndrome a bases biológicas começou a criar discussões sobre a existência da síndrome. Muitos acreditavam que o transtorno era uma tentativa de livrar os pais de culpa por seus filhos mimados e mal comportados. Depois deste período de incerteza, novas descobertas começaram a ser feitas ligando os problemas associados com a ADD a certos tipos de neurotransmissores.
Em 1970, C. KORNETSKY propôs a hipótese de que a ADD poderia estar ligada a problemas com certos neurotransmissores como a dopamina e a norepinefrina. Embora a hipótese seja coerente, as pesquisas realizadas desde então na tentativa de comprovar o efeito destes neurotransmissores na ADD ainda não obtiveram sucesso. Embora não se saiba qual é o neurotransmissor específico ligado à ADD, muitos pesquisadores acreditam que o ADD é um problema de desequilíbrio químico no cérebro e estudos recentes, somados à aparente melhora obtida através da psicofarmacologia, parecem confirmar esta hipótese.
Nas décadas de 1980, vários autores como MATTES e GUALTIERI e CHELUNE (apud HALLOWELL et al.) especularam sobre o envolvimento dos lobos frontais no ADD, devido à semelhança de sintomas apresentadas por pacientes de ADD e aqueles que sofreram danos aos lobos frontais devido a acidentes ou outros problemas. Em 1984, LOU et al. (apud HALLOWELL et al.) acharam evidências de uma deficiência de circulação sanguínea nos lobos frontais e no hemisfério esquerdo de pessoas portadoras de ADD. Todos estes achados foram confirmados em 1990 por ZAMETKIN (apud HALLOWELL et al.) graças ao desenvolvimento de novas tecnologias como o PET (Tomografia por Emissão de Pósitrons), que mostravam o funcionamento do cérebro in vivo. Através de exames de PET comparativos entre pessoas diagnosticadas com ADD e controles, ZAMETKIN notou que os cérebros de pessoas com ADD tinham um consumo de energia cerca de 8% menor do que o normal e que as áreas mais afetadas eram os lobos pré-frontais e pré-motores, que são responsáveis pela regulação e controle do comportamento, dos impulsos e dos atos baseados nas informações recebidas de áreas mais primitivas do cérebro, como o tálamo e sistema límbico.
Conforme estas novas evidências começaram a surgir, ficou claro que a ADD estava realmente associada a alterações do metabolismo cerebral, acabando definitivamente com a dúvida sobre a real existência da síndrome e sua ligação biológica.
Características da ADD
Iremos tentar dar uma noção ao leitor sobre o que é a ADD, como se manifesta, como diagnosticar e o que sabemos sobre o problema atualmente.
Epidemiologia
O índice de crianças com ADD na população média dos Estados Unidos é de 3% a 5%; no Brasil, pesquisas semelhantes chegaram a valores entre 3 e 6%, enquanto na Grã-Bretanha este número é estimado entre 1 e 2%. Esta diferença leva alguns médicos europeus a criticarem seus colegas do Novo Mundo, dizendo que estes tendem a rotular crianças com ADD em quantidade muito maior do que realmente seria o correto. Até o presente momento, não se sabe se esta acusação é justificada, se a causa seria outra, como uma cultura mais aberta a este tipo de comportamento, ou ainda se o correto seria o contrário, ou seja, que os europeus estariam evitando dar diagnósticos corretos sobre o ADD.
Características Clínicas
A ADD é caracterizada por uma série de sintomas nem sempre claros e facilmente distinguíveis de outras patologias psiquiátricas (nos seus casos mais graves) ou da normalidade (nos casos mais leves). De uma forma geral, pessoas com este transtorno tendem a apresentar alguns problemas como:
- Dificuldade de atenção e concentração
- Problemas de aprendizado
- Distúrbios do comportamento
- Instabilidade e hiperatividade
- Distúrbios motores
- Retardos da fala
Dificuldade de atenção e concentração
Talvez o fator que mais caracteriza a ADD seja a falta de capacidade do indivíduo se concentrar e prestar atenção no que está sendo apresentado a ele, sem se distrair com qualquer outro estímulo. Aparentemente, a pessoa com ADD sente uma necessidade extrema de prestar atenção em estímulos novos e muitas vezes irrelevantes.
Pessoas com ADD passam a impressão de que nunca conseguem completar nenhuma tarefa iniciada, pois assim que começam uma nova empreitada, facilmente se distraem e passam a fazer outra coisa, e assim sucessivamente, deixando um rol de tarefas incompletas assim que vão passando de uma para outra. Estas pessoas também apresentam uma dificuldade de memorizar coisas e se lembrar de compromissos, encontros, onde deixaram certos objetos (como chaves).
Esta falta de atenção leva muitas vezes a problemas profissionais devido à falta de produtividade e também a problemas de relacionamento, pois a falta de atenção causa a impressão em outras pessoas de que elas são sem importância.
Problemas de aprendizado
O indivíduo com ADD costuma apresentar problemas com o aprendizado, seja através da dificuldade em prestar atenção e manter a concentração, como já foi mencionado, ou por outros problemas como a dislexia, disgrafia e discalculia, além de problemas sociais no ambiente escolar, por causa dos problemas de comportamento e isolamento social consequente.
