Inclusão Escolar de Crianças com Síndrome de Down
1. INTRODUÇÃO
O tema inclusão tem levantado inúmeros debates sobre vantagens e desvantagens, evidenciando posições polêmicas e controversas entre os educadores e especialistas. Há quem defenda a inclusão de todos os alunos em classes comuns, inclusive de alunos com algum tipo de deficiência, eliminando assim serviços de apoio e recursos auxiliares. Outros se posicionam e veem a inclusão como inviável e utópica em nossa realidade educacional.
Constatamos, porém, que a preocupação na nossa política educacional é que haja “educação para todos”, e que preferencialmente ela aconteça em classes comuns de ensino regular, evidenciada em leis e normas já aprovadas.
Segundo Voivodic (2004) apud Mazzotta, pelo menos com o advento da Constituição Federal de 1988, da Lei 7583/89, da Constituição Mundial sobre Necessidades Básicas de Aprendizagem, aprovada em Jomtien/Tailândia em 1990 e do Plano Decenal de Educação para todos (1993/2003), têm sido registradas intenções e determinações sobre a importância e a necessidade de uma escola para todos ou escola inclusiva. Mais recentemente, o autor ressalta a Política Nacional de Educação Especial – MEC 1993, a Lei 9394/96, que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB e o Decreto 3298/99 que regulamenta a Lei 7853/89.
Porém, estas intenções e prerrogativas não têm sido acompanhadas de ações efetivas que as tornem realidade. Apesar das garantias legais, constatamos pelos dados do Censo Escolar de 2006, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), que a maior parte dos alunos com alguma deficiência ainda está em salas especiais, e pouco mais de 50.000 alunos no estado do Rio Grande do Sul estão matriculados e/ou frequentam classes especiais.
O discurso sobre inclusão ou integração permanece ainda no campo das ideias. Para viabilizarmos em nosso atual sistema de ensino, necessitamos ainda de muitos estudos e pesquisas.
Mendes (1999) nos afirma que, apesar da posição favorável à escola inclusiva, que pode ser observada nos documentos legais, parece não haver consenso sobre as implicações pedagógicas e escolares implícitas no princípio da inclusão. Ela mesma nos diz que:
“As propostas não garantem competência à escola para ensinar alunos com necessidades educativas especiais. Elas até podem favorecer a inserção desses alunos nas classes regulares, mas não garantem que eles irão permanecer, ou que irão aprender o que lá será ensinado, e muito menos que terão equiparadas suas oportunidades de desenvolver todas as suas necessidades” (Mendes, 1999:14).
Entendemos que, se a educação é importante como fator de transformação para todos os indivíduos, uma educação de qualidade que atenda suas necessidades educativas especiais torna-se fundamental para os indivíduos com deficiência mental, pois eles configuram uma condição intelectual analógica a uma construção inacabada, tendo uma lentidão significativa no processo intelectual. Não se pode continuar a defender que tem de ser a criança a se adaptar às exigências escolares, mas sim o contrário, ou seja, a escola é que deve se adaptar às condições das crianças.
O sistema de ensino não pode continuar a excluir a totalidade das crianças com deficiência, “… estigmatizando-as com a desgraça, rotulando-as com uma doença incurável ou marcando-as com o sinal de inferioridade permanente” (Martins, apud Fonseca, 1987, p.86). Já se reconhece que não existe criança ineducável.
2. A INCLUSÃO DO ALUNO COM DEFICIÊNCIA
Seria ingênuo pensar que só a integração escolar produzirá, automaticamente, a total integração social dos portadores de deficiência, pois os mecanismos segregacionistas estão de tal forma sedimentados em nossa sociedade que demorará muito tempo para serem, pelo menos, minimizados. Apesar da base da integração ser o princípio de normalização, a mesma não é específica da vida escolar, contudo atinge o conjunto de manifestações e atividades humanas e todas as etapas da vida das pessoas, sejam elas afetadas ou não por uma incapacidade, dificuldade ou inadaptação. Temos que reconhecer que os primeiros passos já estão sendo dados e que a sociedade já está mais esclarecida.
Desta forma, a integração escolar é uma forma condicional de inserção que vai depender do aluno, ou seja, do nível de sua capacidade de adaptação às opções do sistema escolar, a sua integração, seja em uma sala regular, uma classe especial, ou mesmo em instituições especializadas. Trata-se de uma alternativa em que tudo se mantém, nada se questiona do esquema em vigor.
De acordo com Mantoan (2001), outra opção de inserção da criança portadora de algum tipo de deficiência é a inclusão, que questiona não somente as políticas e a organização da educação especial e regular, mas também o próprio conceito de integração. O termo inclusão tem sido utilizado com múltiplos significados. As opiniões se dividem; de um lado encontramos os que acham que a inclusão se daria com o fato de colocarmos todos os alunos, independente do grau e tipo de incapacidade, na classe regular. A noção de inclusão não é incompatível com a de integração, porém institui a inserção de uma forma mais radical, completa e sistemática. Algumas vezes o termo inclusão parece ser utilizado apenas para renomear integração, considerando que o melhor é a colocação do aluno com deficiência na classe regular, desde que se enquadre aos pré-requisitos da classe.
