INTRODUÇÃO
Emília Ferreiro, psicóloga argentina, é doutora pela Universidade de Genebra, onde foi orientanda e colaboradora de Jean Piaget. Suas pesquisas sobre alfabetização foram realizadas principalmente na Argentina, onde nasceu, e no México, onde é, atualmente, professora titular do Centro de Investigação e Estudos Avançados do Instituto Politécnico Nacional.
O objetivo desta resenha é mostrar quais são as ideias da autora sobre o repensar a prática escolar da alfabetização. Ela não traz novos métodos, nem novas questões, e muito menos algo que possa ser uma solução pronta para perguntas que às vezes parecem não ter respostas. Contudo, traz ao leitor a oportunidade de refletir sobre como está ministrando suas aulas, para quem já leciona, e como poderia agir e refazer conceitos sobre como lecionar de uma maneira mais prazerosa para os alunos, para quem está se formando em Pedagogia e outros cursos referentes à educação.
Este trabalho também mostrará que as crianças, no processo de alfabetização, não têm nada de mecânico no que diz respeito ao aprender, pois elas pensam, inventam, raciocinam e constroem. Para mais informações sobre a importância da alfabetização, você pode conferir a importância da pedagogia na educação infantil.
Espero que você aprecie a leitura.
Ferreiro, Emília. Reflexões sobre Alfabetização; 24ª edição atualizada – São Paulo: Cortez, 2001.
ALFABETIZAÇÃO: UMA QUESTÃO DE REFLEXÃO
Ainda é nova a consciência sobre a importância da alfabetização inicial como solução para vários problemas que aparecem no decorrer da aprendizagem.
Conclui-se que a alfabetização inicial tem vasta relação com o método usado pelo professor e se a criança já está madura o suficiente para aprender. Construir a representação adequada dos objetivos que estão sendo estudados demanda um longo processo histórico, até que a criança obtenha uma forma final de aprendizagem. O amadurecimento vai acontecendo e nunca está pronto e acabado, e para construírem essas representações, a criança certamente enfrentará dificuldades, mas ela mesma reinventará novos sistemas para assimilar esses novos conhecimentos, percebendo que vários termos usados no falar não são registrados na forma de escrever.
Não poderemos enxergar nada se pensarmos que a criança só aprende através do ensino formal, considerado correto para a escola. Precisamos considerar que ela é um ser que tem capacidade de pensar e que ignora que deve pedir permissão para começar a aprender. Assim, talvez aceitemos que ela pode sim já saber alguma coisa, mesmo que a instituição não faça o mesmo.
A criança começa a estabelecer relação entre a palavra escrita e a palavra falada conforme vai desenvolvendo a atenção às características sonoras da palavra falada. Através disso, ela vai reelaborando suas hipóteses, por meio de acomodações seguidas, chegando então à lógica da escrita alfabética (escritas corretas para o que foi falado).
A partir do momento que nós, professores, aceitarmos que nossos alunos não são uma tábua rasa, onde as palavras são inscritas conforme dita algum método, aceitaremos que os métodos não são mais do que sugestões para se trabalhar. Eles não são conhecimento e nem podem criá-lo.
O professor precisa compreender os problemas do modo como as crianças os colocam e analisar as soluções que para elas são aceitáveis. Não se pode reduzir a sua prática a um único método. Nenhuma prática é sem sentido e os problemas que surgem geralmente são porque as crianças se sentem perdidas no início da aprendizagem. Tudo é novo e ao mesmo tempo diferente, não que para elas isso seja difícil ou fácil, pois ainda não têm essa noção.
Infelizmente, a maioria dos professores tem uma visão empobrecida da criança que aprende, reduzindo-a a um par de olhinhos e ouvidos e uma mão com um lápis para copiar, esquecendo-se que ela também pensa e que traz consigo algum aprendizado, mesmo que este seja bem rústico. É alguém que constrói e que age sobre a realidade do que foi construído.
Seria muito bom que todos os profissionais da educação colocassem em mente uma suposição: que todas as crianças que estão na sala de aula estão maduras para a leitura, ao invés de supor que podemos classificar aqueles que não têm o que supomos (Hermine Sinclair).
Reanalisar suas práticas de introdução da língua escrita é o método que o professor precisa utilizar na sua prática diária para melhorar a alfabetização pré-escolar.
A escrita é um objeto cultural, cumprindo várias funções sociais, existindo concretamente, como por exemplo: os letreiros, panfletos, embalagens. Ou seja, existem nos mais variados contextos, exercendo influência no aprendizado das crianças, que procuram compreender o significado dessas marcas. Existe assim um processo de aquisição da língua escrita antes do ingresso à escola, independentemente da classe social.