Frequentemente, estas dificuldades acabam levando a pessoa a assumir uma atitude negativa perante o estudo e à escola, devido às dificuldades que encontra. A falta de compreensão do círculo social do indivíduo com ADD leva a uma condição onde a pessoa passa a ser acusada de preguiçosa, burra, etc., o que só piora ainda mais a situação, abrindo caminho para comportamentos patológicos e antissociais.
Muitas vezes, estes problemas podem ser compensados ou pela vontade do indivíduo ou pela atitude perante o problema das instituições de ensino. O indivíduo muitas vezes, até mesmo sem perceber, desenvolve técnicas para poder superar suas deficiências. Entre estas técnicas estão o uso de acessórios de estudo coloridos e chamativos para não dispersar a atenção com outros estímulos, uso de lembretes, chaves coloridas, etc.
Em relação às instituições de ensino, muitas delas estão desenvolvendo salas de aula especialmente planejadas para estes alunos e programas especiais para o reforço do estudo. As salas de aula para pessoas com ADD são projetadas de forma a ter o menor número possível de estímulos distrativos e os programas especiais tentam sanar as deficiências e dar suporte psicológico ao aluno com ADD.
Distúrbios de comportamento
Quando falamos de ADD, é muito difícil separar os problemas comportamentais primários dos secundários. O indivíduo com ADD tende a exibir um comportamento irrequieto que faz com que as pessoas à sua volta o tratem de uma forma diferenciada. Na maioria das vezes, esta diferenciação é negativa, se manifestando através da exclusão social do indivíduo por causa da sua inabilidade de se manter quieto, de praticar esportes ou a sua tendência de quebrar coisas.
Muitas vezes, os indivíduos com ADD têm a tendência de se sentir excluídos, pois o seu comportamento leva outras pessoas a chamá-los de preguiçosos, problemáticos, estranhos e até mesmo loucos. Este tipo de exclusão vai levar o indivíduo a desenvolver problemas psicológicos que podem seguir duas direções opostas, dependendo da estrutura pessoal do indivíduo: a introversão ou o comportamento antissocial.
A introversão ocorre quando o indivíduo resolve se submeter às regras que lhe são impostas, escondendo seu verdadeiro comportamento, se separando das relações sociais por se achar demasiadamente incompetente para tal coisa e muitas vezes acaba entrando em depressão por sentir que não é aceito pelo seu jeito de ser.
O comportamento exibicionista pode aparecer quando o indivíduo mostra sua ira através de agressividade. Este tipo de comportamento tende a ser o principal motivo pelo qual os pais acabam levando a criança para uma consulta com um especialista de saúde mental.
Não são raros também os casos de comportamentos antissociais ligados ao ADD, como vício em drogas (causado pela vontade de resolver o problema), alcoolismo, destrutividade, agressões sexuais, etc. Este tipo de comportamento tende a ocorrer quando o ADD não é diagnosticado e tratado a tempo, pois é uma forma do paciente expressar sua desesperança com seu problema, acreditando que nada pode ser feito para resolvê-lo. Embora não consigamos achar trabalhos sobre o assunto, não é difícil levantar uma hipótese de um número maior de suicídios entre pessoas com ADD do que em pessoas normais, tamanha é a dificuldade que estes pacientes encontram em se adaptar à vida social.
Distúrbios motores
Pessoas, especialmente crianças com ADD, apresentam distúrbios como a incoordenação e a hiperatividade.
A incoordenação se manifesta através de dificuldades ou atraso em atividades como andar de bicicleta, amarrar os sapatos e escrever (Allen, J. E. – 1977 p.249). Pode se manifestar também pelo jeito desajeitado que a criança mostra ao interagir com o mundo, ou “clumsiness”, como este comportamento é expresso na língua inglesa. Alguns autores fazem uma comparação deste comportamento afirmando que ele se aparenta àquele que supostamente seria exibido por um “King Kong”, tal é o modo grosseiro e desajeitado destes movimentos.
“Os objetos ao seu redor correm permanente perigo: as pontas dos lápis, os copos, os botões das camisas, as cadeiras que são colocadas à prova quando sobre elas se atiram para sentar, os brinquedos, o aparelho de TV, enfim, tudo que esteja ao seu alcance” (Lefevre, A.B – 1978-p.798).
A hiperatividade se apresenta através da dificuldade do indivíduo em controlar seus movimentos. O indivíduo é incapaz de ficar mais do que alguns segundos parado sem realizar um movimento inútil. Mesmo quando as condições exigem, ele não é capaz de ficar parado; quando, por exemplo, esta pessoa tem que ficar sentada, ela começa a apresentar movimentos nos membros. A hiperatividade se apresenta na grande maioria dos casos de ADD, embora, em alguns casos, este problema pode não estar presente, dando uma subdivisão de ADD sem hiperatividade que será estudada no item 3.1.
Estes distúrbios motores são um dos principais motivos de queixas de professores e pessoas em geral que lidam com o indivíduo com ADD. Um dado interessante é que os pais parecem se tornar acostumados com estes distúrbios nos seus filhos, pois dados levantados por Lefevre apontavam que, embora só uma pequena parcela dos pais se queixasse da hiperatividade dos seus filhos (cerca de 15%), os exames clínicos posteriores demonstraram que quase cerca de 65% das crianças estudadas apresentavam hiperatividade.
Retardos da fala
Os indivíduos com ADD apresentam, em alguns casos, retardos na fala que podem se apresentar em 3 tipos diferentes, por ordem de frequência: 1-Retardo da aquisição, 2-Dislalias, 3 – Distúrbios de ritmo.