Seria a inclusão apenas uma integração com ares de modernidade? O conceito de inclusão se refere à vida social e educativa e todos os alunos devem ser incluídos em escolas regulares e não somente integrados.
A meta primordial da inclusão é a de não deixar ninguém excluído do ensino regular, desde a pré-escola. As escolas inclusivas propõem um modo de se constituir o sistema educacional que considera as necessidades de todos os alunos e que é estruturado em função dessas necessidades. A inclusão causa uma mudança de perspectiva educacional, pois não se limita a ajudar somente os alunos que apresentam dificuldades na escola; a inclusão apoia a todos: alunos, familiares, professores e todo o pessoal administrativo da escola, para que se obtenha sucesso na ação educativa geral.
Mantoan (2001) cita em seu texto uma metáfora belíssima sobre inclusão. A metáfora da inclusão comparada à de um caleidoscópio. Esta imagem foi muito bem descrita no que segue:
“O caleidoscópio precisa de todos os pedaços que o compõem. Quando se retira pedaços dele, o desenho se torna menos complexo, menos rico. As crianças se desenvolvem, aprendem e evoluem melhor em um ambiente rico e variado” (Forest et Lusthaus, 1987: 6).
A inclusão institui a inserção de uma forma mais radical, completa e sistemática, uma vez que o objetivo é incluir um aluno ou grupo de alunos que não foram anteriormente excluídos. A meta da inclusão é desde o início não deixar ninguém fora do sistema escolar. A inclusão sugere que a escola é que terá de se adaptar às particularidades de todos os alunos para concretizar a sua metáfora – o caleidoscópio.
3. A INCLUSÃO DA CRIANÇA COM SÍNDROME DE DOWN
É importante deixar claro que a síndrome de Down não é uma doença e ninguém pode falar, portanto, que a criança vai sarar com tratamentos específicos. A Síndrome de Down é uma condição de vida do indivíduo, um estado biológico alterado, em decorrência de anormalidades cromossômicas. Assim, quem porta essa alteração sempre terá essa síndrome (MARTINS, 2002).
Até algumas décadas atrás, era inadmissível pensar que crianças portadoras da SD pudessem chegar a se escolarizar. Incluídas na categoria da deficiência mental, a maioria das crianças com SD “… eram classificadas como ineducáveis, e os professores e educadores ignoravam em grande parte o campo da deficiência intelectual” (Cunningham, op. Cit., p. 156 in Martins).
Segundo Voivodic (2004) apud Melero, para favorecer a educação da criança com Síndrome de Down, é importante o trabalho com os processos cognitivos: percepção, atenção, memória e organização de itinerários mentais. Para Martins (2002), a educação da criança com SD, portanto, abrange desde a estimulação essencial, passando pela educação ministrada na escola, até chegar ao treinamento profissionalizante, visando à sua inserção num trabalho produtivo, dentro de um ambiente o menos restritivo possível.
É evidente que, devido à deficiência mental presente na Síndrome de Down, a educação dessas crianças é um processo complexo e requer adaptações e, muitas vezes, o uso de recursos especiais. Normalmente, a criança que apresenta Síndrome de Down inicia uma trajetória de estimulação precoce no setor de fisioterapia. O portador da SD é capaz de compreender suas limitações e conviver com suas dificuldades; a maioria deles tem autonomia para tomar iniciativas, não precisando que os pais digam a todo o momento o que deve ser feito. Isso demonstra a necessidade e a possibilidade desses indivíduos de participar e interferir com certa autonomia em um mundo onde normal e deficiente são semelhantes em suas inúmeras deficiências.
Muitas pessoas confundem a deficiência mental (síndrome de Down) com a doença mental (esquizofrenia, paranóias e outras), o que não é correto. São fenômenos completamente diferentes. A pessoa com deficiência mental (SD) não tem surtos, não tem ataques e não tem convulsões. É perfeitamente possível conviver com ela de aprendizagem criança a criança: oferecem a oportunidade de compreender melhor as pessoas que, por qualquer motivo, são diferentes (maneira de vestir, crenças, língua, deficiências, raça, capacidades). Quando as crianças compreendem que toda criança é diferente, deixam de fazer brincadeiras cruéis e podem se tornar amigos.
Sua construção do conhecimento, das letras, dos números é mais lenta do que os demais, porém a compreensão de mundo é compatível com qualquer pessoa dita “normal”. Seus interesses e manifestações são iguais a qualquer adolescente, inclusive o interesse por meninos.
Os alunos com deficiência não são problemas; esses alunos são pessoas que apresentam desafios à capacidade dos professores e das escolas para oferecer uma educação para todos, respeitando a necessidade de cada um. Se por um lado, a criança portadora da síndrome de Down tem muito a ganhar em termos sócio-afetivos permanecendo no ensino regular, na maioria das vezes, as escolas têm poucas alternativas para oferecer a estes alunos na apreensão dos conteúdos em sala de aula. O problema não é deixar a criança com Down nessa ou naquela escola, o problema é como evitar a exclusão e, ao mesmo tempo, incentivar a criança em seu desenvolvimento intelectual e emocional.