Mesmo sem ter o domínio da escrita, as crianças começam a elaborar e a compreendê-la desde muito cedo, os princípios de organização, sua natureza e para que serve.
É preciso que a escrita esteja presente no mundo externo que cerca as crianças, para que elas tenham considerações a respeito da mesma. Isto é uma reflexão que produz uma construção interna e que não é aleatória.
A criança que cresce em um meio onde todos lêem está exposta a várias interações, que criam condições de compreensão dos símbolos, aprendendo também a se comportar como um leitor, mesmo sem sê-lo, e aprende de forma precoce o essencial das práticas sociais ligadas à escrita. Cabe então à escola criar as condições para que as crianças descubram por si mesmas as chaves secretas do sistema alfabético.
Algumas carências que certas crianças têm na alfabetização precisam ser minimizadas pelo professor. Para que isso se torne eficaz, é necessário que o profissional adapte seu ponto de vista ao da criança, ou seja, que para a criança aquilo está correto.
Os educadores têm muita dificuldade em aceitar que a educação começa muito antes da escolarização, isto porque já estão acostumados a considerar a aprendizagem da escrita e da leitura como um processo escolar.
“Não é fácil encontrar educadores capazes de interpretar todas as sutilezas que precedem qualquer tentativa de estabelecer uma correspondência entre letras e sons” (Emília Ferreiro).
As crianças não são obrigadas a chegar à escola já alfabetizadas; mas é da escola essa responsabilidade social.
O acesso à escola só começa no dia e na hora em que os adultos decidem, apesar de as crianças já chegarem à escola sabendo algo, mesmo que não consigam transcrever corretamente para o papel. A escrita faz parte da paisagem urbana, do seu dia a dia, está nas embalagens de seus brinquedos, alimentos e roupas.
As crianças tentam compreender desde cedo as informações das mais variadas formas que existem: jornal, agenda, carta, mas os adultos não têm a intenção de informar a criança sobre isso. Contudo, a criança observa e é provavelmente através disso que ela compreende a importância da escrita para a sociedade.
“A pré-escola deveria permitir a todas as crianças a liberdade de experimentar os sinais, num ambiente rico em escritas diversas, em especial as do meio rural que não tem quase nenhum contato com a língua escrita” (Emília Ferreiro).
Temos que proporcionar às crianças ocasiões de aprender, pois a língua escrita é muito mais que letras em um papel. É um objeto social, parte do nosso patrimônio cultural, um modo dessa mesma língua existir.
Concluindo, não são os métodos, nem novas formas de tentar mudar a alfabetização que irão melhorar o ensino inicial das crianças, mas sim uma reflexão de como estamos ensinando. Será que as crianças estão realmente aprendendo com nosso estilo de ensinar? Enfim, são infindos os questionamentos que devemos fazer a nós mesmos, ver onde está faltando, onde está aceitável e assim tentar corrigir erros e melhorar ainda mais o que está bom, respeitando os conhecimentos que as crianças já trazem com elas, reanalisando as nossas práticas de transmitir o conhecimento. Ou seja, é preciso acontecer uma verdadeira revolução conceitual, para que, através disso, possamos olhar a educação pré-escolar como a melhor fase do ensino, onde se aprende por prazer e não por obrigação. Teremos que ter então uma nova consciência sobre a importância da alfabetização inicial como uma solução para vários problemas que aparecem. Não é um bicho de sete cabeças e muito menos um infringir de letras.
Gostaria de fazer uma indicação: leia o livro da autora Emília Ferreiro “Reflexões sobre Alfabetização”, pois é uma leitura muito agradável, que traz as reflexões da autora sobre a alfabetização, além de trazer alguns exemplos de escrita de algumas crianças. Há muita originalidade neste livro, pois ele aborda alguns acontecimentos que realmente são a realidade da sala de aula. É um livro muito válido porque as reflexões que ele mostra nos fazem refletir bastante sobre a prática educacional atual.
O que penso que faltou ao livro foi alguma abordagem sobre o descaso dos governantes a respeito da educação pré-escolar. Não que fosse necessário uma página inteira sobre o assunto, mas apenas uma ligeira lembrança sobre esse fato, especialmente no que se refere à educação pré-escolar no meio rural.
FONTE:
Alfabetização: uma questão de reflexão.
Resenha de Ferreiro, Emília. Reflexões sobre alfabetização.
Autor: Helio Francisco da Silva
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