Os retardos na aquisição se caracterizam pela diferença apresentada pela criança entre o que seria esperado dela em termos de produção verbal em relação ao seu desenvolvimento neuropsicológico e o que realmente ela consegue produzir. Os testes de desenvolvimento psicomotor são apropriados para medir esta diferença, já que a criança apresenta uma discrepância entre o setor da fala e os demais. Não são raros casos de crianças com ADD que chegam à idade de alfabetização com a fala ainda não totalmente desenvolvida.
As dislalias, ou seja, a troca de fonemas, também podem ser apresentadas por crianças com ADD em uma idade muito superior ao que normalmente seria esperado. É importante salientar que este problema deve ser corrigido o mais cedo possível, pois com o tempo a criança pode acabar incorporando a dislalia como parte da sua linguagem normal, tornando a correção do problema muito mais difícil.
Os distúrbios de ritmo se apresentam através do “clutter”, ou seja, a falta de separação nítida entre uma palavra e outra, tornando difícil a compreensão do que está sendo dito. Muitas vezes, este problema é confundido por leigos como sendo uma espécie de gagueira, mas é importante diferenciar o diagnóstico para evitar problemas e facilitar o tratamento do problema.
Diagnóstico
O diagnóstico de ADD pode se tornar traiçoeiro, especialmente para profissionais menos experientes, por isso recomendamos que os diagnósticos sejam feitos baseados nos seguintes critérios:
Histórico e anamnese detalhada
Devido às suas manifestações no comportamento da criança e na dificuldade de se associar ADD com algum sintoma ou problema físico, o histórico do problema e a observação do comportamento da criança por outras pessoas do seu meio social, como professores, babás, etc., são de vital importância para o diagnóstico do transtorno.
O histórico pode mostrar problemas com a atenção, dificuldade de aprendizado, problemas em se manter parado, etc. Podem também aparecer problemas relacionados à gravidez e ao parto, já que a incidência deste problema em pessoas com ADD é substancialmente maior do que na população normal. Também podem aparecer dificuldades na coordenação motora, problemas em tarefas como abotoar a roupa, amarrar os sapatos, dificuldade em movimentos alternados rápidos.
Assim como podem também aparecer déficits de linguagem, problemas com a fala e problemas psicológicos secundários como depressão, agressão, baixa autoestima, assim como sentimentos de rejeição. Embora não se saiba a explicação, pais de pacientes com ADD tendem a ter um índice de separação no casamento maior do que na população em geral.
No caso do psicólogo, uma vez descartados outros problemas físicos que podem apresentar semelhanças com ADD, o diagnóstico pode ser realizado através de testes psicológicos como WISC, já que crianças com ADD tendem a apresentar uma diferença grande entre os testes de atenção e memória em relação a outros testes, como de inteligência geral. A reprodução dos cubos é uma tarefa particularmente difícil. No desenho da figura humana, a sua performance é inferior ao que seria esperado por uma criança da sua idade, por causa de problemas de atenção, localização espacial, desenvolvimento motor, etc.
No teste gestáltico de Bender, as figuras apresentam rotação, as relações espaciais não são nitidamente copiadas e a discriminação figura-fundo é pobre (CHESS, 1982). É comum a criança com ADD ter uma inteligência normal ou até acima da média e mesmo assim apresentar déficit escolar e dificuldades sociais ou de adaptação.
Exames Eletroencefalográficos (EEG) podem mostrar alterações, já que 50% da população com ADD apresenta problemas nestes exames, enquanto só cerca de 10 a 15% da população normal apresenta problemas semelhantes.
Como meio de confirmação de diagnóstico, pode-se verificar a resposta do indivíduo a estimulantes.
Além dos problemas psicológicos já mencionados, o ADD também pode estar associado a outros problemas neurológicos e psicológicos como S. Gilles de La Tourette, epilepsia, Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), problemas com drogas, comportamentos de alto risco e personalidade limítrofe (borderline).
Dificuldades encontradas no diagnóstico de ADD e soluções
Muitas vezes, o diagnóstico da ADD é complicado pela dificuldade de diferenciação deste problema em relação a outros problemas físicos, psicológicos ou até à normalidade. Por este motivo, é essencial que o diagnóstico seja feito por uma equipe multidisciplinar composta de médicos, psicólogos, pedagogos, junto com um detalhado histórico da doença, como já foi afirmado acima.
Em algumas culturas e em alguns grupos humanos, pode existir uma pseudo-ADD, ou seja, comportamentos que se assemelham àqueles apresentados por pessoas com ADD, mas causados não por fatores biológicos, mas sim culturais, ambientais ou sociais. Por este motivo, acreditamos que é essencial que o profissional de saúde mental esteja informado e leve em consideração fatores exógenos em seu diagnóstico.
Todos estes problemas podem ser resolvidos ou atenuados através da qualificação dos profissionais envolvidos no processo. Sensibilidade, técnica, conhecimento teórico e experiência são indispensáveis para que o profissional tenha condições de realizar um diagnóstico correto de ADD, especialmente naqueles casos mais complexos, onde a linha divisória entre ADD e outros problemas ou a normalidade não é clara.
Subdivisões de ADD e interações com outros problemas
O ADD, devido à sua complexidade de sintomas, pode ser muitas vezes difícil de diagnosticar, como já falamos na parte sobre Diagnóstico deste texto. Muitas vezes, o ADD pode aparecer sem alguns dos seus sintomas característicos e, em outros casos, podemos encontrar outras síndromes neurológicas e psiquiátricas que podem ser facilmente confundidas com ADD, ou ainda apenas comportamentos culturais que podem confundir o diagnóstico.