Não há, porém, uma “receita de bolo” para estes casos. As crianças com síndrome de Down, assim como outra criança qualquer, são muito diferentes entre si, tanto acerca da sua personalidade quanto em relação aos diversos e variados interesses e habilidades.
4. CONCLUSÃO
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) 9394/96, ao reconhecer a Educação Especial como modalidade de ensino que permeia todos os níveis escolares, deixa claro que não há, nos sistemas de ensino, tipos separados de educação. Sendo assim, a Educação Especial não é um subsistema e as unidades escolares devem ter um conjunto de recursos que devem ser organizados e disponibilizados para que todos os alunos possam desenvolver suas competências com respeito e dignidade, entre eles os que necessitam de apoios diferenciados. A escola precisa estar aberta para atender a todos e o governo deve oferecer reais condições para a implantação da escola inclusiva no país, fornecendo verbas, criando cursos de reciclagem para os docentes e atendendo as demais necessidades estruturais necessárias para tal ocorrência, como por exemplo, proporcionando apoio educacional especializado adequado para todos os alunos.
A Educação Inclusiva pressupõe que todas as crianças tenham a mesma oportunidade de acesso, de permanência e de aproveitamento na escola, independentemente de qualquer característica peculiar que apresentem ou não.
O movimento inclusivo, nas escolas, por mais que seja ainda muito contestado, pelo caráter ameaçador de toda e qualquer mudança, especialmente no meio educacional, é irreversível e convence a todos pela sua lógica, pela ética de seu posicionamento social. A inclusão está denunciando o abismo existente entre o velho e o novo na instituição escolar brasileira. A inclusão é reveladora dessa distância que precisa ser preenchida com as ações eficazes.
Para que este movimento inclusivo aconteça, é fundamental que as crianças com deficiência tenham o apoio de que precisam, seja da sua própria família, da sociedade ou nas escolas. Mas, o mais importante de tudo, é que o professor, a família e toda a comunidade escolar estejam convencidos de que: cada aluno é diferente no que se refere ao estilo e ao ritmo da aprendizagem.
Assim sendo, o futuro da escola inclusiva depende de uma expansão rápida dos projetos verdadeiramente imbuídos do compromisso de transformar a escola, para se adequar aos novos tempos.
No que se refere especificamente à inclusão dos portadores da Síndrome de Down, as escolas terão de escolher o caminho a seguir, mas é bom lembrar que apostar na educação que ensina e estimula a competitividade é investir na permanência de uma característica de nosso mundo atual e não deixar as pessoas sem outra opção, submetidos a estilo segregado de viver.
Os professores precisam estar conscientes de sua importância e da função que desempenham, no caso de terem um aluno com síndrome de Down, na sala. Como se vê, é na relação concreta entre o educando e o professor que se localizam os elementos que possibilitam decisões educacionais mais acertadas, e não somente no aluno ou na escola. O sentido especial da educação consiste em amar e respeitar o outro, que são as atitudes mediadoras da competência ou da sua busca para melhor favorecer o crescimento e desenvolvimento destes. O conhecimento de uma abordagem holística, no sentido de integração e revelação do contexto de vida do portador da síndrome. Ter acesso aos outros profissionais, como fonoaudiólogos e fisioterapeutas envolvidos no desenvolvimento deste indivíduo, podem também trazer contribuições significativas para as ações do professor em sala de aula.
5. REFERÊNCIAS
BRASIL/Ministério da Educação e do Desporto. Plano Decenal de Educação para todos. Brasilia: MEC, 1993.
BRASIL/Ministério da Justiça/Corde. Declaração de Salamanca e linha de Ação sobre necessidades educativas especiais. Brasilia, 1994 [´s.e.]
INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Censo Escolar. Disponível em: http://www.inep.gov.br/basica/censo/Escolar/Sinopse/sinopse.asp. Acesso em: 18 nov. 2008.
MARTINS, Lúcia de Araújo Ramos. A inclusão escolar do portador da síndrome de Down: o que pensam os educadores?Natal, RN: EDUFRN, 2002.
MANTOAN, M.T.E. Integração X inclusão: escola (de qualidade) para todos. Disponível em: http://www.pro-inclusao.org.br/textos.html#intgr. Acesso em: 18 nov 2008.
MENDES, E.G. Educação inclusiva: realidade ou utopia? Apostila produzida para a Mesa-Redonda do LIDE. São Paulo, SP: USP. 1999.
VOIVODIC, Maria Antonieta M.A. Inclusão Escolar de Crianças com Síndrome de Down. Petrópolis, RJ: Vozes: 2004.
Autora: Inez Kwiecinski
A importância da educação infantil é um tema relevante que se entrelaça com a inclusão escolar, pois uma base sólida na infância é crucial para o desenvolvimento de crianças com necessidades especiais.
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