Embora o DSM-IV só cite 3 tipos de ADD, Tipo Predominantemente Desatento (314.00), Tipo Predominantemente Hiperativos-Impulsivo (314.01) e Tipo Combinado (314.01), HALLOWELL et al. sugerem que na prática clínica outros tipos se manifestam e que é necessário que o especialista esteja atento a estes novos tipos de combinações entre ADD e outras condições para a realização correta deste diagnóstico. As classificações propostas por estes autores são:
- ADD sem hiperatividade
- ADD com ansiedade
- ADD com depressão
- ADD com outros problemas de aprendizado
- ADD com agitação ou mania
- ADD com drogadicção
- ADD em pessoas criativas
- ADD com comportamento de alto risco
- ADD com estados dissociativos
- ADD com características de personalidade limítrofe (borderline)
- ADD com distúrbios de conduta (em crianças) ou características antissociais (em adultos)
- ADD com Transtorno Obsessivo-Compulsivo
- Pseudo-ADD
ADD sem hiperatividade
Um dos enganos mais frequentes sobre ADD é que, se a criança não apresenta comportamento hiperativo, automaticamente a possibilidade de ADD está descartada. Isto é mais frequente ainda por causa do ADD ser conhecido pelo público leigo apenas como hiperatividade.
Esta concepção de que ADD é sempre acompanhada de hiperatividade não é verdade, pois existem casos, especialmente no sexo feminino, em que o ADD se manifesta através apenas da falta de atenção. São pessoas que têm uma característica sonhadora, que não são capazes de prestar atenção. Têm dificuldades em terminar tarefas já começadas e frequentemente são taxadas de preguiçosas, desorganizadas ou não motivadas injustamente.
ADD com ansiedade
Devido ao esquecimento frequente e dificuldade de organização, é natural que pessoas com ADD sintam uma certa ansiedade em saber se não estão se esquecendo de alguma coisa. Mas esta ansiedade natural pode acabar se tornando patológica. A pessoa com ADD pode começar a procurar algo para se preocupar durante o tempo todo. Passam a procurar sempre por alguma coisa que esqueceram, algum problema, etc.
ADD com depressão
Como consequência do ADD, as pessoas portadoras deste tipo de problema são frequentemente taxadas das mais diversas coisas e trazem consigo, muitas vezes, um histórico de muitas frustrações devido a esquecimentos, trabalhos não terminados, etc. Não é difícil de conceber que situações como esta possam levar logo à depressão.
Alguns pesquisadores acreditam que a depressão no ADD pode não ser apenas devido a fatores ambientais, mas sim devido a fatores fisiológicos combinados com o ADD, já que algumas das drogas usadas para tratar depressão são também eficazes para o tratamento de ADD.
Embora ainda não se saiba exatamente a causa da depressão no ADD, este fenômeno é de extrema importância no tratamento do problema, especialmente do ponto de vista do psicólogo, pois frequentemente este é chamado para tratar a depressão e tentar resolver problemas de ajustamento do paciente.
ADD com outros problemas de aprendizado
Conforme já foi mencionado anteriormente, o ADD pode vir acompanhado de outros problemas de aprendizado:
Dislexia – É uma perturbação constitucional, primária, geneticamente transmitida, dificuldade de adquirir a capacidade de leitura (Lefevre, 1982). A dislexia se manifesta por dificuldade em trocas de letras com formatos parecidos (d b, p q, b q, etc.) ou sons parecidos (d, t, f, m, n, etc.), deficiências de percepção visual e auditiva. Em alguns casos, os pacientes não conseguem entender o conteúdo do texto, mas tentam “adivinhar” este conteúdo na tentativa de negar o problema.
Disgrafia – Dificuldade de escrita, manifesta como uma dificuldade motora na execução da escrita. A criança não consegue realizar os traços necessários para escrever corretamente, muitas vezes as letras ficam ilegíveis e muitas professoras acusam o aluno de não ser caprichoso, gerando ainda mais problemas.
Discalculia – Problemas em realizar operações aritméticas e até a escrita de números, como foi demonstrado em um exemplo de Lefevre abaixo, quando foi pedido para a criança calcular 367 + 51, sua conta foi a seguinte:
30067
+ 51
----------
81067
Todos estes problemas levam à necessidade de cuidados especiais na educação da criança e de um preparo especial dos professores para que estes não acusem a criança de ter algum problema, baixando ainda mais a sua autoestima e causando problemas quanto à concepção que ela vai ter da escola. É necessário que estes professores compreendam antes de acusar.
ADD com agitação ou mania
Em alguns casos, o ADD pode se assemelhar ao distúrbio bipolar e o inverso também pode ocorrer no caso de um episódio de mania. A diferença está na intensidade da crise, já que os episódios de mania tendem a ser muito mais intensos que os de ADD.
No entanto, não é raro que pessoas com ADD, especialmente em casos onde existem comportamentos muito energéticos, sejam diagnosticadas com distúrbio bipolar. A mudança de diagnóstico normalmente vem quando o paciente não mostra resposta à terapêutica utilizada no transtorno bipolar, pois o lítio não só não causa efeito em pessoas com ADD, como pode, em certos casos, até piorar o problema e começa a mostrar melhoras quando Ritalina ou outro medicamento para ADD é dado.
ADD com drogadicção
Um dos problemas mais sérios associados ao ADD é o abuso de drogas. Este problema, quando encontrado por um profissional de saúde mental, deve ser estudado para se verificar qual é a real causa dele, já que cerca de 15% dos usuários de cocaína, por exemplo, relatam que o uso da droga não os deixa “altos”, mas sim os ajuda a concentrar e focalizar melhor a sua atenção.
São estes 15% que HALLOWELL et al. sugerem que devem possuir ADD e que buscam na cocaína uma saída para o seu problema. O álcool, a maconha e outras drogas também são usadas. Isto acontece por vários motivos, entre os principais estão a busca por uma forma de fugir do problema e suas consequências, especialmente quando parece não haver saída, e a automedicação, já que tanto a cocaína como a Ritalina são estimulantes e frequentemente o uso de cocaína causa um efeito positivo na capacidade de concentração e na diminuição dos problemas associados ao ADD.
Quando uma pessoa é diagnosticada com drogadicção associada e causada por um possível quadro de ADD, é necessário que os dois problemas sejam tratados juntos, pois o tratamento do ADD, quando este é a causa do vício, pode em muitos casos evitar que estes pacientes voltem a procurar a droga depois de obterem alta do tratamento.
ADD em pessoas criativas
Uma das características positivas em ADD é a capacidade criativa que normalmente está presente junto com o problema. Devido à sua capacidade de não conseguir manter as ideias em ordem, pessoas com ADD tendem a ser muito criativas e muitas vezes é em ramos onde a criatividade é importante que estas pessoas acabam encontrando um trabalho que conseguem fazer bem.
Uma das características curiosas do ADD é que, algumas vezes, quando os pacientes encontram o ambiente e a tarefa certos para estimulá-los, eles podem acabar demonstrando uma característica contrária àquela normalmente associada ao ADD, ou seja, ao invés da desatenção, podem demonstrar uma concentração e uma dedicação bastante intensa.
Além da medicação, o uso de pessoas com ADD em áreas criativas, como em Publicidade, Artes, Design, Projetos, etc., pode ser uma forma de conseguir integrar estes pacientes ao meio social.
ADD com comportamentos de alto risco
A incapacidade de se manter estável e a necessidade de busca por novas emoções podem levar uma pessoa com ADD, especialmente na adolescência e vida adulta, a demonstrar comportamentos de alto risco. HALLOWELL et al. sugerem uma lista de comportamentos que podem indicar ADD em adultos:
Qualquer comportamento de alto risco em níveis crônicos
Tipo “A” de personalidade, ou seja, pessoas com uma forma de vida intensa, propensas a atividades estressantes e com um modo de vida onde a agitação e a necessidade por novas emoções estão sempre presentes.
- Personalidade com a constante busca de fortes emoções
- Comportamentos ligados a vícios
- Temperamento explosivo
- Vício em exercícios
- Impaciência
- Jogatina
- Comportamentos violentos
- Tendência a sofrer acidentes
- Histórico de vários relacionamentos amorosos extraconjugais e de alto risco
- Comportamento pródigo
- Outros problemas de controle de impulsos, como cleptomania e piromania
Ainda não se sabe como comportamentos de alto risco são tão atrativos para pessoas com ADD, mas estes comportamentos são de importância para o profissional de saúde mental, pois não só prejudicam e põem em risco a vida do indivíduo, como também o tratamento destes problemas com terapia, sem a resolução do problema biológico causador destes comportamentos, acaba se tornando inútil.
ADD com estados dissociativos
Uma das principais características de ADD é a falta de atenção. No entanto, muitas vezes é difícil ter certeza de que o ADD é mesmo a causa deste tipo de comportamento, pois outros problemas também apresentam a distração como sintomas. Só para exemplificar, poderíamos citar a lista abaixo:
- ADD
- Depressão
- Estados ansiosos
- Uso de drogas ou abstinência
- Estresse
- Cafeinismo
- Falta de sono, fadiga
- Transtornos dissociativos
Os estados dissociativos fazem com que a pessoa corte os vínculos com um episódio traumático que aconteceu com ela para evitar o sofrimento e a dor psicológica relacionadas com a lembrança de tal evento.
Para o diagnóstico diferencial entre a ADD e estados dissociativos, o histórico completo e detalhado do paciente é fundamental. É necessário saber se o paciente não passou por nenhum trauma, já que muitas vezes estados dissociativos ligados a traumas podem se assemelhar à distração do ADD. Outra saída para se tentar decidir por um ou outro diagnóstico é a busca por sintomas de ADD no histórico desta pessoa, pois mesmo que a pessoa não tenha sido diagnosticada com ADD, ao contrário do que ocorre nos estados dissociativos, ela se lembra do que ocorreu com ela, só não sabendo que existe uma causa para os problemas dela.
ADD com personalidade limítrofe (borderline)
Pessoas com personalidade limítrofe costumam apresentar uma série de sintomas muito parecidos com o ADD e vice-versa. Estes sintomas podem ser a instabilidade de humor, impulsividade, uso de drogas, problemas de relacionamentos, problemas de performance em tarefas que lhes são dadas, etc. Infelizmente, ainda não temos condições de delimitar claramente quais são as diferenças entre estes dois problemas. Por este motivo, se torna importante que os profissionais estejam atentos quando diagnosticarem uma pessoa com personalidade limítrofe, verificarem se existem características típicas do ADD, de forma a evitar enganos.
ADD com problemas de conduta (crianças) ou personalidade antissocial (adultos)
Os problemas de conduta são comportamentos que ocorrem em algumas crianças, caracterizados por comportamentos agressivos, dificuldade de convivência com regras e sociedade. Embora já haja evidências de uma genética deste problema, é importante lembrar que crianças com este problema normalmente apresentam uma história comum, procedendo de famílias com sérios problemas, como pais ausentes, abusivos, uso de drogas, pobreza, falta de educação, comida, etc.
Estes comportamentos podem ser facilmente confundidos com a hiperatividade presente no ADD, e frequentemente isso acaba acontecendo. É importante que os profissionais estejam atentos a pequenas diferenças existentes entre os dois problemas. Uma criança com ADD, quando tem um problema, pode ficar frustrada, porém uma criança com problemas de conduta procura imediatamente alguém para culpar pelo seu problema. As explosões emocionais de crianças com ADD tendem a ser impulsivas e espontâneas, enquanto as de uma criança com problemas de conduta tendem a ser planejadas, esperando por algum ataque ou insulto externo para acontecer. Além disso, crianças com distúrbio de conduta não apresentam os problemas de atenção e concentração das crianças com ADD.
No caso dos adultos, muitos casos de personalidade antissocial são, na verdade, casos de ADD mal diagnosticado. Assim como já foi enfatizado durante todo este texto, torna-se importante mais uma vez consultar o histórico da doença para verificar se existem sintomas típicos de ADD associados ao histórico do indivíduo, para não se cometer erros e mandar casos perfeitamente tratáveis para prisões ou hospitais psiquiátricos.
Aspectos psiquiátricos de ADD no Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC)
O Transtorno Obsessivo Compulsivo, caracterizado pela repetição de rituais, comportamento repetitivo, pensamento repetitivo e outros sintomas, pode estar conjugado com o ADD. Ambos os problemas têm origem biológica e, no caso de ambos estarem presentes na mesma pessoa, o transtorno que se manifestar da forma mais grave tende a encobrir o que se manifesta de forma mais leve, então é importante estar atento para os sintomas de ambos os problemas quando se trata uma pessoa com ADD.
Pseudo-ADD
Muitas vezes, comportamentos influenciados pela cultura de um determinado povo ou de um grupo podem ser confundidos com aqueles apresentados por pessoas com ADD. Um ambiente que exerce muita pressão sobre um sujeito pode muitas vezes induzir comportamentos como falta de atenção, hiperatividade, incapacidade de concluir tarefas já começadas, etc.
Cuidados devem ser tomados para não diagnosticar todo executivo atarefado como tendo ADD. É necessário lembrar que o ADD é um problema que aparece desde a primeira infância e que muitas vezes todos nós acabamos apresentando sintomas de ADD de vez em quando, especialmente em situações de estresse ou de agitação por algum evento.
Causas
Embora o conhecimento sobre as causas do ADD ainda seja muito limitado e grande parte dele seja especulativo, algumas descobertas recentes ajudaram os pesquisadores a levantar algumas hipóteses para o surgimento do ADD. As hipóteses mais estudadas são: genética e traumatismos e problemas intrauterinos.
Genética
Devido à grande probabilidade de uma pessoa com ADD ser proveniente de uma família com um histórico de problemas psiquiátricos e neurológicos, como o próprio ADD, alcoolismo, Gilles de la Tourette, dislexia, etc. Somado ao fato de que hoje muitos acreditam que a causa esteja ligada à falta de certos componentes necessários para o uso correto de alguns neurotransmissores, e levando em conta a diferença existente na proporção da incidência relacionada ao sexo.
Tudo isso leva os pesquisadores a considerar fatores genéticos como sendo a causa do ADD. Por esta hipótese, o ADD não seria causado por um gene particular, mas sim por uma união entre vários genes. Exatamente quais genes estão envolvidos no processo e como estes genes levam ao ADD ainda não foi descoberto, embora a velocidade das pesquisas em biologia molecular indique que não haverá muita demora para que estas questões sejam respondidas.
Traumatismos neonatais e problemas intrauterinos
Embora a hipótese genética possa fornecer algumas respostas sobre a causa do ADD, é sabido que a ocorrência de ADD está muitas vezes correlacionada a problemas durante a gravidez e no parto, inclusive com relatos de traumatismos neonatais. Este fato levanta a dúvida se realmente haveria apenas uma causa para a ADD, pois aparentemente não deveria haver uma relação entre a genética do ADD e estes problemas.
Alguns autores propõem que o ADD, na verdade, poderia ser devido a causas multifatoriais, onde a genética e o ambiente colaborariam para a gênese do problema.
Outros fatores
Assim como sempre acontece quando a ciência não consegue dar uma resposta imediata para a causa de um problema, no caso do ADD já surgiram inúmeras hipóteses e teorias de procedência duvidosa e de difícil comprovação. Citaremos algumas como informação ao leitor:
Alimentação
Algumas pesquisas tentaram ligar o ADD com o consumo de alguns alimentos, porém até o presente momento o mecanismo pelo qual estes alimentos prejudicariam ou causariam o ADD não foi demonstrado e, consequentemente, nada foi provado.
Produtos químicos
Especulações sobre a influência de alguns produtos químicos normalmente utilizados no ambiente doméstico foram levantadas. Esta hipótese sugeria que produtos como desinfetantes, ceras, removedores, detergentes, etc. poderiam causar danos aos fetos. O fato apresentado a favor desta teoria é que houve um aumento nos casos de ADD nas últimas décadas, coincidindo com o aumento do uso destes produtos no ambiente doméstico. Além de não haver bases teóricas sobre como estes produtos poderiam causar ADD, a explicação para o aumento de casos tem muito mais possibilidade de ser devido ao avanço da Psicologia e Medicina, que possibilitaram um diagnóstico mais preciso do problema do que de outros fatores.
Explicações místicas e de difícil comprovação
Além das hipóteses levantadas até agora sobre ADD, existem pessoas que acreditam que problemas como o ADD são causados por possessões demoníacas, abduções por extraterrestres, problemas espirituais, etc. Embora nenhuma destas hipóteses tenha o mínimo de fundamento científico, achamos importante que o profissional de saúde mental esteja preparado para lidar com as expectativas do paciente e dos pais destes, quando se tratar de uma criança, para o diagnóstico baseado em causas místicas.
Mecanismos biológicos do ADD
Embora ainda não se saiba exatamente quais são os mecanismos biológicos do ADD, algumas hipóteses estão sendo estudadas e algumas partes anatômicas do cérebro já estão sendo relacionadas com o ADD.
Uma destas áreas é o tálamo. Pelo nosso presente conhecimento de Neurociências, o tálamo parece ser uma espécie de filtro dos estímulos vindos de todo o sistema nervoso periférico. Seria o tálamo que escolheria quais estímulos deveriam prosseguir até o córtex cerebral para serem processados e quais estímulos deveriam ser inibidos por interferirem com a atividade cortical que estaria ocorrendo naquele momento.
Para facilitar o entendimento, vamos dar um exemplo de uma pessoa dirigindo um carro em uma estrada. A principal atividade do cérebro naquele momento é prestar atenção na condução do carro e na estrada. Ao mesmo tempo que está dirigindo, o sistema nervoso periférico do motorista está mandando uma grande quantidade de informações e estímulos para ele (temperatura do ambiente, sons do rádio, sede, fome, visão, etc.). A função do tálamo seria filtrar os estímulos de forma que só os estímulos relevantes para a tarefa de dirigir passassem para o córtex, que neste caso seriam a visão, as sensações táteis das mãos, pés e talvez algum som. Este é o mecanismo que nós chamamos de atenção e que, segundo alguns autores, existe para evitar que o nosso cérebro não fique sobrecarregado pelos estímulos recebidos do nosso corpo.
Outra área que parece estar envolvida com o ADD é o lobo frontal do cérebro. É nesta área que a maioria dos nossos pensamentos ocorre e é o lobo frontal também que origina os impulsos que vão dar origem aos movimentos. É nesta área que também funciona um controle sobre quais movimentos devem ser feitos e quais devem ser evitados; este processo é chamado de atividade inibitória. Por exemplo:
“Ao pegar uma assadeira quente no forno, a reação natural do nosso sistema motor é deixá-la cair para evitar queimar nossas mãos. Nós podemos evitar este reflexo através do nosso lobo frontal, que pode emitir sinais inibindo o reflexo de largar a assadeira até que possamos colocá-la em um local onde o nosso reflexo de soltá-la não cause um pequeno desastre doméstico.”
Pelo nosso atual conhecimento de ADD e de funcionamento cerebral, o ADD aparentemente é causado por uma deficiência no sistema cerebral, em especial nos sistemas relacionados a um neurotransmissor chamado dopamina, que, entre outras coisas, está também envolvida no Mal de Parkinson. A deficiência neste sistema aparentemente faz com que o tálamo não consiga desempenhar sua tarefa de filtragem de estímulos muito bem, levando à falta de atenção e à fácil distração do ADD. Este problema também parece causar problemas no lobo frontal, onde a atividade inibitória dos impulsos motores parece também ser afetada, levando, segundo alguns autores, à hiperatividade.
Acredita-se que estimulantes como o metilfenidato, utilizados em pessoas com ADD, fazem com que o tálamo e a atividade inibitória motora possam compensar os efeitos dos problemas causados pela ADD, voltando a funcionar normalmente.
Tratamento
Tratamento psicofarmacológico
O tratamento psicofarmacológico de ADD é feito com o uso de estimulantes como a dextroanfetamina (Dexedrina) e do metilfenidato (Ritalina). Os mecanismos de ação destas substâncias ainda são desconhecidos, mas alguns autores acreditam que elas funcionam porque pessoas com ADD têm uma subestimulação do sistema nervoso central. Outros acham que o efeito destes estimulantes é devido a alteração nos mecanismos dos neurotransmissores, como serotonina, dopamina ou norepinefrina, o que coincide com algumas hipóteses sobre as causas do ADD, conforme já foi relatado neste texto.
“A dose inicial é de 2,5 a 5 mg diárias de dextroanfetamina e de 5 a 10 mg para o metilfenidato. A dose é aumentada até que se consiga o efeito desejado ou até que efeitos colaterais apareçam.” (CHESS et al. 1982)
Estas drogas não devem ser dadas após as 15 ou 16 horas, pois, por serem estimulantes, podem causar problemas de sono (insônia) e devem ser suspensas em finais de semana e feriados para evitar problemas de tolerância às drogas.
Algumas crianças podem responder ao metilfenidato melhor que à dextroanfetamina e vice-versa. A duração do tratamento não pode ser medida e a dose diária varia de 5 a 40 mg de Dexedrina ou 5 a 80 mg de metilfenidato. Os efeitos colaterais podem ser um aumento da atividade, anorexia, cefaleia, dor abdominal, irritabilidade, depressão, choro excessivo e agravamento dos sintomas anteriores. Não há indícios de que nenhuma destas drogas cause dependência (CHESS et al. 1982).
Nos EUA, houve recentemente um movimento que denunciou a suposta pressão de pais de crianças normais sobre profissionais de saúde mental, de forma que estes receitassem metilfenidato (Ritalina) para seus filhos. A acusação era de que estes pais, com o auxílio de seus psiquiatras, estariam usando o metilfenidato como uma “babá química”, acalmando as crianças enquanto eles se ocupavam de outras tarefas.
O debate ainda continua se o uso de metilfenidato é adequado ou exagerado, mas os seus efeitos em ADD são incontestáveis, com pacientes apresentando melhoras em cerca de 90% dos casos e voltando a apresentar sintomas de ADD assim que a medicação é cortada.
Psicoterapia
Além do tratamento farmacológico, é essencial que o ADD seja tratado também com psicoterapia. Isto deve ser feito porque, ao longo de sua vida, especialmente antes de se ter feito o diagnóstico de ADD, as pessoas com este problema sofrem muito devido aos problemas causados pelo ADD. Não são raros casos de crianças que se sentem isoladas, são excluídas pelos colegas, são taxadas de burras ou incompetentes por pais e professores, são acusadas de serem mal-educadas ou endiabradas por todos à sua volta.
Também não são raros casos de adolescentes e adultos que entram em depressão por não conseguirem dar conta do que a sociedade exige deles, por esquecerem de coisas importantes, por serem incapazes de terminar as tarefas já iniciadas e por terem dificuldades em manter relacionamentos com outras pessoas. Todos estes casos acabam levando a uma sensação de desespero, ansiedade e depressão, que pode levar a pessoa às drogas ou até ao suicídio em casos mais graves.
Quanto mais tempo o ADD permanecer sem diagnóstico, maior será o sofrimento do paciente e maior será a necessidade de tratamento psicoterápico. Enquanto uma criança diagnosticada ainda na idade pré-escolar pode nem sentir os efeitos psicológicos negativos da ADD, um adulto já nos seus 30 ou 40 anos pode já ter sofrido tanto com os problemas sociais da ADD que a sua recuperação pode ser muito difícil, especialmente se este já chegou a apresentar outros problemas, como o uso de drogas ou comportamentos antissociais.
Tipos de terapias indicadas
Devido ao problema de concentração apresentado por pessoas com ADD, devemos ter alguns cuidados ao escolher a linha de terapia que será utilizada no seu tratamento. Linhas de terapias excessivamente abertas, como a Psicanálise e Rogeriana, podem parecer para o paciente de ADD como um inferno de Dante, já que estes pacientes têm muita dificuldade de conseguir organizar seus pensamentos e frequentemente, quando são submetidos a estes tipos de terapias, o resultado é quase sempre uma desistência do paciente ou um ataque de nervos do terapeuta, que não irá conseguir extrair nenhum sentido das emissões desorganizadas e conectadas de forma ininteligível pela mente caótica do paciente.
Eventualmente, até as linhas terapêuticas mais diretivas poderão parecer excessivamente abertas para um paciente com ADD e o terapeuta poderá se sentir obrigado a sair da sua posição normal e começar a direcionar a sessão de formas que seriam consideradas intrusivas em pacientes normais. O terapeuta deverá também ter conhecimento sobre ADD para poder conduzir a terapia de maneira que o paciente se sinta confortável e seguro. O vínculo de confiança também é muito importante, porque em alguns casos o terapeuta acaba se tornando a única esperança que uma pessoa com ADD tem de ser compreendida e a última ponte de ligação com a sociedade.
Principais queixas psicológicas de crianças com ADD
No caso de crianças com ADD, os principais problemas encontrados são o isolamento dos colegas, que muitas vezes discriminam a criança com ADD, a depressão e a baixa autoestima por causa da dificuldade de agradar aos pais e aos professores, aversão à escola e comportamento agressivo.
Uma vez realizado o tratamento do problema biológico com remédios, estes problemas psicológicos devem ser resolvidos em uma ação conjunta entre o terapeuta, os pais, a família, a escola e os colegas da criança. Com o consentimento da criança, todos que se relacionam com ela devem ser avisados do problema, de suas consequências, do tratamento médico e de quais atitudes devem ser tomadas por eles para integrar a criança da melhor maneira possível.
Todos sabemos que a informação é o melhor remédio contra o preconceito e é nesta base que devemos tratar o problema de adaptação social. É função dos profissionais envolvidos com a criança informarem, avisarem e divulgarem a maior quantidade de informações possíveis, especialmente para o público em geral sobre o ADD. Isto não só ajudará as pessoas já diagnosticadas com o problema, como também ajudará os eventuais casos não diagnosticados ou diagnosticados incorretamente.
Brinquedos e materiais que podem ajudar no desenvolvimento de crianças com ADD são recursos que podem ser utilizados para facilitar o aprendizado e a interação social.
Fernando Lage Bastos
VÍDEO
https://www.youtube.com/watch?v=bqY-O7d3d3k
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